Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
quarta-feira, 30 de abril de 2008
30 de abril de 2008
N° 15587 - Martha Medeiros
Um mundo sem fronteiras
Muros caíram, países se unificaram e adotaram a mesma moeda, idiomas se propagaram e a internet coloca você em qualquer cidade em tempo real: a sensação é de que o mundo não tem, mesmo, mais nenhuma fronteira. Avança-se muito, para todos os lados, e rápido. Ninguém pára você.
Seus pais o educavam, hoje lhe permitem tudo. O acesso à informação era restrito, hoje é total. Não há mais censura, viva! Por outro lado, a impunidade também está vencendo o jogo, a lei custa a te pegar. De celular em punho, você manda notícias de onde estiver. Você tem tudo à disposição, o mundo é um supermercado. Quer homem, quer mulher?
Não há mais assunto proibido, escolha o tema que desejar, é só postar. Diga sempre o que pensa, inclusive ofensas! É o que todos incentivam. Faça o que tiver vontade, siga seus instintos, não renuncie a seus desejos.
Tudo pode.
Tire pedaços do corpo, injete toxinas no rosto, mude de cara. Case e descase mil vezes, tenha quantos filhos quiser, tire quantos filhos quiser, você tem que conhecer o Marrocos, você tem que fazer terapia, você é a soma das suas escolhas.
Ninguém te impede nada, você é seu dono.
Claro que tudo isso é uma ilusão, uma liberdade comprada em revista, televendas da euforia, só que sem delivery, você não recebe nada em casa, fica apenas com a impressão causada: a de que esse mundo aberto, escancarado, é um convite ao impulso, ao ir em frente sem pensar.
Expansões geográficas, virtuais e cerebrais não terão atingido também os sentimentos? Havia zonas fronteiriças em nós. Até um determinado ponto, podíamos sentir raiva, mas jamais atravessar para o campo da insanidade.
Podíamos terminar uma relação, mas ferir e humilhar era desnecessário. Ser autêntico não significava ser mal-educado. Falava-se muito em "a liberdade de um termina onde começa a liberdade de outro" - quando foi isso, na era paleozóica?
Você pedia dinheiro emprestado, mas fraudar já era um pouco demais. Você contava umas mentirinhas, mas prestar falso testemunho era outra coisa. Tiravam-se fotos, mas elas ficavam restritas a álbuns e porta-retratos, não iam para o YouTube.
Declarações de amor eram ditas entre quatro paredes, não no Orkut. Assim como no mar, não era prudente ultrapassar a arrebentação.
O limite do prazer ia até o risco de afogamento. Sabia-se até onde se podia chegar. Para ser alegre, não precisava ser descontrolado. Havia um limite entre ser sincero e ser grosseiro. E podíamos dar uma palmada no bumbum, mas matar era exagero.
Uma ótima quarta-feira e um excelente feriado do Dia doTrabalho, para todos nós.
30 de abril de 2008
N° 15587 - Paulo Sant'ana
Um incesto revoltante
Não se sabe o que é mais brutalmente perplexo neste caso do cativeiro austríaco: se a perversidade do pai ao manter a filha presa num porão durante 24 anos ou se a dor lancinante da filha ao ver-se privada do sol e da sociabilidade por mais de duas décadas.
O que espanta neste caso austríaco e em tantos outros de que temos conhecimento, alguns em nosso meio, é a mais completa ausência de piedade nos corações e mentes dos criminosos.
Não há a mínima concessão à dor e à dignidade dos agredidos. Pelo contrário, os agressores parecem alimentar-se da dor das vítimas. Eles só se sentem realizados quando produzem aflição e ruína físicas ou mentais em suas vítimas.
Estou convencido de que todos esses casos de tortura e crueldade que se cometem contra indivíduos ou coletividades estão ligados umbilicalmente ao prazer sádico dos agressores.
Dessa forma, são atos insanos, cometidos por mentes atingidas por doença mental grave, irreversível.
É a conhecida sentença de que o homem tem um defeito de fabricação.
Se isso é verdade, alguns homens permanecem doentes após o recall e cada vez mais aprofundam sua morbidez, devastando os outros.
Com a colaboração do Olyr Zavaschi, estou publicando a impressionante e horrenda teia de incestos que o austríaco realizou na masmorra de sua casa, interpenetrando todos os parentescos entre si:
1) Ele é ao mesmo tempo pai e avô dos seus filhos.
2) Ele foi ao mesmo tempo marido e pai da filha.
3) Ele é genro de sua mulher.
4) Ele é genro e sogro de si mesmo.
5) A esposa dele é avó e madrasta dos filhos da filha.
6) A esposa dele é também sua sogra.
7) Os filhos nascidos no porão são filhos e netos do pai.
8) Os sete nascidos no porão são filhos e irmãos da mãe.
9) Os sete irmãos nascidos no porão são também tios maternos entre si.
Este caso está chocando o mundo. Tanto pela violência perpetrada contra a filha que gerava os filhos, submetida sexualmente pelo pai, quanto pela extensão de tempo do cativeiro, 24 anos significam uma vida inteira, subtraída pelo pai à filha, dor que ao que tudo indica pode ter-se tornado loucura.
A filha do criminoso sofreu prisão solitária durante 24 anos. Impossibilitada de gritar porque seu pai colocou vedação acústica em todas as paredes (ele é engenheiro), cedo desistiu de tentar avisar os vizinhos, os transeuntes ou a polícia.
O pai criminoso tomou cuidados meticulosos para que seu crime não fosse descoberto durante toda uma vida e para que pudesse se fartar sexualmente de sua filha.
Não há por certo no Código Penal austríaco nem em qualquer diploma legal de nenhum país uma punição adequada para a extensão desse crime.
E se esse delito vai ser muito difícil de ser esquecido pela Áustria, pela Europa e por toda a humanidade, imaginem-se as marcas de trauma que deixará nas vítimas, em todos os membros da infeliz família envolvida.
Há crimes que desafiam o esquecimento.
30 de abril de 2008
N° 15587 - David Coimbra
A precisão de Sheryl
Cada vez que vejo a Sheryl Crow penso a mesma coisa. Sabe quem é: aquela cantora americana, gosto das músicas dela. Pois a Sheryl está preocupadíssima com a natureza, o planeta e talicoisa e, por conta disso, adotou costumes radicais. Entre eles um que revelou em certa entrevista: Sheryl usa apenas uma folhinha de papel higiênico para limpar-se. Um único daqueles quadradinhos menores do que a palma da mão do Clemer.
Essa informação acerca de Sheryl me intriga. Como ela consegue ser tão precisa? Tão... certeira? Então, se ouço a Sheryl cantar ou se a vejo em fotos ou na TV, sempre lembro: um único quadradinho de papel higiênico, um único!!! Tudo o mais sobre Sheryl é secundário para mim, por mais que ela já tenha feito.
É o que vai acontecer com Ronaldo Nazário, a partir de agora. As pessoas olharão para ele e pensarão: ele se regalou com três travestis! Três travestis!
Não tenho o menor preconceito contra travestis ou contra quem se relaciona com travestis. Não vejo nenhum problema, por Deus. Mas Ronaldo, ele que já teve Ronaldinhas e Raicas e Danielas Cicarellis, ele que já ganhou uma Copa do Mundo, que já fez gols às centenas, ele que já fez tanto por tantos, ele, agora, por muito tempo, será lembrado tão-somente por esse episódio.
Vou dizer: o mundo é mau.
Há certo tempo, entrou na Redação uma moça deveras formosa. Andava pelo mundo em cima de pernas compridas, que terminavam em nádegas redondas. Aliás, tornou-se célebre, entre os colegas, pela circunferência de suas nádegas.
- São as nádegas mais redondas que já vi! - dizia sempre um dos gaiatos aqui do Esporte.
- O mundo todo - comparava outro - as nádegas dela são o mundo todo. Redondas como o planeta.
Eram, de fato, bem redondas. Mas bem redondas. Todos só falavam naquelas nádegas redondas, até que um amigo nosso, de outra editoria, entabulou um caso com a dita cuja. Foi algo rápido.
Porém intenso. Ao cabo do que, ela o abandonou e ele, ressentido, saiu pelo jornal divulgando os hábitos sexuais da moça. Relatou as preferências dela, inclusive uma que deixou a todos... como direi? Enfeitiçados. Isso: ficamos todos enfeitiçados.
- Então ela gosta disso? - perguntavam-se os colegas de Redação.
E, a partir daquele dia, qualquer um que a encontrava, pensava: "Ela gosta daquilo, sim, ela gosta daquilo". Os talentos profissionais da moça, suas nádegas redondas, suas pernas longas, sua simpatia, nada mais vinha em primeiro lugar. Apenas: "Ela gosta daquilo".
Já disse, o mundo é mau.
Abel, o profissional
O futebol, sempre digo, não passa de um jogo. E, como tal, é uma atividade rasteira e superficial. Em geral, as pessoas envolvidas com o futebol são exatamente assim: rasteiras e superficiais. Mas o futebol é, também, o Brasil que dá certo. O futebol brasileiro funciona, e funciona bem. Os médicos, preparadores físicos, técnicos, jogadores, todos são os melhores do planeta. Disparado.
Mas a competência no futebol brasileiro tem uma fronteira da qual não passa: o vestiário. Foi o que um dia disse o velho técnico Flávio Costa, do Vasco e da Seleção:
- O futebol brasileiro só é profissional da boca do túnel para dentro do campo.
Eis aí uma das mais sólidas constatações que fiz nesses mais de 20 anos que cubro futebol: que os profissionais orgulham-se justamente de ser profissionais. E eles são. Cada vez mais.
O emocionalismo, as loucuras, as paixões, tudo o que é excesso fica restrito ao âmbito dos torcedores e dos dirigentes. Que, afinal, não passam de torcedores, também. Os profissionais sabem que dependem da sua atividade para sobreviver. Não a arriscam por um arroubo. E respeitam uns aos outros.
Admiro essa postura dos profissionais do futebol. Por isso, sempre fico decepcionado quando um deles se porta de outra maneira, como ocorreu com o técnico Abel Braga, dias atrás.
Segunda-feira, Abel estava sendo criticado por um apresentador de programa de TV de São Paulo e ligou para a emissora a fim de rebater. Em sua defesa, criticou Zero Hora. Insinuou que o jornal "torce" pelo Grêmio e contra o Inter.
Não pretendo defender o jornal. O jornal não precisa da minha defesa. Pretendo examinar a atitude de Abel. Fosse ele um torcedor, eu entenderia. O torcedor é passional. Para o torcedor, o mundo é um Gre-Nal.
Mas Abel, não. Abel é um profissional. Jogou e treinou, por exemplo, no Flamengo, no Fluminense e no Vasco. Será que torcia por algum deles? Talvez sim. Supondo que torcesse pelo Fluminense: quando treinava o Flamengo e disputava um Fla-Flu, Abel jogava para perder?
Claro que não. Abel é um profissional.
Será que Abel acredita que um veículo de comunicação, qualquer veículo de algum sucesso, é menos profissional do que ele? Será que Abel acredita que os jornalistas, que dependem do jornalismo (e não do futebol) para viver, são menos profissionais do que ele? Será que acredita, mesmo, que uma empresa arriscaria sua sobrevivência por causa de um clube de futebol?
Claro que não. Abel é um profissional.
Nesses 12 anos em que sou editor de esportes de Zero Hora, não lembro de outro profissional do futebol que tenha feito declarações similares.
Por isso, não fico irritado com o que disse Abel, um técnico campeão do mundo, ilustrado, experiente, um profissional, enfim. Fico, só, decepcionado.
30 de abril de 2008
N° 15587 - Diana Corso
Ana Maria Taborda
No final da década de 70, a ditadura mostrava suas primeiras fissuras. Além de garantir a abertura, minha geração tinha outra missão importante: curar a própria ignorância cultural e a alheia. Anos e anos de censura e protestos e a promessa de que amanhã iria ser outro dia. Esse amanhã, sentíamos, estava em nossas mãos.
Entre outras coisas, discutíamos teatro com aquela urgência que desafiava a nos posicionarmos sobre tudo o que havia permanecido reprimido por tantos anos, como se fosse necessário rebatizar tudo que voltava à luz.
O teatro foi, durante a ditadura, um pólo de resistência inigualável, um dos raros acervos remanescentes de cultura num tempo em que a tradição, a família e a propriedade se organizaram para nos emburrecer.
Foi aí que, adolescente, com 19 anos, conheci Ana Maria Taborda. Mais que estudar teatro com ela (logo descobri que não levava jeito), sorvi cada gota da irreverência que fazia de sua concepção de encenação um modo de ver a vida.
Na casa em que ela trabalhava, nas oficinas, debates e peças que dirigia, ela ensinava que opções estéticas são opções éticas. Nunca esqueci disso e tento viver sempre com essa máxima.
Ana morreu dia 24 de março, aos 66 anos, de asma, antes de conseguir publicar sua tese sobre teatro. Com certeza, essa obra virá à luz postumamente. Faz décadas que não a via, mas não posso deixar de registrar a passagem dessa mestra na minha vida e na nossa cidade a cuja cena teatral ela, capixaba-carioca, dedicou anos de trabalho.
O teatro é uma espécie de oficina da arte. Quando atores de tevê e cinema desejam encontrar-se com sua essência é para ele que recuam, quando as luzes lá fora se apagam, é no seu interior que sobrevivem as centelhas.
Público pequeno, presencial; em cima do palco, uma pessoa faz de conta que é outra, dizendo palavras que não são suas. O ator é um fingidor, finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente, poderia ter dito Pessoa.
A arte, em suas diversas formas, coloca fora de nós, para que possamos ver melhor, nossos mais secretos guardados, e ao mesmo tempo faz o contrário: representa aquilo que não admitimos sentir ou pensar, devolvendo-o para nossa alma de modo perturbador.
O teatro permite isso da forma mais visível, na entrega do corpo do ator, sua face crispada, suada, seus perdigotos; nada ali é fingido. Ana, adeus e obrigada por permitir com que eu freqüentasse os bastidores da tua arte.
terça-feira, 29 de abril de 2008
JOSÉ SIMÃO
Imposto não é alto! Eu que sou baixo!
E sabe o que o Clodovil declarou no Imposto de Renda? Que o penteado do Frank Aguiar é cafona! BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
Direto do País da Piada Pronta! Inédito! Exclusivo! Portugal acaba de descobrir a vacina da dengue. O problema é conseguir vacinar todos os mosquitos! Rarará!
E o pensamento do dia: o Imposto de Renda no Brasil não é alto. Nós é que somos baixos. Rarará!
E um amigo meu estava preenchendo o Imposto de Renda, e olha o que ele escreveu na seção "Situação em 31/12/2007": "Crítica! Virgem Santa! Cruz Credo!".
E agora eu só pago um único imposto no Brasil: o IPN! IPorra Nenhuma! Não vou pagar mais IPORRA NENHUMA!
E sabe o que o Clodovil declarou no Imposto de Renda? Que o penteado do Frank Aguiar é muito cafona! Rarará! E sabe o que o Lula disse em Paulínia? Que o Brasil vai ter o primeiro "carro com cheiro de cachaça"!
Então, ele vai comprar todos direto da fábrica. ALCOOGICAMENTE correto! É o Pinga Flex. Em vez de entrar pra OPEP, vamos entrar pra OBEBE! Rarará! E Sampa agora é assim: basta um cara abrir a porta do carro que provoca congestionamento de 140 km.
Vou lançar o kit engarrafamento: geladeira de isopor, jujuba, bateria de celular, esmalte, lixa e uma "Playboy" no porta-luvas. E três cartazes estressados: "Não tenho moedinha"; "Não compro chiclete" e "Não sou tio de maloqueiro". Rarará!
E ontem foi o Dia da Sogra! Eu sugeri três presentes: um fogão bomba, uma dentadura da Louis Vuitton e um CD pirata do Roberto Carlos. E os Irmãos Bacalhau sugeriram um presente perfeito: um vôo de balão! Rarará!
E o Rubinho: "Ainda tenho muita lenha pra queimar". Então, vai dirigir pá de pizzaiolo. A F1 não é movida a gasogênio! Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
Ou, como diz aquele outro: é mole, mas trisca pra ver o que acontece! Antitucanês Reloaded, a Missão.
Continuo com a minha heróica e mesopotâmica campanha "Morte ao Tucanês". Acabo de receber mais um exemplo irado de antitucanês.
É que em Salvador tem uma peixaria com o cartaz: "Aqui até o peixe espada é fresco". Rarará! Mais direto, impossível. Viva o antitucanês.
Viva o Brasil! E atenção! Cartilha do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Compadre": balão com sacerdote a bordo. Rarará!
O lulês é mais fácil que o inglês. Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje, só amanhã! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno! E vai indo que eu não vou!
simao@uol.com.br
Neonacionalismo ameaça a globalização
Bob Davis, The Wall Street Journal
O mundo não é mais tão plano como antigamente. Na longa marcha para a globalização, fronteiras internacionais e barreiras comerciais vieram abaixo. O comunismo caiu. Muros protecionistas na América Latina e em outros lugares foram desmontados. Governos - que estavam sempre prontos a intervir no comércio - recuaram para dar a dianteira a forças de mercado mais amplas.
Num manifesto sobre a globalização, Thomas Friedman, colunista do "The New York Times", declarou que a internet e outras tecnologias de alcance mundial estavam apagando limites nacionais. O mundo, disse ele num best-seller de 2005, estava plano.
Não é mais assim. A economia mundial parece estar entrando numa época em que os governos reafirmam seu papel na vida das pessoas e das empresas. As barreiras estão sendo levantadas outra vez. Chamem isso de novo nacionalismo.
"A era da globalização fácil certamente está acabada", diz o especialista em petróleo e Prêmio Nobel de Literatura de não-ficção Daniel Yergin, cujo livro "The Commanding Heights", de 1998, detalha o triunfo dos mercados sobre as nações, a começar pela desregulamentação britânica no governo de Margaret Thatcher. "O poder do Estado está se reafirmando."
Há apenas dez anos, Ásia, América Latina e Rússia sobreviviam à base de empréstimos do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial. A União Européia estava escrevendo uma constituição para transferir o poder dos países membros para Bruxelas.
Agora, quem pedia emprestado esnoba o FMI e o Banco Mundial. Negociações de acordos comerciais estão engavetadas. Obstáculos para investimento estrangeiro surgem em todo o mundo.
Estatais estão se expandindo, principalmente no setor de petróleo e gás. Restrições à imigração ganham cada vez mais apoio da opinião pública em países dos Estados Unidos à Índia.
A influência crescente dos governos pode ser vista em gigantescos veículos de investimento de fundos governamentais, vários deles respaldados por países que cambaleavam financeiramente dez anos atrás.
Fundos soberanos da Ásia ao Oriente Médio agora sustentam instituições financeiras estremecidas nos EUA e na Europa, e em breve podem sair à caça de pechinchas imobiliárias. O aumento do poder de Estado também pode dificultar ainda mais a questão climática mundial -de todas, a mais sem-fronteiras.
O que explica esse papel maior dos governos? Os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 fizeram o mundo se concentrar em questões de segurança que só podem ser tratadas por governos nacionais. Países enriquecidos pelo boom de commodities cada vez mais reafirmam seu poder, com a Venezuela nacionalizando os campos de petróleo e a Rússia ameaçando cortar o fornecimento de gás natural para a Europa Ocidental.
Um contragolpe na integração econômica também pressiona os governos nacionais a se afastarem do multilateralismo: em dezembro, a maior parte das pessoas em 21 dos 34 países participantes de uma pesquisa da "BBC World Service" disseram que "o passo da globalização econômica" está rápido demais.
As mudanças não pressagiam uma era de completo protecionismo. Os 15 países que compartilham o euro desde 1999 vão continuar a fazê-lo, apesar de algumas queixas ocasionais.
Os governos continuam obedecendo às regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), mesmo se têm de reformular as próprias leis para cumpri-las. Friedman, o teórico do mundo plano, diz que a reafirmação do poder do Estado pode ser um "episódio" em vez de uma tendência, e que as tecnologias continuarão dando às pessoas a possibilidade de cruzar fronteiras.
Mesmo assim, há mais e mais indícios que os governos agora estão em ascensão.
Barreiras nacionais vêm sendo levantadas até na internet, o símbolo do mundo sem fronteiras. Ela foi projetada para ficar fora do alcance dos governos, transferindo poder para indivíduos ou organizações privadas.
Agora, sob pressão da Rússia, China, Índia e Arábia Saudita, a empresa americana que distribui endereços na internet está procurando meios de os países usarem o alfabeto de sua língua-mãe.
Os conhecidos .org, .com e códigos de países em endereços online serão substituídos por seus equivalentes em chinês, hindi e muitas outras línguas.
Se por um lado isso pode ajudar os locais a navegarem pela web, também pode impedir o acesso a muitos sites por usuários do exterior. Isso vai pôr fim à era em que qualquer um com um teclado de letras romanas podia ver sites em qualquer lugar da Terra - tirando o "World Wide" da "World Wide Web".
"Estamos assistindo ao passo-a-passo da balcanização da internet global", diz Tim Wu, professor de Direito na Universidade Columbia, em Nova York. "Ela está se transformando numa série de redes nacionais."
O fortalecimento dos governos nacionais se expressa em diferentes formas. Para os países ricos, geralmente significa impostos mais altos e mais regulamentação.
Nos 30 países mais ricos da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a receita de impostos como porcentual da economia local era maior em 2005, o último ano pesquisado, do que dez anos antes. Isso por causa do aumento nos custos de saúde e previdência social para os governos.
Nos EUA, a inclemência e abrangência da atual crise financeira corroeu a liberdade dos mercados de operarem com menos controle governamental. A questão agora não é se a regulamentação vai aumentar, e sim quanto.
Os três candidatos a presidente dizem que vão criar regulamentações mais duras para o mercado financeiro e também vão incentivar programas governamentais para retreinar trabalhadores prejudicados pela globalização.
Tanto em países ricos como pobres, a imigração virou uma forte questão política, já que melhores condições de transporte têm facilitado a movimentação das pessoas pelas fronteiras para competirem por emprego com os locais.
Há reações contra mianmarenses na Índia, contra haitianos em todo o Caribe, bolivianos na Argentina e zimbabuanos na África do Sul. Em 44 dos 47 países pesquisados pela organização americana de estudos Pew Research Center no ano passado, a maioria apoiava mais restrições à imigração.
Enquanto isso, nos países mais pobres da África e da Ásia, o encarecimento mundial dos alimentos leva os governos a impor novas barreiras à importação. "Não há lugar no mundo que produza a comida que precisamos se formos forçados a importar", diz o ministro indiano da Fazenda, Palaniappan Chidambaram. "Por isso, temos de ser quase auto-suficientes em todos os alimentos."
Capitais que antes tinham pouca influência no cenário mundial agora têm muita. A influência do Brasil, por exemplo, aumentou em paralelo a sua economia.
Uma semana antes do colapso das negociações na Organização Internacional do Comércio, em julho de 2006, a representante dos EUA, Susan Schwab, tomou um jato para o Brasil a fim de conversar com o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, que também trata das questões comerciais.
Amorim tornou-se uma poderosa influência política nas tentativas de fechar acordos, que começaram em 2001. As discussões, de um modo geral, envolvem o seguinte acordo:
os EUA e a Europa cortariam seus subsídios agrícolas se os países em desenvolvimento baixassem suas tarifas para produtos industrializados e abrissem mais o acesso de financeiras estrangeiras aos seus mercados.
No passado, nações em desenvolvimento praticamente só ratificavam acordos comerciais internacionais negociados pelos EUA e pela Europa. Mas o Brasil, a Índia e a China não seguem mais esse roteiro.
Amorim reuniu um grupo de 20 países em desenvolvimento que querem limitar a abertura de seus mercados e pressionam pela liberalização fora de casa. A aprovação deles é fundamental para se fechar um acordo. Até agora, eles não a deram.
"O Brasil tem a chave para que isso seja feito", diz Schwab.
