11 de junho de 2015 | N° 18190
LUCIANO ALABARSE
SER E ESTAR
Zélia Duncan e Martinho da Vila
cantam, juntos, É de Estarrecer, cáustica canção de Itamar Assumpção. Certeiro,
Itamar põe o dedo na ferida: ser e estar, o verbo to be em inglês, “parece a
mesma coisa, mas não é”. Essa indistinção aglutinadora explica muitas das
tergiversas ações americanas ao longo da História. Americanos agem como se
fossem a polícia do mundo e correm atrás de quem não lhes legitima o posto,
tanto faz se terroristas do Estado Islâmico ou mafiosos da Fifa. To be. Uma
palavrinha tão pequena, uma confusão semântica dos diabos. Ser e estar, a mesma
coisa? É de estarrecer.
Tergiversar, em sua sequência de
consoantes duras, é uma das minhas palavras preferidas. Desassossego é outra.
Linda no significado e na sonoridade, obsessiva, excessiva pela repetição da
mesma letra sibilante, poética, perfeita. Desde que comecei a ler A Ilha da
Infância, terceira parte de Minha Luta, as memórias de Karl Ove Knausgard, ando
assim: desassossegado, com todos os “esses” a que tenho direito.
Hoje uma das mais potentes vozes
da literatura mundial, o norueguês faz parecer fácil o que é extremamente
difícil: imantar o leitor à leitura do início ao fim. Knausgard me devolveu a
sensação de querer devorar vorazmente as páginas de um livro. Editados pela
Companhia das Letras, temos já os três primeiros volumes da série. São seis.
Outro escritor que tem minha total atenção é Gonçalo M. Tavares. Narrativas
curtas, influências kafkianas, fluência absoluta, humor e dor na medida.
Segundo nos afirmou Saramago, será o próximo ganhador do Nobel em língua
portuguesa.
Na semana em que estreio Crime
Woyzeck, no Theatro São Pedro, registro outra peça local, maravilhosa,
conectada à dramaturgia alemã: As Quatro Direções do Céu, inspirada direção de
Camilo de Lélis. No auge de sua maturidade, Camilo contribui decisivamente para
fortalecer nossa qualidade cênica. 2015 marca uma temporada teatral que tem
oferecido à cidade diversão e arte em altíssimo nível. Não dá pra ignorar.
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