sexta-feira, 4 de abril de 2008



04 de abril de 2008
N° 15561 - David Coimbra


Contra as eleições

- Tudo que é demais derrama - vivia a repetir o velho sapateiro Walter, tachinha presa no canto da boca, enquanto martelava uma dura sola de vulcouro.

Sábio, o velho Walter. Aliás, e não por acaso, meu avô.

Pois hoje estamos assim. O Brasil sofre os efeitos do excesso de democracia, o democratismo, essa mutação perniciosa e fatal para a sociedade.

Um exemplo tão prosaico quanto contundente é a eleição para diretores de escolas no Estado. O candidato a diretor disputa o voto do colega professor, do aluno de 12 anos de idade, do faxineiro, do pai.

Por aí se esvai a autoridade da Secretaria de Educação e, pior, do próprio diretor. Mais: é conferido ao aluno um status que ele não deve ter. Porque o aluno, necessariamente, tem de ser subalterno ao professor, e o professor ao diretor, e o diretor à Secretaria, e a Secretaria ao governador.

Verdade que há professores, e até muitos, que conseguem manter sua autoridade por obra de seu caráter, da sua firmeza. Mas o dano que se faz à criança é mais grave por outro motivo: porque a criança recebe um poder que ela não quer ter: o poder de decidir.

Pense numa mulher com quem você pretenda sair algum dia. Aquela mulher. A mulher. Você quer impressioná-la? Não deixe que ela decida nada na noite em que vocês saírem. Escolha o restaurante, escolha os pratos e a ordem dos pratos, escolha o vinho, escolha até a sobremesa. Avisando sempre, claro:

- Vou escolher pra ti, lindona.

Ela vai ficar encantada. Porque a mulher precisa de alguém que lhe dê segurança. A mulher quer um homem com autoridade.

Autoridade, não autoritarismo.

O funcionário, o eleitor, você e a criança, o mesmo.

A criança, os pais é que escolhem as roupas que ela veste, a hora em que ela vai deitar e o que ela irá comer. Não se trata de uma prerrogativa dos pais. Trata-se de um dever. Uma obrigação. Pais, professores e governos não podem se omitir de decidir. Eles existem para isso.

Filosofia

Um outro alemão que não o bom e velho sapateiro Walter, mas o bom e velho Hegel, definiria a situação brasileira como uma questão dialética. Uma fórmula simples:

Tese: o país passou décadas sob o tacão do autoritarismo.

Antítese: a reação da sociedade foi atirar-se para o outro extremo, o da supressão de tudo o que sugere mando.

Síntese: o brasileiro entenderá que o estado democrático só existe se se preservar a autoridade dos agentes da democracia.

Hegel diria que o busílis se resolveria assim. O sapateiro Walter também - tratava-se de um otimista. Já eu, não sei se dispomos de força e filosofia suficientes para tanto. Até porque, Caetano foi quem disse, filosofia é bem coisa de alemão.

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