sexta-feira, 25 de junho de 2021

25 DE JUNHO DE 2021
DAVID COIMBRA

As lições da desgraça de Moro

Sergio Moro não caiu em desgraça por causa das mensagens hackeadas. Nem por causa da sua atuação na Lava-Jato. Sergio Moro caiu em desgraça porque deixou a magistratura para ingressar no governo Bolsonaro.

Essa decisão foi um erro tão estrondoso que comprometeu não apenas sua própria imagem; comprometeu a luta contra a corrupção no Brasil.

Sergio Moro, em certo momento, havia se tornado um símbolo. Ele representava a mudança: o Brasil agora tinha um sistema que punia quem cometia ilícitos, não importando de quanto dinheiro ou poder o infrator usufruísse.

Foi exatamente aí, nessa unção de Sergio Moro, que o mecanismo da corrupção encontrou a fresta na muralha que o cercava. Porque desmoralizar um homem é muito mais fácil do que derrotar um sistema imparcial, que funciona por si, como uma máquina. O homem pode ser destruído; o método fica.

Assim, Moro foi elevado a uma estatura que não possui. Olhe bem para ele. Olhe. Ele não tem carisma. Ele é uma figura quase anódina. Até porque foi treinado para se comportar de acordo com os ritos processuais. Moro é a própria formalidade. Nunca fez uma declaração arrebatada, nunca perdeu a linha, nunca emocionou ninguém com um discurso ou um gesto. Mesmo assim, os inimigos da Lava-Jato o promoveram a líder de uma complexa conspiração política, tendo inclusive a suposta participação de órgãos da inteligência dos Estados Unidos.

Peço mais uma vez: olhe para Moro. Observe-o bem. Você acredita que este homem, só com sua vontade, conseguiria derrubar um governo que estava havia 12 anos enraizado no poder e, de quebra, desmontar uma histórica articulação entre o Estado e as grandes empreiteiras, uma engrenagem que funciona no país inteiro há cinco séculos? Esse discreto juiz de primeira instância tinha tamanha força?

Não. A resposta é não. Moro só é super-homem nos bonecos de Olinda.

A criptonita de Moro foi sua vaidade. Ele acreditou que era o salvador da pátria. E, pior, acreditou que, depois de fustigar os políticos como jamais aconteceu na história do Brasil, poderia se consagrar tornando-se um deles. Posso ver Moro chegando a Brasília e os políticos, juízes e empreiteiros esfregando as mãos de contentamento.

Essa é uma história cheia de lições. Uma delas, sobre o cuidado que devemos tomar nas decisões estratégicas. Erros cometemos todos os dias, mas um único deslize estratégico pode causar dano irreparável e comprometer uma vida. Pense bem, portanto, quando você estiver com vontade de fazer uma mudança de rumo brusca. O melhor é ponderar, ouvir opiniões, ser cauteloso.

Outro ensinamento que essa história nos dá é a respeito do Brasil. O Brasil se adapta, mas não muda. Como a água, que toma a forma do recipiente que a contém, o Brasil "evolui" de acordo com a evolução dos tempos, sem jamais deixar de ser o que sempre foi. O Brasil é maleável, flexível e, ao mesmo tempo, inamovível. No Brasil é inútil lutar. Porque, no fim, eles vencerão.

DAVID COIMBRA

Nenhum comentário: