sábado, 9 de março de 2013



9 de março de 2013 | N° 17366
PAULO SANT’ANA

Sarças de Fogo

Ando preocupado com minhas interlocuções, isto é, com as minhas conversas com outras pessoas. Ou melhor, diálogos.

É que tenho notado um grave defeito entre algumas pessoas que falam comigo: enquanto eu estou falando, a outra pessoa não presta atenção no que digo porque fica concentrada no que ela vai dizer a seguir.

Se não presta atenção no que digo, a interlocução resta prejudicada.

Mas é um defeito grave que algumas pessoas têm.

Vou ser sincero, eu também posso ter defeitos, só que me cabe notar os defeitos dos outros. Os meus, cabe a eles censurar.

Não é muito fácil se portar bem num diálogo ou interlocução. O egocentrismo é o ponto central nas pessoas que não sabem se portar bem num diálogo.

Essa de não prestar atenção no que o outro está dizendo por estar engatilhando o assunto que vai introduzir a seguir é o mais frequente defeito na interlocução.

Em suma, estou falando de uma coisa que sempre foi abordada por todo mundo: é necessário ouvir numa conversa, só falar é intempestivo e também pode ser falta de educação.

A esse respeito, tenho repetido muito, nos debates de que participo, uma frase célebre do grande Winston Churchill: “Não me interrompe enquanto eu estiver te interrompendo”.

Churchill, por egocentrismo ou por brilhantismo adequado, devia pertencer a uma classe muito frequente de pessoas que tomam conta da conversa e não deixam os outros falar.

Cá para nós, se tivesse o destino me dado a ventura de ter conversado um dia com Churchill, faria de tudo para que só ele falasse na conversa comigo, eu me encantaria em ficar calado a escutar aquele gênio da raça anglo-saxã.

Esse fenômeno que estou abordando se multiplica por 1 milhão quando acontece nos programas de entrevistas no rádio e na televisão em que determinados apresentadores falam sempre mais que os entrevistados.

A impressão que deixam os entrevistadores é de que os entrevistados foram convidados ao programa apenas para servir de bonecos inertes para permitir o brilho dos entrevistadores.

E até mesmo quando os entrevistadores são brilhantes, o que não é lá muito comum, o programa se torna maçante para os ouvintes e às vezes até revoltante. Tudo por culpa, como sempre, do egocentrismo.

O Cândido Norberto, saudoso companheiro e amigo, que por sinal foi quem cometeu o pecado de me descobrir para o jornalismo, era daqueles que falava mais do que os entrevistados.

Um dia, Cândido convidou para ser entrevistado por ele no Sala de Redação, programa de que foi o criador, o escritor Josué Guimarães, com a finalidade de lançar seu novo livro.

O Josué entrou no estúdio e ficou esperando a sua vez. Mas esperou quase uma hora, não disse uma palavra, só escutava o Cândido. Até que por fim o Cândido lascou no microfone: “Josué, estamos chegando ao final do programa, mas, afinal, qual é o nome do teu novo livro?”.

E o Josué respondeu: “Cândido, muito obrigado por teres permitido que eu pelo menos dissesse aqui o nome do meu livro, é Sarças de Fogo”.

Ato contínuo, o Cândido encerrou o programa.

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