29 DE JUNHO DE 2021
PREJUÍZO MILIONÁRIO
Suposto golpe lesou dezenas de pecuaristas
Cerca de 70 pessoas teriam perdido, ao todo, R$ 30 milhões no Interior
Morador de São Sepé, na Região Central, Márcio Bolzan Souza, 47 anos, tem vivido momentos de angústia nas últimas semanas. O produtor rural é um dos que afirma ter sido lesado por um suposto golpe apurado pela Polícia Civil. Além dele, o pai, o irmão e o sobrinho também relatam terem sido enganados por Marco Gilberto Muller Becker Filho, preso na semana passada em Porto Alegre. Os prejuízos aos pecuaristas de diferentes locais do Estado, segundo aponta a investigação, seriam milionários.
Márcio conta ter conhecido o negociador, agora suspeito de estelionato, há cerca de dois anos. Neste período, segundo o produtor, realizaram repetidas negociações de venda de bovinos. Marco Gilberto costumava ir até a propriedade, avaliava os animais e então fechavam negócio. Inicialmente, conforme o pecuarista, o pagamento era à vista. Com o tempo, como passou a confiar na negociação, passou a receber a prazo, cerca de 15 ou 30 dias após a compra. Como garantia, ficava com um cheque pré-datado, no valor da venda. Um dia ou dois antes do vencimento, o dinheiro era pago.
Na metade de maio, Márcio fez mais uma venda, um lote com 41 animais - 10 novilhas prenhas e 30 bois. O valor do rebanho foi avaliado em R$ 140 mil, e o prazo, acertado em um mês para o pagamento. Em junho, os primeiros casos de suspeita de golpe começaram a chegar à polícia. Os produtores, sem receber, tentavam contato com Marco Gilberto e não conseguiam. Márcio diz também não ter obtido mais contato com o negociador, mesmo antes de ele ser preso. Como tinha outro cheque, que ainda não havia sido quitado, o pecuarista acumula prejuízo de R$ 185 mil.
- Isso é só o meu valor. Mas se somar com o meu irmão, meu pai e meu sobrinho, dá quase meio milhão - conta o produtor.
O pai do produtor teria ficado com R$ 134,9 mil de prejuízo, o sobrinho, R$ 135,2 mil, e o irmão, R$ 35 mil. Todos na mesma forma de negociação. Os rebanhos foram levados e o pagamento deveria ser feito um mês depois. Márcio relata que conhecia familiares do negociador. Marco Gilberto estaria trabalhando há cerca de dois anos com a compra e venda de gado.
- Era uma pessoa conhecida. Sempre muito educado, tranquilo. Não era um desconhecido. Confiávamos. Somos pequenos produtores. Nos primeiros dias, foi difícil de acreditar. Não conseguia dormir, tinha de tomar remédio. É um baque. Uma vida toda de trabalho - desabafa Márcio.
O produtor chegou a ir até a propriedade onde o comprador costumava manter os animais, no interior de Formigueiro, mas nada foi encontrado. Depois, decidiu ir até a Polícia Civil.
A DP de Formigueiro já concentra pelo menos 31 ocorrências que apontam o mesmo homem como suspeito de estelionato. Nascido e criado no município, Marco Gilberto atualmente estava residindo em Caçapava do Sul. Na última terça-feira, foi preso de forma preventiva em Porto Alegre, na residência de familiares - outro suspeito foi detido em Caçapava do Sul. Entre as vítimas, há produtores que chegaram a ter prejuízos milionários. Um deles, segundo a polícia, relata ter negociado 542 cabeças de gado com o suspeito. Neste caso, o valor perdido até o momento se aproxima dos R$ 5 milhões.
Investigação
O delegado Antônio Firmino de Freitas Neto, da DP de Formigueiro, pretendia ouvir novamente o suspeito ontem, mas o depoimento foi adiado para a tarde de hoje, a pedido da defesa. No primeiro depoimento, um dia após ser detido, ele negou que tenha cometido estelionato.
- Disse que não queria enganar ninguém. Mas ficou de explicar em novo depoimento o que realmente aconteceu - diz o delegado.
Para a polícia, no entanto, os elementos colhidos até agora indicam que os pecuaristas teriam sido vítimas de golpe. Segundo a investigação, os animais eram levados das propriedades e revendidos a preços mais baixos, inclusive fora do Estado, como no Centro-Oeste. Dessa forma, o repasse aconteceria de forma mais ágil. O delegado afirma que cerca de 70 casos foram comunicados à polícia, em 14 municípios, e o prejuízo é estimado em R$ 30 milhões. No entanto, há alguns produtores que optaram por não registrar o fato.
A polícia busca detalhar como ocorria a operação. Além dos dois presos, pelo menos outras sete pessoas, que atuariam como intermediárias, são investigadas.
LETICIA MENDES
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