Cidadãos de países pobres vibram com o novo poder dos seus governos. No Rio de Janeiro, Maria Aparecida Lemos, paciente de aids que perdeu a visão, diz que comemorou "como se fosse uma festa" quando, no ano passado, o presidente Lula quebrou a patente de um remédio para aids da Merck & Co., conhecida no país como MSD.
O país agora importa o genérico do Efavirenz de laboratórios indianos, por uma fração do preço que a Merck cobrava. Pelas regras internacionais de comércio, países em desenvolvimento têm o direito de invalidar patentes em casos de emergência, mas poucos já fizeram isso, por medo de retaliação.
A Merck argumenta que já havia reduzido o preço do Efavirenz e pretendia baixá-lo mais, mas não o suficiente para satisfazer Brasília.
"O Brasil pode não ser o tipo de lugar que você queira investir", diz Jeffrey Sturchio, vice-presidente de responsabilidade corporativa da Merck. Autoridades brasileiras não dão importância a ameaças como essa, acreditando que o crescente enriquecimento do país o torna atraente para investimentos.
Empresas petrolíferas estão entre as primeiras a sentir o novo nacionalismo. Desde que o preço do petróleo começou a disparar em 2004, Rússia, Venezuela, Bolívia e Equador vêm nacionalizando ativos petrolíferos de propriedade estrangeira, na primeira grande onda de nacionalização desde os anos 70.
Depois que a empresa estatal venezuelana de petróleo dobrou sua participação nos projetos de petróleo pesado ao longo do Rio Orinoco, no ano passado, a ConocoPhillips se afastou e teve uma despesa extraordinária de US$ 4,5 bilhões. A Exxon Mobil. também saiu e está processando a Venezuela para receber uma compensação.
A alta do nacionalismo petrolífero fez a Royal Dutch Shell mudar os cenários mundiais que seus economistas formularam para ajudá-la a traçar seus próximos movimentos. Nos anos 90, os cenários da Shell presumiam que o poder dos governos estava diminuindo.
A empresa investiu pesado nos campos de petróleo de Sakalina, na Rússia, achando que enfrentaria interferência mínima. Mas com o Kremlin avançando na área de petróleo, a Shell foi forçada a vender metade da sua participação no projeto para a estatal russa Gazprom.
Nos modelos desta década, os governos têm papel mais central. Um dos dois atuais cenários da Shell considera que o domínio do governo sobre os recursos - cerca de 80% das reservas mundiais de petróleo são controlados por empresas estatais - vai continuar.
No outro modelo, os governos permanecem no centro das decisões, mas reconhecem um interesse comum, diz Jeremy Bentham, diretor de questões internacionais ambientais da Shell.
Por reconhecer o poderoso papel das petrolíferas estatais, a Shell está investindo bastante em fontes não-convencionais de petróleo, muitas delas com bem poucas chances de desapropriação.
Há pouco tempo ela anunciou um plano de expansão de US$ 10 bilhões para exploração das areias betuminosas do Canadá. Também ampliou seu foco sobre biocombustíveis feitos de, entre outras coisas, algas e pedaços de madeira.
A Pitney Bowes., fabricante americana de máquinas de postagem, também tenta se adaptar. Nos últimos anos, transferiu boa parte de sua produção para a China e terceirizou suas operações internas de informática para a Índia.
Recentemente, porém, a empresa começou a temer pela segurança das suas linhas de suprimento. "Estamos sempre com receio de que os nacionalistas cheguem e assumam o controle" do fornecimento na China, diz Cynthia Schmitt, diretora de administração de risco empresarial da companhia.
Por isso, nos últimos três anos, a Pitney Bowes e seus fornecedores no exterior começaram a estocar mais componentes para as máquinas de postagem.
A empresa americana também passou a insistir que seus vendedores indianos tenham servidores de becape em outros países. Há tantas empresas americanas atuando em Bangalore e outras cidades da Índia que Schmitt teme que elas virem alvo de terroristas.
Outras grandes empresas têm preocupações semelhantes. Em março, a AMR Research., firma de consultoria de Boston, fez uma pesquisa com administradores de redes de fornecimento de grandes firmas americanas a respeito de como eles classificam os riscos que enfrentam ao negociar internacionalmente.
Cerca de 30% deles apontaram problemas geopolíticos e desastres naturais como o maior risco.
Algumas empresas estão procurando paraísos mais perto de casa. Com empresas americanas realocando operações que tinham em áreas de baixo custo na Ásia, o México - que tem acordo de livre comércio com os EUA - registrou aumento de 21% nos investimentos estrangeiros no ano passado, para US$ 23,2 bilhões.
Alguns dos maiores novos investidores do mundo são fundos de investimentos administrados por governos. No Oriente Médio e na Rússia, fundos soberanos são fortalecidos por receita vinda do petróleo;
na Ásia, eles são alimentados por lucros com outras exportações. Juntos, esses fundos têm US$ 3 trilhões em receita e têm usado esse dinheiro para adquirir participações no Citigroup., na Merrill Lynch e outras empresas estremecidas de Wall Street.
As infusões de recursos foram saudadas pelo Tesouro americano e por empresas carentes de capital, mas também levantaram suspeitas, dentro e fora dos EUA, de que os investidores podem ter objetivos políticos.
Agora, muitos governos nacionais estão levantando barreiras contra tais investimentos. EUA, Canadá, Alemanha, França, Japão, Coréia do Sul, Austrália, Hungria e Grécia estão propondo ou decretando restrições a investimento de empresas estatais de outros países, segundo estudo do Conselho de Relações Exteriores.
A China e a Rússia, que têm fundos soberanos, estão definindo "setores estratégicos" onde o investimento estrangeiro deve ser restrito, dizem os autores do estudo, o especialista em leis de investimento David Marchik e Matthew Slaughter, professor de economia internacional na Universidade Dartmouth.
As demonstrações de poder de governos nacionais também complicaram mais o tratamento de questões ambientais.
Com governos nacionais cautelosos em firmar compromissos, negociadores e grupos de análises americanos e europeus lutam para convencer Estados a tomar medidas fortes para cortar emissões de gases do efeito estufa.
Uma possibilidade: encorajar os governos a adotar ações específicas para cortar emissões agora, e esperar para assinar um tratado até que os Estados estejam mais confiantes de que seus pares estão levando o aquecimento global a sério.
