28
de fevereiro de 2015 | N° 18087
CLÁUDIA
LAITANO
Terror em série
Há o
Estado Islâmico do mundo real, o grupo terrorista que se expande em poder e
influência no Oriente Médio, e há o Estado Islâmico simbólico, produtor de
conteúdo, dedicado a conquistar – no sentido de ocupar, mas também de aliciar –
o imaginário ocidental.
O
primeiro é a nova versão de um inimigo conhecido – fanáticos armados não são
exatamente uma novidade na História. O segundo, em muitos aspectos, representa
um novo tipo de ameaça. Para demonstrar sua força e celebrar uma visão de mundo
que não faria feio no século 10, o EI tira proveito da forma como o Ocidente
consome informação e entretenimento no século 21.
A
estética dos seus vídeos de violência explícita, a regularidade com que são
produzidos e a forma como rapidamente se espalham nos são assustadoramente
familiares: o Estado Islâmico é o terrorismo com lógica de games e seriados. É
Game of Thrones com vítimas de verdade. Não espanta que atraia tantos meninos e
meninas sensíveis à fantasia.
Como
em um seriado de sucesso, por mais que as mortes, a certa altura, se tornem
previsíveis, sabemos que os roteiristas encontrarão um jeito de torná-las ainda
mais brutais, gratuitas e inesperadas, de forma a manter sua audiência
eletrizada e sintonizada – o que não é fácil diante da infinidade de ofertas de
conteúdo que disputam sua atenção todos os dias.
Que
toda essa selvageria produzida nos confins do Iraque e da Síria seja consumida,
pela maior parte das pessoas, nas redes sociais, ou seja, embaralhada com
notícias amenas, discussões sobre a verdadeira cor de um vestido e felicitações
de aniversário, apenas potencializa a sensação de banalização da violência.
Como
todo roteirista e fã de série sabe, às vezes é preciso surpreender, chocar de
novas formas, impactar – do contrário, mesmo o espetáculo mais brutal pode cair
na rotina. Em meio a decapitações, torturas e degradações humanas de todos os
tipos, o Estado Islâmico encontrou tempo para destruir estátuas milenares – uma
prática antiga, como a de queimar livros (o que eles também fizeram nesta
semana), mas que sempre impressiona.
Destruir
a História para instaurar a própria narrativa como a verdade absoluta sempre
foi uma das táticas favoritas dos tiranos. A diferença é que em um mundo
globalizado não é apenas um povo ou uma crença que é atingido, mas toda a
Humanidade. De uma marretada só.
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