14 de junho de 2015 | N° 18193
MARTHA MEDEIROS
Saudoso e-mail
Agora, você troca mensagens instantâneas, um toma lá dá cá
que faz todo mundo parecer meio esquizofrênico
Quando o e-mail surgiu, foi considerado um meio prático,
porém frio de se corresponder. Mas agora que o e-mail foi reduzido a pó por
Face, WhatsApp & Cia, agora que ele sobrevive apenas para a troca de
mensagens profissionais (e olhe lá), agora que ele respira por aparelhos, já
podemos lembrar, nostálgicos, de como ele era refinado.
O e-mail entrava discretamente na sua caixa de mensagens e
ficava ali, quietinho, aguardando pacientemente o momento em que o destinatário
pudesse lê-lo e respondê-lo. Havia todo o tempo do mundo para isso. A resposta
podia ser bem articulada, revisada e enviada sem nenhuma aflição.
Claro que não
era agradável deixar alguém aguardando uma semana, mas na maioria das vezes não
levava tanto tempo assim, o retorno geralmente era dado no mesmo dia ou no dia
seguinte, e isso era suficiente para comemorar esta vibrante conexão virtual.
Isso foi ontem. Anteontem. Um século atrás. Dá no mesmo.
Agora, você troca mensagens instantâneas, um toma lá dá cá
que faz todo mundo parecer meio esquizofrênico. A questão do corretor de texto
é uma insanidade. “Oi, Patricia!” se transforma em “Ouviu, patife!” e o que era
para ser um gentil cumprimento vira um insulto. Não preciso dar outros
exemplos, você passa por isso todos os dias: corrigir com avidez as bananices
que o corretor comete à revelia.
Mas o mais grave nem é isso.
É ter que responder de bate-pronto. Eu às vezes não sei
exatamente como reagir a algo que me escreveram, gostaria de ter ao menos cinco
minutos para processar a informação e entender o que estou sentindo antes de
mandar a resposta, cinco minutos não é tanto tempo, é? Ora, em cinco minutos o
interlocutor já se atirou do oitavo andar, sentindo-se rejeitado pelo meu
silêncio.
Não, senhora, você não pode pensar nem cinco, nem dois, nem
meio segundo, precisa escrever feito um raio, num flash, sem pestanejar, porque
o outro está digitando ao mesmo tempo e isso configura um duelo, ganha quem
disparar primeiro. Portanto, seja ligeira e tenha presença de espírito – ainda
isso: é imperativo mostrar que é engraçadinha.
Só que não sou engraçadinha. Sou cautelosa. Ponderada. Gosto
de construir frases. Criar raciocínios. Sou escritora, me dê um desconto. Não
consigo me contentar com frase de telegrama, que, aliás, é uma coisa bem
antiga, se não me falha a memória.
Bom mesmo seria se a gente continuasse a se comunicar frente
a frente, transmitindo nosso estado de espírito com o próprio rosto, sem
precisar do auxílio de algum emoji. Se a gente pudesse falar com calma e o
outro responder com calma. Mas isso parece que também é coisa muito antiga.
Nasci atrasada, estou sempre correndo atrás do tempo: aquele
tempo que o e-mail me dava pra pensar.
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