12 DE JUNHO DE 2021
MARCELO RECH
O alerta peruano
A primeira salva de alerta ecoou da longínqua Filipinas em maio de 2016. Lá, um desatinado populista de extrema direita, Rodrigo Duterte, foi eleito após uma campanha em que atacava a política tradicional e prometia eliminar traficantes de drogas que infernizam a vida filipina. A torrente extremista-populista se seguiu com a impensável vitória de Donald Trump nos EUA, com a condução de Matteo Salvini a vice-primeiro-ministro na Itália e a acachapante eleição no Brasil de um até então obscuro ex-capitão afastado do Exército por indisciplina.
Com pequenas variações, o modus operandi foi o mesmo: o marketing anti-establishment, a unção de inimigos a serem riscados do mapa (terroristas e mexicanos ilegais nos EUA, imigrantes na Itália, “comunistas” e bandidagem no Brasil), o uso de redes sociais para espalhar fake news e desencadear ondas de indignação e o consequente ataque à imprensa que se interpõe diante das mentiras e do fanatismo. A Turquia de Erdogan, a Rússia de Putin e a Índia de Modi, ainda que com discursos mais moderados, já tinham dado a senha de que havia massas dispostas a sacrificar princípios da democracia e do bom senso em nome de serem governadas por autocratas com perfis populistas que só resolvem as questões que os elegeram em manifestações que sacodem as redes sociais.
A eleição de Joe Biden nos EUA despejou um oceano de racionalidade nas urnas e agora é o Peru de junho de 2021 que serve de alerta para nações presas a dilemas entre o péssimo e o muito ruim mesmo. No Peru, foram para o segundo turno um sindicalista sem qualquer experiência de gestão, misto de Guilherme Boulos na economia com Cabo Daciolo no moralismo, e uma herdeira política de ex-presidente preso, combinação de Fernando Collor na economia com Lula na Lava-Jato, que atribui a uma perseguição política suas três prisões por promiscuidade com a Odebrecht.
No primeiro turno, em abril, o eleitorado peruano tinha à disposição 18 candidaturas presidenciais, algumas sensatas e sensíveis às profundas reformas de que o país precisa para sair da crise sem provocar outras ainda mais graves. Na pandemia, o Peru sofreu em 2020 uma retração econômica de 15% e hoje exibe a mais alta taxa de mortalidade por covid no mundo. Na política, revezaram-se cinco presidentes e dois congressos em cinco anos. Mas, para apagar os incêndios, os peruanos colocaram dois piromaníacos no embate final pela Presidência. Pedro Castillo e Keiko Fujimori foram parar ali com menos de 19% dos votos do primeiro turno porque o eleitorado moderado se estilhaçou em abril. Como resultado da inépcia em se desviar do extremismo populista e da corrupção, o Peru, como definiu um eleitor de Lima, se viu diante da escolha entre o precipício e o abismo. Agora teve de saltar nele.
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