02
de fevereiro de 2015 | N° 18061
MARCELO
CARNEIRO DA CUNHA
“Wolf Hall” e a supremacia
inglesa
A
Inglaterra já foi um pouco, ou muito, de tudo. Foi invadida por romanos,
vikings e finalmente pelos normandos, há mil anos, quando parou de ser invadida
e começou a invadir. Pois nessa Era da Nova TV que vivemos, a Inglaterra brilha
firme, como estrela de primeira grandeza em um céu dominado pelas estrelas de
Hollywood. Se, no cinema, o mundo ainda para ver a brincadeirinha que é o
Oscar, na TV, as produções inglesas começam, cada vez mais, a mostrar quem têm
café no bule. Chá, no caso.
A
mais recente delas é a esplêndida Wolf Hall, a adaptação para o display de LED
dos romances históricos de Hilary Mantel, vencedora de dois Man Booker Prizes
com os livros da trilogia que criou sobre a vida de Henrique VIII, aquele das
muitas esposas. Os livros centram a narrativa na enigmática figura de Thomas
Cromwell, um filho de ferreiro que chegou ao posto de Chanceler na Inglaterra
dos Tudor, uma façanha e tanto.
Wolf
Hall, a série, é uma maravilha da nova televisão. A atuação de Mark Rylance
como Cromwell é de deixar a gente querendo ser inglês. Damien Lewis, o sargento
Brody de Homeland, faz um Henrique VIII assustador o bastante para se parecer
com o original, imaginamos. As cenas internas e noturnas são filmadas à luz de
velas, como um novo Barry Lyndon (1975), o que deixa tudo lindo demais, mesmo
que um tanto obscuro.
O
que sabemos de Henrique VIII diz muito pouco do drama real de um rei sem filhos
homens em uma época em que isso era um problema e tanto. A Inglaterra, ainda
católica, estava navegando nas águas turbulentas da Reforma Protestante, e os
tempos eram difíceis, para se dizer o sub-mínimo. Cromwell faz o impossível
para manter o pescoço intacto, em uma era de muitos machados, por todos os
lados.
Hilary
Mantel deve lançar o terceiro livro da trilogia neste ano, o que faz de mim um
sujeito feliz, já tendo lido Wolf Hall e Bring Up the Bodies. Wolf Hall é a
demonstração pura e simples da riqueza de se narrar a história, quando se tem
uma e se compreende a importância dela. No Brasil, teríamos muito a pensar e
falar sobre a nossa rica história. Mas nos falta uma Hilary Mantel, e nos falta
uma BBC. Azar nosso, sorte deles.
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