terça-feira, 22 de abril de 2008



AS RAZÕES DO ACASO

Tornou-se historicamente incorreto dizer que os portugueses bateram nas costas do Brasil, em 22 de abril de 1500, por acaso. Afinal, tudo indica que eles já sabiam da existência das terras que Cabral 'descobriu'.

Existem correntes muito fortes na história que lutam contra o acaso. Garantem que essa é uma falsa explicação ou uma ilusão explicativa. Já houve até filósofo combatendo o acaso no futebol. O gol nunca surgiria por acaso, mas sempre por um erro do adversário. Nada seria por acaso.

Parece que essa idéia surgiu por acaso depois de uma discussão entre especialistas sobre a impossibilidade do acaso. Os mais radicais críticos do acaso pretendem refutar até aquela canção que fala 'se acaso você chegasse...'. Pretendem que o correto seria 'se por alguma razão você chegasse...'. Faz sentido. Qual?

Ainda assim, a respeito da rápida visita de Cabral ao Nordeste brasileiro, a questão permanece: os portugueses chegaram aqui naquele dia por acaso ou por uma decisão de comandante de fazer um desvio de rota para tomar posse de um território que estava dando sopa?

Cabral, apesar de ser muito carola, não saiu de casa para organizar a primeira missa em Vera Cruz. O seu destino era Calicute, na Índia, movido, casualmente, por razões comerciais.

Ele entraria para a história como um nobre que invadiu, sem qualquer esforço bélico, ocupou – com dois degredados e dois fugitivos – e tomou posse de um 'continente' povoado por estranhos animais falantes.

Cabral certamente foi o mais bem-sucedido precursor do MST. Os nativos da terra nunca entraram com pedido de reintegração de posse. Teriam de vencer as resistências de militares, de colonos e do STF. O problema é que Cabral não tinha a menor idéia do tamanho do território de que se apropriara em nome do rei dom Manuel. Nem o rei.

Durante as primeiras três décadas depois da tomada de posse por Cabral, como já se ensina nas escolas, nada mudou. O Brasil ficou entregue a si mesmo. O pior veio depois.

O rei, meio que por acaso, descobriu a importância de povoar a sua colônia. Cabral achava ter descoberto uma ilha. Por acaso, era quase um continente. Cabral pensava ter caído para sempre nas graças do soberano. Por acaso, caiu logo em desgraça.

Algumas das marcas do Brasil atual surgiram, por acaso, naqueles dez dias da estada da expedição do Cabral nas praias brasileiras. Os dois grumetes que desertaram, seduzidos pelas belezas locais, inauguraram o turismo sexual. Naquele tempo não era preciso camisinha. Nem camisa.

Nem roupa alguma. Alguns historiadores continuam assegurando que a chegada de Cabral à Bahia, em 22 de abril de 1500, foi determinada pelos ventos. Mas afirmam também que os ventos nunca sopram ou deixam de soprar por acaso.

A hipótese mais provável para o desvio de rota de Cabral tem sido desprezada pelos estudiosos: Cabral queria participar do Carnaval baiano. Chegou atrasado. Ou adiantado?

Vejam que se trata de uma razão clara e objetiva. Nada de acaso. Infelizmente, ou felizmente, os ventos o impediram de chegar a tempo. Lulla tem tentado resgatar outra importante marca da operação capitaneada por Cabral: as Parcerias Público-Privadas.

Dom Manuel associou-se à iniciativa privada para financiar a expedição cabralina. Hoje, em todas as velas apareceriam, por acaso em destaque, os logotipos dos patrocinadores.

juremir@correiodopovo.com.br

Ótima terça-feira e um ótimo início de semana

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