ALEXANDRE SCHWARTSMAN
O ministro nervosinho
A
falta de compostura do ministro compromete mais sua já escassa capacidade de
formulação de política
Muito
embora o ministro da Fazenda tenha afirmado que sua decisão de antecipar o anúncio
do resultado fiscal do ano passado (presumindo que não esteja errado, como
esteve em outubro) fosse destinada a "acalmar os nervosinhos", não é
preciso muito esforço para perceber que são seus próprios nervos que se
encontram à flor da pele.
Caso
não estivessem, talvez lhe fosse possível perceber a futilidade da sua
iniciativa. A começar porque só alguém muito divorciado da realidade poderia
acreditar que a divulgação de um número tão conspurcado quanto o dado oficial
do superavit primário poderia moderar os receios do mercado.
Ainda
que, segundo o ministro, este tenha atingido um valor em torno de R$ 75
bilhões, sabe-se que apenas em novembro o montante de receitas não recorrentes
atingiu nada menos do que R$ 35 bilhões, quase metade do saldo do ano. Na
verdade, até novembro do ano passado, as receitas de concessões, dividendos e o
Refis (o refinanciamento de dívidas tributárias em condições favoráveis)
chegaram a R$ 59 bilhões. Assim, enquanto o número oficial do governo registra
um superavit federal equivalente a 1,9% do PIB nos 12 meses terminados em
novembro, o número corrigido --reflexo mais fiel do esforço fiscal-- mal
alcança 0,3% do PIB.
Nesse
sentido, como todos os analistas sérios são capazes de corrigir tais dados (com
pequenas diferenças de abordagem), ninguém deve ter ficado particularmente
impressionado com o anúncio autolaudatório. Se o ministro esperava fanfarras em
resposta à sua entrevista, deve ter ficado muito decepcionado.
Mais
decepcionado, porém, ficou o mercado. Ao antecipar um resultado que nada vale e
se esquivar de qualquer comprometimento mais firme acerca do desempenho fiscal
futuro, a mensagem passada ao setor privado não poderia ser mais clara: não há
nenhum plano que contemple a possibilidade de um ajuste fiscal neste ano que se
inicia, nem talvez sequer nos próximos, dadas as convicções do governo sobre o
tema.
A
reação negativa, expressa na desvalorização da moeda e na elevação das taxas de
juros, não ocorreu, assim, nem por acaso nem por força de fatores internacionais,
mas sim em razão da percepção cada vez mais disseminada de piora dos
fundamentos do país. Mais um tiro, enfim, que saiu pela culatra, marca
registrada hoje em dia da gestão de política econômica no país.
Isto
dito, o nervosismo do ministro também se escancara em sua relação com o
mercado. Ao contrário de seus antecessores imediatos, que reagiam de forma
serena mesmo quando divergiam da análise do setor privado, o ministro quase
sempre busca o enfrentamento, apenas para mais tarde reconhecer --forçado pelas
circunstâncias-- seus equívocos crescentes, como, mais recentemente, no que se
refere às mudanças de regras para as concessões de infraestrutura.
É
natural, em face do desempenho medíocre da economia, que o ministro da Fazenda
esteja sujeito a toda sorte de pressões, inclusive do próprio governo, cujos
objetivos políticos dependem, em certa medida, de crescimento mais vigoroso do
que o ostentado pelo Brasil nos últimos anos.
O
que se espera, contudo, é que o titular do cargo tenha as condições de suportar
essas tensões e que seja capaz de formular respostas efetivas aos problemas
enfrentados no front econômico. Em particular, que suas falas não contribuam
para o aprofundamento da crise de confiança que hoje assola o país.
Nesse
último aspecto, a falta de compostura do ministro da Fazenda, mesmo depois que
quase oito anos no cargo, revela sua inabilidade para trabalhar sob pressão e
compromete ainda mais sua já escassa capacidade de formulação de política.
Num
mundo caracterizado por preços elevados de commodities e liquidez mundial
abundante, é mais fácil controlar os nervos; quando essas condições, porém,
alteram-se para pior, quem não tem preparo fica mesmo "nervosinho".
alexandre.schwartsman@hotmail.com
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