O MELHOR DOS MUNDOS
Outro dia, conversando com Dominique Wolton, em Paris, fiquei pensando: faz tempo que sabemos estar no melhor dos mundos. Leibniz e Voltaire, por razões opostas, mas complementares, já haviam falado disso.
Hoje, porém, podemos ser mais precisos e dar o nome do melhor dos mundos: Estados Unidos da América. Alguns aspectos desse mundo ideal se destacam. Por exemplo, o sistema de saúde norte-americano.
Pratica-se até a morte o princípio de competição norteador da vida e de uma cultura bem-sucedida. Quem não tem dinheiro, nem um seguro de saúde privado, entrega mais rapidamente a alma a Deus. Nada mais justo. A cada um segundo as suas possibilidades, a sua poupança e o limite do seu cartão de crédito.
O documentário de Michael Moore sobre o assunto poderia ser instrutivo, não fosse o diretor suspeito de falsificação por ver defeitos grotescos num sistema impecável e, acima de tudo, altamente eficaz.
Outro elemento impressionante no melhor dos mundos americano é o sistema eleitoral. Um presidente da nação pode ser eleito com menos votos que o seu oponente. Esse fator de correção elimina o anacronismo que consistia em dar a cada cabeça um voto. Na guerra em nome da democracia, o modelo americano também atingiu a perfeição.
Pode-se declarar guerra a um país com base numa mentira descarada desde que os fins justifiquem os meios. O melhor dos mundos na era do império americano conta com apenas uns 2 bilhões de seres humanos passando fome. Um mero detalhe.
O continente africano continua mergulhado na miséria. A poluição ameaça o equilíbrio da biosfera. Guerras de religião ressurgem em vários lugares. Novos e velhos preconceitos dividem os homens. Que paradoxo! Nunca o mundo foi tão bom mesmo sendo ruim.
Em países europeus, como a França, tudo vai de mal a pior. O Estado garante educação e saúde de graça para todos. Nem precisa sistema de cotas.
Os medicamentos de cada um são gratuitos. Que atraso! Quanto protecionismo! Uma sociedade dessas representa um péssimo exemplo. Por causa desse tipo de sistema, uma espécie de comunismo capitalista, a França nunca passa de quarta, quinta ou sexta potência mundial. Um disparate.
Um pouco mais, e os franceses terão de declarar falência. Imaginem que, para cobrir o roubo da previdência, eles são obrigados a tirar dinheiro dos lucros das grandes empresas e das enormes fortunas, sob a forma de impostos, e repartir com a população.
Caso seguisse os bons exemplos de certos países asiáticos, reduzindo os chamados direitos sociais ao mínimo, a França daria um salto de qualidade nas suas contas e se tornaria um parceiro ideal para negócios.
O Brasil também poderia transformar-se numa potência moderna e digna de figurar na confederação dos melhores do melhor dos mundos. Bastaria para isso adotar medidas progressistas como extinguir décimo terceiro salário, FGTS, multas e indenizações por demissão sem justa causa e férias pagas.
Por generosidade extrema, poderia manter uma semana anual de férias pagas. Tudo isso tolhe a liberdade de iniciativa. O Estado deve ser mínimo e só existir para salvar bancos e grandes empresas de quebras prejudiciais ao sistema.
Quanto ao mundo ainda em crise, por incompetência dos pobres, há uma solução fácil, prática e rápida: esterilização. Feito isso, teremos uma explosão de genialidade, com grandes artistas por toda parte. O melhor dos mundos é uma realidade americana.
juremir@correiodopovo.com.br
29 de abril de 2008
N° 15586 - Paulo Sant'ana
Árduo conjunto probatório
Com o auxílio do GPS, a polícia paulistana constatou a hora certa em que o carro de Alexandre Nardoni estacionou na garagem do edifício London. E, pelo depoimento dos vizinhos do apartamento de Alexandre, o corpo da menina Isabella caiu no chão do jardim 11 minutos depois.
Não havia tempo para surgir um terceiro personagem, intrometer-se entre o que Alexandre e a madrasta da menina estavam fazendo e matar Isabella.
A polícia descarta categoricamente a existência de um terceiro personagem e atribui ao casal ter-se dirigido da garagem até o apartamento com o corpo da menina.
Havia manchas do sangue de Isabella no carro. Havia manchas de sangue no corredor. Havia manchas de sangue na rede de proteção da janela. Havia manchas de sangue no chão do apartamento e no chinelo de Alexandre.
As manchas de sangue no carro são fatais para o casal. Porque não interessava a nenhum provável terceiro personagem qualquer mancha de sangue no carro. Qualquer mancha de sangue no carro importava em presença de Alexandre e/ou sua mulher no carro quando a mancha foi derramada.
O carro está ligado umbilicalmente ao casal, que admite ter chegado ao edifício nele, apenas alega que a menina, que estava no carro com os irmãos, chegou intacta ao edifício, tendo sido morta depois por um mitológico desconhecido.
Como então haver manchas de sangue no carro?
As manchas de sangue no carro são uma das mais pesadas provas contra o casal.
A pegada do chinelo que Alexandre usava estava visível no lençol que cobria o colchão da cama do quarto das crianças, de onde foi atirado o corpo de Isabella.
Depreende a polícia, assim, que Alexandre ergueu o corpo de Isabella de cima da cama, posição mais confortável.
Se não fosse para erguer o corpo de Isabella com menos esforço, que outro motivo teria Alexandre para subir com o pé em cima da cama?
Na camisa de mangas curtas que Alexandre usava quando ocorreu o crime, havia as marcas em quadrados contíguos da rede de proteção da janela do apartamento de onde Isabella foi atirada.
Eram marcas do pó, da sujeira, da fuligem que restavam nos fios da rede e que se transferiram para a camiseta de Alexandre com a pressão que seu corpo fez contra a rede para segurar o peso do corpo de Isabella.
Marcas com o desenho da rede.
Nítidas marcas da rede na camisa, provas indubitáveis da autoria de Alexandre no assassinato.
Um assassinato cometido às pressas, mal deu para limpar com um pano as marcas de sangue por toda a parte, que ainda permaneceram indeléveis em muitas partes.
