quarta-feira, 17 de junho de 2015



17 de junho de 2015 | N° 18197
SAÚDE PÚBLICA COM AMIDO DE MILHO E SEM HIGIENE

FRAUDE AGORA É NO QUEIJO

MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL investiga adulteração do derivado de leite produzido por indústria de Três de Maio e vendido em 72 estabelecimentos de 23 cidades do Estado

Depois de oito operações de combate ao leite adulterado, o Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul deflagrou, ontem pela manhã, a primeira ação contra derivados do produto. Na Queijo Compen$ado 1, o MP descobriu esquema de fraude no queijo fabricado pela indústria Laticínios Progresso Ltda, de Três de Maio, no noroeste do Estado. O produto seria revendido ilegalmente por 72 estabelecimentos como padarias e supermercados de 23 municípios de Região Metropolitana, Vale do Sinos, Vale do Caí, Serra e Litoral Norte.

A exemplo das ofensivas anteriores, o objetivo dos fraudadores seria fazer o produto final render mais e, consequentemente, obter lucro maior. Desta vez, a substância usada na multiplicação era amido de milho (leia ao lado como seria o esquema).

– Para fazer um quilo de queijo, o normal é usar 10 litros de leite. Nessa fraude, usavam cinco ou seis litros e adicionavam amido de milho para compensar. A principal característica final é um queijo farelento, sem cremosidade. Conforme relatos, não derrete e tem forte odor – explica o promotor Mauro Rockenbach.

Foram cumpridos três mandados de prisão preventiva. Em Três de Maio, foi preso Eduardo André Ribeiro, um dos sócios da Laticínios Progresso. Em Ivoti, onde funcionava um depósito, foram detidos Volnei Fritsch, 50 anos, outro dono da empresa, e Pedro Felipe Fritsch, 24 anos, filho de Volnei. Os sócios poderão ter os bens sequestrados.

A investigação começou há cerca de quatro meses a partir de escutas feitas na Leite Compen$ado. Queijos do tipo lanche e mozarela seriam produzidos com leite de má qualidade, descartado pela indústria que beneficiava o produto.

De acordo com Rockenbach, o consumo do queijo da Progresso não é nocivo à saúde, mas, como se trata de produto adulterado, contém elementos, como proteína e vitaminas, aquém dos limites estabelecidos por lei – por isso, é menos nutritivo. Ainda, apresenta danos ao sabor e à textura.

Além de formação de quadrilha e adulteração do produto, o MP aponta que a Laticínios Progresso sonegaria impostos – o faturamento mensal declarado seria de R$ 50 mil, mas, na realidade, superaria R$ 1 milhão. Em 2011, a Receita Estadual teria descoberto que os donos da empresa supostamente confeccionavam notas falsas para levar as cargas a Ivoti. O mesmo sistema e tipos de notas foram encontrados nas buscas ontem.

Outra ilegalidade tem relação com a logística da Progresso: por lei, a empresa só poderia vender seus produtos dentro dos limites da cidade de Três de Maio, já que possui apenas registro municipal.

PRODUTO DEVE SER RECOLHIDO

Nas duas sedes da empresa foram apreendidos documentos e notas, inclusive de compra de amido de milho – o produto não foi encontrado na empresa –, além de um caminhão. Tanto a fábrica quanto o depósito foram interditados. Três toneladas de queijo encontradas em Ivoti foram inutilizadas e amostras serão analisadas em laboratório.

O MP solicitou que a Secretaria Estadual da Saúde inspecione os estabelecimentos comerciais que possam ter recebido o produto e recolha o que for encontrado. O consumidor que tiver queijo da Laticínios Progresso em casa pode devolvê-lo onde o comprou.

Segundo os promotores, o esquema teria a participação do secretário municipal de Agricultura e Meio Ambiente de Três de Maio, Valdir Ortiz, e do fiscal sanitário de Estância Velha Roberto Nardi. Ambos tiveram decretada medida cautelar penal, vão responder em liberdade e devem ser afastados de suas funções. Uma planilha apreendida pelo MP registraria o pagamento de R$ 1 mil para Ortiz em fevereiro de 2014, mas ainda não se sabe se o pagamento seria frequente. Arnildo Roesler, motorista da empresa, também teve medida cautelar decretada.

– Além de acobertar e não acionar as autoridades, o secretário repassava verbas do Fundopem (Fundo Operação Empresa) para a empresa e o fiscal ajudava na distribuição para outras regiões e estava auxiliando a fábrica na obtenção de cadastro estadual – diz Rockenbach.

A investigação do MP não apontou, até agora, o envolvimento de indústrias nem de produtores de leite na Queijo Compen$ado. As investigações prosseguem e há suspeita de fraudes em outras queijarias – além de indícios de esquemas em mais derivados de leite.


vanessa.kannenberg@zerohora.com.br

Nenhum comentário: