quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015


11 de fevereiro de 2015 | N° 18070
MOISÉS MENDES

A gravata e a bota

Eu não sabia da existência de defensores radicais da gravata. Fui criticado por alguns deles, em e-mails categóricos, depois que escrevi sobre os líderes do Syriza, o partido de esquerda que venceu as eleições na Grécia.

O primeiro-ministro Alexis Tsipras e o ministro das Finanças Yanis Varoufakis não usam gravata. Seus assessores também vestem camisas esportivas. Inventei de dizer que, para afirmar a imagem de desafiadores do sistema financeiro europeu, eles não podem cair na tentação de usar gravata.

Não deveria ter dito. Recebi longos relatos sobre a importância da gravata. Não sei se os remetentes dos e-mails são ligados a fábricas de gravata, ou estilistas, ou se são apenas provocadores.

Os membros do Syriza aparecem assim despojados para que sejam vistos como a novidade da política mundial. Sem gravata, fica melhor. Muitos líderes, políticos ou não, se sentem desconfortáveis usando gravata.

Fidel Castro usa abrigos, há muito tempo, desde quando desistiu de usar fardas militares. Já usou abrigos da Adidas e da Nike e apareceu esses dias com um abrigo da Fila. Por que Fidel usa abrigos de grife? Que mensagem um comunista quer passar com os símbolos de marcas mundiais no peito?

São raras as fotos de Fidel de gravata. Imagino que o cubano deve ter tido uma ou duas gravatas na vida. Eu tive três. O Luiz Antônio Araujo, que cobre guerras de gravata, foi engravatado à casa de um ex-membro do Estado Islâmico, num vilarejo poeirento da fronteira da Turquia com a Síria, no final do ano passado. Araujo é um cara que dá solenidade até a um encontro com bárbaros. Deve ter umas 40 gravatas ou mais.

Respeito quem goste, mas a gravata deveria ser uma invenção já extinta, como o chiripá, a peruca dos magistrados e a camisa de babado dos aristocratas (poderiam ter ficado só alguns aristocratas).

Em que gavetas foram parar as gravatas amarelas, que andaram na moda recentemente? E as com bolinhas, com Mickey, com centenas de microelefantinhos?


Eu extinguiria a gravata através de medida provisória. Se acabaram com o Fiat 147 e o sapato de bico quadrado, por que não acabam com a gravata? Quem sabe se a extinção não começa lá na Grécia. E a gente contribui por aqui com o fim da bota de gaúcho de cano curto e das imitações que ainda fazem do Paulo Francis.

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