18 DE JUNHO DE 2021
ARTIGOS
A ESCOLHA DE SOFIA
A primeira escolha de Sofia foi ao nascer. Chegou no dia 18 de junho de 2005. Não imaginava a incubadora como primeiro lar. Tampouco que a estadia se estenderia. Desde que abriu os olhos cor de chocolate, escolheu a vida. Mesmo antes de ganhar colo de mãe, foi invadida por drenos e agulhas. O corpinho franzino driblou bactérias e paradas cardiorrespiratórias. Ela nunca pensou em desistir. Talvez por tamanha petulância tenha despertado uma legião de torcedores. A história de persistência ganhou a roda de amigos, chegou ao coração de anônimos. Como torcida ganha jogo, depois de três meses se despediu da UTI.
Na porta de casa a faixa dos avós resumia tudo: "Bem-vinda, Sofia, nossa guerreira". Os meses no hospital foram sucedidos pela via-sacra de especialistas. No segundo tempo de jogo, o diagnóstico de futuro: viveria bem, mas com um pulmão.
Sofia recebeu então o aconchego de uma casa no campo. Com ar puro e dieta rica, ganhou peso. Demorou a falar, caminhar e finalmente sorriu. Apesar das inúmeras pneumonias, venceu cada um dos infindáveis invernos do Sul. A menina de cabelos cacheados corria pelos campos verdes, deixando para trás todas as dores. Viu o céu estrelado, o arco-íris depois da chuva. Nas navegadas no Arroio Pelotas, sentiu o vento no rosto. Até que um dia cresceu.
A adolescência chegou pulsante. Se emocionou com Beatles, descobriu Tarantino. Pisou o mundo com seu All Star. Na inesquecível aventura com os pais, cruzou a Europa de Fusca. Mas, um belo dia, um vírus surgiu. A pandemia trouxe isolamento, incertezas. A sombra do medo voltou a espreitar. Planos foram congelados. Os 15 anos com abraço de plástico e o namoro adiado. O cinema com os amigos saiu de cartaz. Tempos de angústia.
A ciência trabalhou forte, trazendo de volta a luz. Surgiu a vacina. O pequeno frasquinho da esperança. Mas esse enredo passa por outras escolhas. O Plano Nacional de Imunização não incluiu crianças e adolescentes com comorbidades na vacinação. Com isso, colocam Sofia novamente na incubadora. Mas 16 anos depois, nós aprendemos a desbravar o impossível. Queremos #VacinaSim!
GABRIELA MAZZA | JORNALISTA, MÃE DA SOFIA
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