Muita pressa, muito nervosismo. E pressa também em combinar a versão profundamente ficcional de que alguém tinha entrado no apartamento.
Um crime que começou com maus-tratos a uma criança, um acesso de fúria incontrolável, a tragédia da morte ou da quase morte, o desespero, uma criança martirizada e um consórcio criminoso entre duas pessoas sem saída, que resolveram tentar a sorte em serem julgadas pelo júri, quando poderão ter mais sorte do que a imensidão da sua crueldade.
29 de abril de 2008
N° 15586 - Moacyr Scliar
Um gesto simbólico
Médicos são treinados para observar a linguagem corporal do paciente. Porque o corpo fala, não tenham dúvida quanto a isso. Aquilo que está no inconsciente da pessoa, aquilo que ela não quer ou não pode expressar em palavras, aparece na postura, na expressão facial, nos gestos.
Na entrevista que Alexandre Nardoni deu ao Fantástico ocorreu um gesto desses, tão fugaz quanto potencialmente revelador. Em meio à declaração que fazia, ele se deu conta de que uma das mangas de sua camisa não estava adequadamente enrolada.
O que freqüentemente acontece: enrolar mangas é coisa que requer uma certa habilidade. Esta habilidade talvez tenha faltado a Alexandre Nardoni, mas não faltou a percepção do seu efeito e de imediato ele tratou de compor a manga de maneira, digamos, mais estética.
O que chama a atenção: um homem que acaba de perder a filha, um homem que deve, ou deveria, estar passando por sofrimento atroz, tem cabeça para pensar na aparência pessoal?
Esta é uma maneira de ver a coisa. Mas há outra; ao menos em nome do benefício da dúvida, deve ser mencionada. Existem pessoas que, avassaladas pela dor, de repente se agarram num pequeno detalhe do cotidiano, à semelhança daquele que, prestes a se afogar, agarra-se até num graveto.
É como se as coisas, apesar de corriqueiras, ou justamente por serem corriqueiras, remetessem de novo a pessoa à vida, que é feita exatamente disso, de coisas corriqueiras, de detalhes.
Fica a pergunta: qual dos dois motivos levou Alexandre a compor, com cuidado, a manga de sua camisa? A maioria da população brasileira já tem a resposta. Mas a palavra final cabe à Justiça.
Que, no caso, se baseará em detalhes. Menos simbólicos, talvez, que o da manga, mas detalhes, de qualquer forma. Como foi dito, a vida é feita de detalhes.
Tramita no Congresso um projeto, que, em resumo, pretende remanejar os recursos que as empresas, por lei, destinam ao chamado Sistema S (Sesi, Sesc, Senac, Senai e outras) para um novo fundo que subsidiará a formação técnica no país.
Mas é justamente isso que as entidades fazem, há mais de 60 anos, além de realizar um trabalho educativo, comunitário, cultural. Será que não se corre o risco de perder uma experiência longamente acumulada? Será que não é despir um santo para vestir outro?
Enquanto generosos reajustes estão sendo concedidos a várias categorias, pensões e aposentadorias foram drasticamente comprimidas.
O que lembra o filme japonês A Balada de Narayama, que se passa em uma pequena aldeia japonesa séculos atrás. Nessa aldeia, quem chega aos 70 anos é levado ao topo de Narayama, a nevada montanha próxima, para ali aguardar a morte por congelamento.
Uma drástica aplicação da regra darwiniana da sobrevivência do mais apto que o Japão, hoje um país próspero e com uma elevada expectativa de vida, superou há muito tempo e que nós temos de superar também.
A emenda proposta pelo senador Paulo Paim, que estende a aposentadorias e pensões o mesmo percentual de reajuste dado ao salário mínimo é pelo menos um ponto de partida para isso.
Impressionante a popularidade do SantAna. Inúmeras pessoas me comentaram a crônica em que ele fala da minha rapidez para escrever. É só treino, pessoal. E vocês deveriam ver o SantAna matraqueando no teclado do computador. Ninguém cata milho mais depressa.
29 de abril de 2008
N° 15586 - Luís Augusto Fischer
Velhas dores
Da imensa coleção de frases geniais do Nelson Rodrigues, umas quantas permanecem na minha cabeça. Freqüentei sua obra cronística por tempos, com pertinácia, porque fiz meu doutorado sobre ela, mas também porque ela vale a pena em si, como o belo texto que é, a profunda reflexão que faz sobre a vida; e agora, já tendo me recolocado com simples leitor, suas tiradas ecoam ainda.
Uma das frases é uma exclamação: "Como é bom o doer de velhas penas". Não lembro o contexto original, nem é o caso de tentar localizá-lo, porque a frase supera suas condições de nascimento.
As velhas penas doem, e de algum modo elas nos trazem algum bem, nos fazem algum bem. Não é o prazer do sofrimento, qualquer espécie de masoquismo, creio; é mesmo o prazer de reencontrar dentro da gente uma antiga dor que ainda faz sentido, e o prazer, o reconforto, vêm do fato de ela nos lembrar que temos passado, que temos por que chorar, que a vida se faz de dores, ao lado de alegrias, e que ser adulto, no fim das contas, como gostava de repetir Paulo Francis a partir de uma frase de Scott Fitzgerald, é viver num estado de compreendida e moderada infelicidade.
Este fim de semana, relendo Esaú e Jacó, uma das pérolas mais raras de Machado de Assis, lá dou de cara com um capítulo intitulado, precisamente, "Prazer das dores velhas".
O sentido é o mesmo emprestado por Nelson Rodrigues, o que significa dizer que Nelson deve ter lido isso no Machado mesmo, e provavelmente a imagem ficou ecoando em sua cabeça antes de virar frase em sua obra.
Dores velhas, nossa condição humana, alta literatura, tudo serve agora para lembrar que daqui a uns dias completa um ano da morte do meu irmão, Sérgio "Prego".
