quarta-feira, 23 de abril de 2008



23 de abril de 2008
N° 15580 - David Coimbra


A bombacha do Eloí

Indagora, fim de semana, eu e o Tio Niba rodávamos numa camionete pelo interior profundo de Rosário do Sul, quando um gaudério se aproximou a cavalo. Tio Niba dirigia. É o dono da estância, mostrava-me o lugar, as vacas, aquela coisa toda. Apontou para o gaudério:

- Esse é o Eloí. Ele nunca usou uma calça reta, nunca usou um calção; só bombacha.

Olhei para o Eloí.

A imagem do gaúcho. Montava com a naturalidade de quem se criou em cima de um cavalo e, de fato, Tio Niba me disse que ele domava. Eloí movia-se debaixo de um chapéu de aba larga e atrás de um bigode vistoso, uma taturana negra que se destacava do rosto curtido pelo sol da lida no campo.

Havia enrolado as mangas da camisa até os cotovelos e nos pés usava indefectíveis Havaianas. Pensei que as mesmas Havaianas poderiam estar sob o corpo dourado de Gisele Bündchen, mas foi um pensamento fugaz, logo me concentrei de novo no Eloí, até porque o Tio Niba alertou:

- Repara na largura das bombachas dele.

Realmente, caberiam três Eloís em cada perna daquela bombacha.

- O Eloí adora futebol - contou o Tio Niba. - É gremista fanático e joga muito bem. Mas não tira a bombacha para jogar. Então, quando ele corre, faz até um vento. É uma barulheira, o Eloí jogando com aquela bombacha.

Pus-me a imaginar o Eloí jogando bola nas coxilhas verdes de Rosário, torcendo pelo Grêmio, ouvindo o Benfica no Esportes ao Meio-Dia, e tive a certeza de que o futebol é mesmo fator definitivo na formação da personalidade do homem do Rio Grande do Sul. Pode ser pouco, pode ser pueril, pode até ser rasteiro, mas é assim.

A palavra flimbus

Descobri que sou um fenômeno da medicina. A coisa começou quando li a palavra flimbus. Li aquilo e parei. Flimbus? Nunca tinha lido flimbus na vida. Fiquei pensando. Flimbus, flimbus... O que seria?

Não se encaixava no texto. Fui ao dicionário, tenho vários dicionários. Nenhum deles registrava flimbus. Até que voltei ao texto e percebi o que ocorrera: não havia flimbus lá. Era outra palavra! Eu havia lido errado... Simplesmente porque as letras se amontoaram na linha.

A verdade era uma só, e era horrenda: eu estava com dificuldade para ler de perto. Consultei meu oculista e ele disse que era assim mesmo, é um músculo do olho que cansa, é inevitável que as pessoas, todas as pessoas, tenham um dia dificuldades para ler de perto e bibibi.

Eu teria de usar óculos.

Certo. Comprei os óculos. Paguei centenas de reais por eles. Mas, depois de algum tempo, as letras começaram a se acolherar quando ESTAVA usando-os.

Com um milhão de lunetas, o que havia acontecido??? Pois lhes direi: fiquei bom! Por Deus, estou lendo de perto com a mesma aguda capacidade de quando devorava O Mundo da Criança na casa da minha mãe, às margens da Plínio.

Difícil crer, bem sei. Mas é.

O que significa esperança para os colorados. Se for um tipo como eu, o Guiñazu se recupera para jogar contra o Juventude. Mas só se for um tipo como eu. Nós somos raros, nós, os fenômenos da medicina.

Atropelado por uma carroça

Fui atropelado por uma carroça, certa feita. Uma humilhação. Ser atropelado por um carro, qualquer carro, entende-se. Mas uma carroça??? Francamente. Agora, o pior foi a conseqüência. Deu-se o seguinte: fazia semanas que planejávamos a fundação de um time de futebol de salão, o Cometa FC.

Já me disseram que Cometa não é bom nome de time, mas na época nos pareceu perfeito - um Cometa é um troço rápido e fulgurante, e era assim que queríamos que o nosso time jogasse. Então, Cometa.

Bem. Escolhido o nome, providenciamos o uniforme. Fizemos uma vaquinha, compramos camisetas da Hering e pedimos para a minha mãe tingi-las de azul-escuro - naquele tempo só existia Hering branca. Depois, recortamos o que se assemelhava a cometas de tecido branco e minha mãe os costurou no lado esquerdo do peito das camisas. Ficou tri.

Treinávamos todas as tardes para a nossa estréia contra o poderoso Ameriquinha, marcada para sábado à noite na cancha da Amovi. Só que, na tarde de segunda, ocorreu o infausto. Jogávamos pelada na chamada Rua da Tendinha.

A Rua da Tendinha não era uma rua, era uma passagem de terra batida entre dois blocos de edifícios, no fundo da qual se situava, e ainda se situa, a Gráfica Pallotti.

Alguns carroceiros usavam aquela passagem todos os dias, por algum motivo. Nesse dia em especial, nós estávamos no calor do jogo, eu com a bola nos pés, pronto para aplicar meu drible da enganchadinha mágica, quando, ao erguer a cabeça, deparei com a cara daquele cavalo.

Uma carona enorme, marrom, ladeada por viseiras, arfante, conduzida por quatro poderosas patas. O cavalo ia me atropelar!!! Dei um salto para trás, e o que veio na minha direção foi a carroça.

Não passou por cima de mim porque me agarrei no lado da carroceria e esperei que parasse, mas fiquei com um melão roxo no flanco direito. Lesionei-me na semana da decisão! E agora? Jogaria ou não jogaria a nossa partida de estréia?

Fizemos mistério até o dia do jogo, exatamente como o Inter está fazendo com o Alex e o Guiñazu, mas, no sábado... não reuni condições. Sem o seu fixo mais aplicado, o Cometa perdeu por 5 a 0 e encerrou ali sua trajetória. Nosso time foi, como queríamos, rápido como um cometa.

Previsão

Pelo desânimo da direção do Grêmio, pelo andamento de suas contratações: tremei, gremistas! O Grêmio será a alegria do Campeonato Brasileiro.

A alegria dos adversários, bem explicado.

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