10 de junho de 2015
| N° 18189
MOISÉS MENDES
·
O Batman
Batman olhou o céu
estrelado e respirou fundo. Disse que gostava do céu de Porto Alegre visto da
Redenção, sem interferência das luzes da cidade, e avisou que iria pegar o
ônibus para Viamão. Batman mora numa pensão do Centro, com direito a café da
manhã.
Depois, jogou a capa no ombro, como se fosse um poncho, e disse à moça que
salvara do ataque de um tarado: eu estar sempre por perto; se der problema, me
chamar pela WhatsApp ou pela 190 do Brigada.
Batman está desde maio do ano passado em Porto Alegre. Veio para a Copa, só
para zanzar, disfarçado de torcedor holandês. Enturmou-se nas festas da Cidade
Baixa, geralmente à paisana, com uma camiseta laranja e um chapéu de bobo da
corte.
Às vezes, aparecia a rigor, com capa e tudo. Achavam que ele seria um fã idiota
do Batman. Mas algumas gurias desconfiaram daquele queixo proeminente e da
boca, com o biquinho inconfundível do Batman.
Quando bebia demais, o herói discursava sobre uma cadeira: eu amar Porto
Alegre, amar os gaúchos, adorar a Lima e Silva. Dependurava-se nos postes da
João Alfredo e dava saltos mortais. A gurizada aplaudia, os cachorros pulavam e
latiam.
A Copa acabou naqueles 7 a 1 e ele ficou. Fez amizades e agora, em situações de
emergência, aparece para ajudar, socorrer, apartar brigas. Foi o que aconteceu
no sábado à noite, quando um oficial da BM, informado pelo WhatsApp de que
havia risco de assaltos e assédios na festa da Serenata Iluminada da Redenção,
disse a dois jornalistas: chamem o Batman.
Em menos de 20 segundos, lá estava ele. Quem não conhece a Cidade Baixa e seus
entornos acha que a BM resolveu tudo. Não foi. Foi o Batman. Mesmo assim, ele
ainda é visto como um imitador, como aquele Batman carioca do Leblon.
Talvez não. Gaúchos
têm tudo o que outros povos não têm. Os mais valorosos heróis, o maior facão, o
maior clássico de futebol do mundo, os homens mais valentes. Por que não teriam
um Batman?
Na madrugada de domingo, quando pegou o ônibus para Viamão, depois de afugentar
os tarados da Redenção, Batman acenou da janelinha e atirou beijos para as
gurias.
O oficial da Brigada que, na hora do aperto, mandou chamá-lo olhou para Batman
como um parceiro, mas certo de que ele é um impostor.
Algumas gurias, poucas, sabem que não é bem assim. As gurias têm certeza de que
ele é mesmo o Batman. É o nosso melhor legado da Copa. Até o Homem-Aranha do
Menino Deus concorda.
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