sexta-feira, 1 de março de 2013



01 de março de 2013 | N° 17358
PAULO SANT’ANA

Obrigado, Rolim

Como já escrevi, recebi mais de uma centena de manifestações de solidariedade, pelas agressões que uma patrulha da BM cometeu contra familiares meus.

O companheiro e bacharel em Direito Marcos Rolim, que escreve neste jornal com rara acuidade sobre conduta policial, direitos humanos e penitenciarismo, mandou-me uma mensagem percuciente:

“Escrevo para manifestar minha solidariedade diante do abuso de autoridade, violência e racismo que atingiram teus familiares. Infelizmente, situações como essas integram o cotidiano das abordagens realizadas pelos policiais brasileiros. Não por todos, mas por um número expressivo deles. O fato não diz respeito, portanto, a ‘ocorrência isolada’, como se costuma dizer quando eles são tornados públicos. Não. O que ocorreu com teus familiares diz respeito a um padrão que tem, inclusive, se firmado nos últimos anos.

As razões são muitas. Elas começam no perfil de recrutamento, nos baixos salários e na formação deficiente; se desenvolvem com as violações dos direitos dos próprios policiais dentro de suas corporações. Muito frequentemente, eles são tratados de forma desrespeitosa e mesmo humilhante e terminam reproduzindo esse tipo de comportamento no tratamento dos cidadãos.

Por outro lado, a atividade desses policiais não é efetivamente fiscalizada por um órgão de controle externo e as corporações tendem a responder de forma a consagrar a impunidade das condutas violentas (em geral também aplaudidas pelo senso comum). O Ministério Público, a quem compete esse tipo de controle, possui outras prioridades e, na prática, pouco incide sobre as corporações policiais.

Nas democracias avançadas, existem inspetorias especializadas dedicadas exclusivamente a essa função. Elas regulam fortemente o cotidiano da atividade policial. Só para dar um exemplo, Nova York possui o Civilian Complaint Review Board (CCRB), com 170 funcionários, dos quais 110 são inspetores. Essa estrutura recebe 8 mil queixas por ano relativas a uma força policial de 40 mil servidores numa cidade com 8 milhões de habitantes.

Não só assegura uma resposta efetiva a todos os casos – incluindo punições e desligamentos –, como vai determinando alterações no cotidiano da atividade policial de tal forma que se evite a reprodução de práticas violentas e desrespeitosas. O Brasil precisa avançar para a formação de estruturas do tipo, totalmente autônomas, capazes de qualificar nossas polícias. Enquanto não tivermos algo assim, o corporativismo será dominante e casos como o que relataste continuarão vitimando a cidadania, especialmente as pessoas mais humildes e as minorias.

O que deveriam perceber é que cada vez que um policial trata mal uma pessoa ou viola seus direitos, é a confiança nas polícias que é abalada. O problema é que, quando o povo não confia em suas polícias, também não as informa. Ora, a principal ferramenta para o trabalho policial é a informação.

Um policial sem informações trabalha às cegas. A maior e a mais eficiente fonte de informação para as polícias é a população. Por isso, as polícias mais eficientes do mundo são aquelas que aprenderam a tratar bem as pessoas e a manter com elas relações tão próximas quanto possível. Aqui, ainda levaremos muito tempo para compreender coisas tão elementares como essas. Um forte abraço do (ass.) Marcos Rolim”.

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