segunda-feira, 7 de junho de 2021


07 DE JUNHO DE 2021
ALMANAQUE GAÚCHO

Anita Garibaldi é mais ligada ao RS do que se imagina

O texto a seguir é uma colaboração do advogado e doutor em Direito Fábio Luiz Gomes, 68 anos, um dedicado pesquisador da história e da genealogia de famílias pioneiras do Estado.

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Atento a essa "pobreza" cultural do brasileiro, cujo conhecimento dos ancestrais, via de regra, se limita aos avós, decidi escrever um livro de história para minha neta Ana Maciel Gomes Bordini Xavier, projetado para ser concluído ainda este ano. É fruto de mais de 30 anos de pesquisas documentadas.

Uma das descobertas que muito me surpreenderam foi nosso parentesco com Anita Garibaldi, a heroína casada com Giuseppe Garibaldi, herói dos dois mundos. Em toda vasta bibliografia sobre Laguna, de imigração açoriana, sobre Sorocaba (SP) e o Rio Grande do Sul, não encontrei nenhuma referência aos seus ancestrais "Antunes Maciel".

Os Antunes Maciel eram todos descendentes de João Maciel, originário de Braga, que veio para o Brasil ainda no século 16 e se tornou um dos "senhores" de Sorocaba, embora tenha atuado também em Minas Gerais. Sequer nas monografias sobre Garibaldi ou sobre a própria Anita encontrei a referência a essa ancestralidade.

Anita, nascida Ana Maria de Jesus Ribeiro, era filha de Bento Ribeiro da Silva e de Maria Antônia de Jesus Antunes. O pai de Anita nasceu em São José dos Pinhais, na região das "vacarias" de Curitiba, em 1777, e se tornou tropeiro. Chico Bentão, como era chamado em razão do seu porte físico, era filho de Manuel Colaço e Ângela Maria. Certamente por sua atividade como tropeiro, acabou relacionando-se com os Antunes Maciel, pois eram estes proprietários de terras naquela região, negociavam gado e tinham grande influência. Bentão acabou casando-se com uma Antunes Maciel, pois Maria Antônia de Jesus Antunes (mãe de Anita), segundo Paulo Markun (no livro Anita Garibaldi; editora Senac, quinta edição), "era filha do segundo casamento de Salvador Antunes, paulista de Sorocaba que se mudara para Laguna." Depois do casamento, e cansado da atribulada vida de tropeiro que o obrigava a passar a vida em cima do lombo de um cavalo entre Laguna e Lages, Bentão resolveu mudar-se para o Rincão dos Morrinhos, à margem esquerda do Rio Tubarão, pertencente a Laguna.

A mãe de Anita era, na verdade, Maciel e sobrinha-neta da nossa ancestral Maria Moreira Maciel, ou seja, a mãe da Anita era neta de um irmão de Maria Moreira Maciel. Assim, o pai de Maria Moreira Maciel, coronel Antônio Antunes Maciel (filho do imigrante João Maciel) era ancestral comum nosso e de Anita Garibaldi e, em outras palavras, trisavô materno de Anita e avô em quarto grau das minhas duas bisavós paternas, quais sejam, Rozaura Maciel Braga e Virgilina Pereira Dias. Maria Moreira Maciel, que era neta do bandeirante Pascoal Moreira Cabral, casou-se em segundas núpcias com João de Magalhães, cuja unanimidade dos historiadores aponta como o primeiro português em "missão oficial" a ocupar o Rio Grande do Sul, com a historicamente conhecida Frota do Magalhães (uma tropa de 30 soldados a cavalo), em 1719, e que, depois de fundar a Real Fazenda do Bojuru, nas cercanias do hoje município de São José do Norte, estabeleceu-se em Viamão e gerou a descendência dos "Maciéis" da região de Santo Antônio da Patrulha, pois seus descendentes com Maria Moreira Maciel, excluído o filho Bernardo, adotaram o patronímico Maciel, e não Magalhães.

O avô materno de Anita, Salvador Antunes Paes (adotou o Paes da mãe, e não o Maciel do pai), veio de Sorocaba para Laguna com o pai Antônio Antunes Paes, irmão de Maria Moreira Maciel, onde casou-se com Quitéria Maria de Jesus de Souza em 1787, tendo a mãe de Anita nascido nessa cidade em 1788. Maria Moreira Maciel também viera para Laguna, onde casou-se com João de Magalhães em 1745.

As referências sobre Anita e sua família são sempre no sentido de sua extrema simplicidade, chegando às raias da quase miserabilidade, como anota Lindolfo Collor em sua obra Garibaldi e a Guerra dos Farrapos.

Na verdade, Anita era descendente do tropeiro que se casou com uma "filha de patrão". Mas a mãe cedo ficou viúva com três filhos pequenos para criar longe de Sorocaba, terra da importante família de seu avô. Quem sabe até se a mãe de Anita não teria sido "rejeitada" por seus pais por haver casado com um "peão tropeiro".

Ainda conforme anota Paulo Markun em seu belo livro sobre Anita, "na vizinhança, Ana Maria era conhecida como Aninha do Bentão" e "só se tornou Anita em 1839, quando saiu da cidade com Giuseppe Garibaldi para nunca mais voltar".

RICARDO CHAVES

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