sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Jaime Cimenti

Livros, leitores, leituras

Li que um jovem executivo norte-americano, do ramo da tecnologia digital, de 35 anos, todo dia pede para seu filho de cinco anos ler um livro impresso antes de dormir. Eles moram em Nova Iorque, o centro do mundo. Achei a história muito, muito interessante. Primeiro, pelas idades deles; segundo, pela cidade; e, terceiro e principalmente, pelo que disse o pai do menino.

O executivo, que convive diariamente com o universo eletrônico e virtual, afirmou que a leitura silenciosa e atenta das páginas impressas dos livros mexe com a sensibilidade e a inteligência do garoto de um modo incomparável. As imagens, as telas, os barulhinhos, os joguinhos e tudo mais dos computadores, tablets e celulares ele acha bons e inevitáveis para o filho, mas pensa que são um bocado fáceis e dispersivos e que não despertam tanto os sentidos da criança.

Concordo e não precisaria escrever muito mais sobre o tema, sobre a mágica leitura solitária e silenciosa das páginas impressas. Nem entro nas questões dos efeitos, por vezes ruins, da luz da tela, do fato de livro impresso não enguiçar e daquele perfume de papel e tinta que só os velhos livros nos dão. Ah, juro que não estou escrevendo em causa própria, defendendo esta coluna de livros impressos que tem quase 21 anos. Juro que não, acreditem. Juro por Deus e pela minha mãe.

Num país como o Brasil, em especial, a leitura de livros impressos deve ser incentivada e vista como uma das melhores possibilidades de boa educação, em vários sentidos. Isto, aliás, vem sendo feito pela iniciativa privada e pelos governos, mas nunca é demais repetir, principalmente para as novas gerações, que, realmente, a leitura de livros impressos é essencial e dá um toque imprescindível para a inteligência, o racional e as emoções das pessoas.

Essa conversa está ficando um pouco séria. Vamos, então, pegar leve e apresentar os 10 direitos do leitor, pelo escritor e professor marroquino Daniel Pennac. O leitor tem o direito de não ler, de saltar páginas, de não acabar um livro, de reler, de ler não importa o quê, de confundir um livro com a vida real, de ler em qualquer lugar, de ler trechos soltos, de ler em voz alta e de não falar do que leu.

Acrescento mais alguns direitos, com a licença de Pennac. O leitor pode empilhar livros na cabeceira, cuidando para que o exemplar de Quixote não lhe caia na cabeça, provocando-lhe ainda mais loucuras. O Quixote é a Bíblia da Loucura. Todo mundo pode “tresler”. O leitor pode ler uns 10 livros ao mesmo tempo, “trechear” à vontade e tem o direito de terminar de ler alguns. O leitor pode fazer anotações nos livros, de preferência com lápis, para poder apagar e/ou corrigir.

O leitor pode pautar, ou tentar pautar, o colunista do Jornal do Comércio, fazendo indicações, comentários, correções e o que mais achar bom. O colunista tem alguma consciência de suas muitas limitações, sabe que é só um ponto na página impressa da vida e lembra que o mundo dos livros é infinito, livre e intergaláctico. O leitor tem o direito de criar outros direitos para si, como quiser. Livro é liberdade. Fui.

a propósito...

Acredito que somente uns 10% das vendas de livrarias físicas e virtuais seja de obras que tratem de poesia, teatro e literatura de ficção, como contos, novelas e romances. Fico torcendo para que a coisa mude. Sei também que grande parte do mercado editorial vive de livros didáticos e técnicos.

Poderia ser diferente, ou, ao menos, mais democrático. Mas o que me deixa mais preocupado é ver que, pelos menos nos últimos anos, nas listas de mais vendidos dos jornais e revistas, a ficção brasileira pouco aparece. Será que está todo mundo satisfeito só com as novelas brasileiras e as ficções estrangeiras? Faz pensar, não é? 


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