07
de fevereiro de 2015 | N° 18066
DAVID
COIMBA
Qual é a
senha?
Naqueles
antigos filmes de guerra, o soldado vinha voltando para o acampamento depois de
uma missão e a sentinela gritava, em meio à neblina:
–
Alto lá! Qual é a senha?
O
soldado sabia que a sentinela estava com a arma apontada para ele, ele tinha
que dizer a senha correta. Mas qual era mesmo a senha? “A águia pousou?”
“Cucamonga?” “Paolla Oliveira?” Maldição, ele havia esquecido a senha! E o
outro continuava:
– A
senha! Qual é a senha? Diga a senha ou eu atiro!
É
assim que me sinto, no mundo da internet. Já tentei ter uma única senha, que me
desse acesso a todos os recônditos virtuais em que preciso ingressar, mas não
deu certo. Alguns sites pedem senhas com letras maiúsculas e minúsculas, outros
não aceitam maiúsculas, há os que exigem números e letras e os que não deixam
você ir em frente se você não colocar uma arroba ou um cifrão no meio da
palavra. Resultado: tenho dezenas de senhas, quiçá centenas. Aí, volta e meia
esqueço alguma, erro uma vez, duas e o site avisa: “Se você errar a terceira,
sua conta será bloqueada”. Jesus! Começo a suar. Posso ver a arma apontada para
meu peito e ouvir os gritos:
–
Qual é a senha? Qual é a senha?
Aqui,
nos Estados Unidos, você só resolve suas pendências pela internet. E, como
americano tem obsessão por segurança, você precisa de paciência oriental para
se cadastrar num site. Para pagar a conta de energia, tive de responder a
tantas demandas, que, quando terminei, cheguei a ouvir a musiquinha do Senna:
tatatá! Tudo isso para, depois, esquecer a senha. E, quando lembro, eles me
fazem uma “pergunta de segurança”: “Qual é o nome do seu melhor amigo de
infância?” E agora? Que amigo botei no cadastro?
E,
de repente, por algum motivo, tenho que fazer um download. Detesto download. É
um troço angustiante, cheio de fases. Numa delas, pode haver vírus. Tenho muito
medo de vírus.
Mas
não adianta, tudo é pela internet. Tudo. Escolher um filme na TV, ver o extrato
bancário, comprar ingresso para o teatro ou uma passagem de trem, saber se a
aula foi suspensa por causa da neve, a assinatura do jornal. Cristo! E cada
página tem a sua característica, a sua fórmula, e você tem que descobrir qual é
ou ela tranca e você não faz mais nada, tem que começar de novo. Dá vontade de
chorar.
Eu
odeio a internet.
Certo,
não é sempre. Admito que ela é uma útil ferramenta de trabalho e tudo mais.
Nesta semana mesmo, bebi muita sabedoria da fonte da internet. Descobri, por
exemplo:
1. O
segredo dos hunza, o povo que nunca envelhece.
2.
Que um monge foi mumificado há 200 anos, mas ainda assim continua vivo,
meditando.
3.
Que uma mãe e uma filha tentaram fazer contato com uma cadela morta e, nesse
processo, incendiaram a própria casa.
4.
Que o suco de berinjela com limão faz milagres.
5.
Que os gatos neutralizam a energia negativa.
6.
Que um pacote de camisinhas custa dois mil reais na Venezuela.
7.
Quais são as 30 características de uma pessoa sensitiva.
De
fato, não saberia de tantas coisas, se não fosse a internet. Tenho de
reconhecer. Mas não estou certo se vale a pena. A vida em que você só usava
senha na guerra era mais simples de ser vivida.
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