sexta-feira, 18 de abril de 2008



18 de abril de 2008 | N° 15575
David Coimbra


O dia em que a Rosane Oliveira ficou muda

Dias atrás, a Rosane Oliveira perdeu a fala na Rádio Gaúcha.

Ela entrevistava um economista palestrante do Fórum da Liberdade. O economista defendia com ardor messiânico uma reforma radical na legislação trabalhista brasileira: o fim dos sindicatos, do 13º, do Fundo de Garantia, de quaisquer salvaguardas que porventura tenha o trabalhador, o fim da própria legislação.

- Como na China - exemplificou. E a Rosane:

- A China??? É esse o seu mundo ideal?

O economista não titubeou, fincou um "É!" na audiência, depois do qual pingou um ponto de exclamação ereto de orgulho.

Foi aí que a Rosane perdeu a fala, não conseguiu mais raciocinar, encerrou a entrevista. A perplexidade da Rosane se explica: ela conhece a China, país onde um operário moureja 14 horas por dia, come e dorme na obra e não tem direito sequer a reclamar, país onde não existem nem réstias das leis que, no Brasil, protegem o trabalhador.

Verdade que essas leis são antigas e até obsoletas, remontam ao fim dos anos 30, teriam de ser reformadas.

Como terão de ser reformadas a previdência e a aposentadoria, setores que, de resto, estão sendo rediscutidos em todo o mundo desenvolvido. Também os funcionários públicos haverão de perder seus privilégios, no Brasil. Tudo isso é sabido.

O problema é como fazer esses ajustes, se no país existem homens como o economista que emudeceu a Rosane. Esse economista, ele não é neoliberal, ele não tem ideologia.

Para ele, pouco se lhe dá se o regime é maoísta, como o da China, um regime de repressão implacável, de partido único, de feroz censura à imprensa.

Tais economistas importam-se apenas com o lucro. Eles não são idealistas - são tão-somente gananciosos. Mas fazem pregação em congressos e fóruns, são entrevistados por rádios e TVs, escrevem artigos em jornais e revistas.

As leis trabalhistas brasileiras, de fato ultrapassadas, de fato necessitando de ajustes, foram feitas exatamente para proteger o país de homens como esse economista.

E, ainda existindo homens como ele, estão plenamente justificadas. O atraso do Brasil, tão criticado por tipos como o economista que estupefou a Rosane, só não é corrigido por causa de tipos como o economista que estupefou a Rosane.

Camisa Volta ao Mundo

Gosto desse Cristovam Buarque - um homem sincero. Fiquei triste ao vê-lo ridicularizado na eleição. Não por ele. Fiquei triste pelo país, que não sabe qual é a origem de seus problemas.

Agora, juro: estou longe de ser pedetista. Até porque o PDT é um partido meio antigo. Se fosse um homem, o PDT usaria camisa Volta ao Mundo e sapato com lacinho, se chamaria Agenor e seria despachante.

Se fosse uma mulher, o PDT se chamaria Margareth. O PDT tem a maior cara de Margareth.

Mas o PDT é o único partido que trata a educação como a educação deve ser tratada. Se todos os partidos tivessem consciência de que o ensino básico e fundamental tem de ser prioridade absoluta, tem de ser pleno, integral e gratuito, até as flexibilizações da legislação trabalhista poderiam ser feitas.

Um trabalhador com boa formação pode se aventurar no mercado de trabalho. Um trabalhador educado, consciente, que sabe o seu lugar no mundo, pode enfrentar um economista como o da Rosane.

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