23
de junho de 2015 | N° 18203
POLÍTICA
O PT NO DIVÃ
LULA:
A GENTE SÓ PENSA EM CARGO
O PT
ESTÁ VELHO e precisa construir nova utopia, avalia ex-presidente ao defender a
renovação em razão da crise vivida pelo partido
Menos
de 10 dias depois de o PT realizar seu congresso nacional em que frustrou os
que queriam mudanças radicais, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez
ontem duras críticas ao partido que ajudou a fundar há 35 anos e levou ao poder
nacional. Lula disse que o PT está velho, viciado em poder, apegado a cargos,
perdeu sua capacidade de gerar sonhos e utopias, não mobiliza mais as multidões,
a não ser em troca de dinheiro, e se afastou perigosamente da juventude. Ele
aventou a necessidade de uma “revolução” no partido.
– Não
sei se o defeito é nosso, se é do governo. O PT perdeu um pouco a utopia. (...)
Hoje, a gente só pensa em cargo, a gente só pensa em emprego, a gente só pensa
em ser eleito.
E
acrescentou que a crise vivida pela sigla coloca a legenda em uma encruzilhada:
– Temos
de definir se queremos salvar nossa pele e nossos cargos ou se queremos salvar
nosso projeto.
Na
quinta-feira passada, Lula fez desabafo semelhante, mas direcionado a divergências
com a presidente Dilma Rousseff. Em encontro com religiosos, o ex-presidente
disse que a aprovação de Dilma e a dele está no “volume morto”, em referência à
crise hídrica em São Paulo. A do PT, acrescentou, está abaixo desse nível. Para
Lula, o momento é o mais dramático vivido pelo partido.
Durante
o seminário Novos Desafios da Democracia, ontem, Lula repetiu que o partido
precisa se reaproximar da juventude e não pode deixar que prospere o discurso
que afasta as pessoas da política.
– Como
a gente pode falar em renovação se não tem um jovem aqui? – questionou olhando
para a plateia, selecionada pelo próprio Instituto Lula.
DIFICULDADE
DE SER DEMOCRATA ENQUANTO SE ESTÁ NO GOVERNO
O ex-presidente
lembrou que, no passado, a capacidade de mobilização do PT era muito maior. Ele
comentou que a sigla “colocava duas, 3 mil pessoas na rua, cada uma vestindo a
camiseta do partido, cada um carregando bandeira do partido”. Atualmente, ninguém
vai se os candidatos não liberarem as pessoas de seus gabinetes, comparou.
A
programação original não previa um discurso de Lula – o petista pediu a vez
quando o tema foi imprensa. Ao ouvir o debate sobre Venezuela, Lula mandou um
bilhete para a assessora Clara Ant, que presidia a mesa, avisando a intenção de
falar.
– Nem
tem muita oposição aqui (no Brasil). A oposição é pela imprensa – disse ele,
defendendo a regulamentação da mídia e afirmando que “nove famílias controlam” o
setor no país.
Entre
as reclamações, Lula afirmou que é mais difícil manter a postura democrática
depois que se chega ao governo. Mas disse que é importante aprender a se manter
no poder, mantendo as regras democráticas:
– Enquanto
você é oposição é muito fácil ser democrata, pode sonhar, pensar, acreditar. Mas,
quando chega ao governo, precisa fazer, tomar posições.
No
debate que recebeu o ex-primeiro-ministro da Espanha Felipe González, do
Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), Lula afirmou que pretende chamar
para palestras representantes dos partidos que estão surgindo na Europa, como o
Podemos.
– O
PT era, em 1980, o que é hoje o Podemos (partido espanhol). A gente nasceu de
um sonho, de que a classe trabalhadora pudesse ter vez e ter voz, e construímos
essa utopia. Há necessidade de repensarmos a esquerda, o socialismo e o que
fazer quando chegamos ao governo – disse o ex-presidente, ao refletir sobre
como recuperar essa ideologia.
Sem
citar sua sucessora, Lula também exaltou iniciativas de sua administração.
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