Também era uma época de primeiros frios, também uma época de tristeza irremediável para os que o amamos desde sempre e para sempre.
segunda-feira, 28 de abril de 2008
MOACYR SCLIAR
O hacker e a literatura
Estava decidido: queria dedicar sua vida à literatura. Naquele mesmo ano fez vestibular para letras
"Juiz solta piratas virtuais, mas exige que leiam obras clássicas. Para conceder liberdade provisória a três jovens detidos sob a acusação de praticar crimes pela internet, um juiz federal do Rio Grande do Norte determinou uma condição inédita: que os rapazes leiam e resumam, a cada três meses, dois clássicos da literatura.
As primeiras obras escolhidas pelo juiz Mário Jambo, 49, foram "A hora e a vez de Augusto Matraga", conto de Guimarães Rosa (1908-1967), e "Vidas Secas", de Graciliano Ramos (1892-1953).
Jambo, que há três anos atua como juiz federal, disse que a Justiça precisa sair da "mesmice".
Três condicionantes se relacionam à educação dos acusados: freqüentar instituição de ensino, comprovar presença e aproveitamento nas aulas, ler e resumir os textos indicados.
Os três rapazes aceitaram as condições e já estão soltos. Como são peritos em internet, o magistrado determinou que os relatórios sobre as obras deverão ser feitos pelos jovens de próprio punho.
Sobre a escolha das obras de Ramos e Rosa, o juiz destacou o caráter educativo. "Nada como ler um "Vidas Secas" para perceber o que é vida dura, o que é necessidade de dinheiro.'" Cotidiano, 23 de abril de 2008
QUANDO O JUIZ pronunciou a sentença, a primeira reação dele foi de revolta. Preferível a cadeia, disse para os pais e para o advogado.
De nada adiantaram os argumentos deles, segundo os quais a decisão do magistrado tinha sido a melhor possível e, mais, um grande avanço na tradição judiciária; ele odiava leitura, odiava livros. Se pudesse, faria como os nazistas, que em Berlim queimaram milhares de volumes.
Só que não se restringiria apenas a certos autores; queimaria todos os livros possíveis e imagináveis. Talvez deixasse de fora apenas as listas telefônicas. Mas não havia alternativa e de repente lá estava ele lendo Graciliano e Guimarães Rosa.
Foi uma revelação, uma experiência pela qual ele nunca tinha passado antes. De repente, estava descobrindo um novo mundo, um mundo que sempre lhe fora desconhecido. "Vidas Secas" simplesmente o fez chorar.
Falava de uma gente heróica, gente que lutava como podia para poder sobreviver. Leu outros livros de Graciliano e Guimarães Rosa. Leu Machado, leu Lima Barreto, leu Clarice Lispector.
Leu os poemas de Bandeira e João Cabral, ele que antes achava poesia coisa de homossexuais. E de repente estava decidido: queria dedicar sua vida à literatura.
Naquele mesmo ano fez vestibular para o curso de letras. Nunca fora um bom aluno, mas varou noites preparando-se para o exame. Foi aprovado, fez o curso, tornou-se professor -leciona na universidade.
Os alunos adoram suas aulas: dizem que nunca se viu alguém falar de literatura com tanto entusiasmo, com tanta emoção. Mais: seu estudo sobre Graciliano é considerado exemplar.
Ah, sim, ele tem um sonho. Gostaria, como Graciliano e Guimarães Rosa, de ser um ficcionista. Tem na cabeça o projeto de um romance.
É a história de um hacker que, entrando num site, descobre uma história tão emocionante que muda sua vida.
Uma história como o Graciliano Ramos escreveria, se, claro, fosse um ex-hacker.
MOACYR SCLIAR escreve, às segundas-feiras, um texto de ficção baseado em notícias publicadas na Folha
CONTRA OS PRIVILÉGIOS DE NEGROS E ÍNDIOS
Parei para refletir. Fiquei matutando, ensimesmado e dubitativo. Sou um filósofo sem filosofia, um pensador sem pensamento.
Desde que o general Augusto Heleno, comandante militar da Amazônia, criticou a política indigenista do governo, fiquei com a pulga atrás da orelha. Fazia tempo que não se ouvia a voz dos quartéis.
Passei uma semana lendo e refletindo sobre o assunto. Finalmente, graças ao meu esforço de concentração, entendi a questão: trata-se de mais uma corajosa defesa dos brancos desfavorecidos contra as sucessivas tentativas de uns e outros, especialmente estrangeiros, de estabelecer privilégios raciais no Brasil.
Negros e índios, volta e meia, querem desbancar os brancos dos seus lugares conquistados por mérito com base em políticas ditas compensatórias de favorecimento racial.
Qualquer pessoa de bom senso vê prontamente que os índios não podem querer a propriedade de vastas terras, cheias de riqueza, tão bem ocupadas e exploradas por desbravadores de longa data.
A mensagem é clara: se os índios querem terra, que tratem de trabalhar para comprar. Nosso ministro da Defesa, o valoroso gaúcho Nélson Jobim, já assegurou no passado que as terras em discussão não são dos índios, mas da União, cabendo aos índios o usufruto vitalício.
Um argumento de Jobim, citado pelo colunista da Folha de S. Paulo Josias de Souza, que merece ser apoiado é este: 'Os europeus destruíram suas florestas e seus índios, agora querem discutir a nossa. [...] Não tivemos aqui nenhum Custer, não tivemos Little Bighorn...'.
Conclusão: devemos ter o mesmo direito dos europeus a destruir as nossas florestas e a saquear os nossos índios. A terra não pode ser deles só pela razão insignificante de que já estavam nela quando os portugueses descobriram este território em nome da civilização e da humanidade.
Precisamos ter senso de medida. O fato de que no passado os negros foram escravizados e os índios tiveram suas terras e riquezas pilhadas não pode servir de motivo para prejudicar brancos indefesos. Assim como em 1500 não era razoável deixar tanta terra sob controle de índios tão inaptos a explorá-la, o mesmo acontece hoje.
Que sabem esses índios de mineração, de grandes queimadas ou do valor da madeira nobre na Europa? Se negros e índios não souberam se defender, azar deles.
Agora, no auge dos direitos humanos, a igualdade de direitos não pode permitir qualquer dano aos brancos de hoje, pois isso significaria uma demonstração cabal e ignominiosa de racismo. É o que acontece, por exemplo, com as cotas para negros na universidade. O racismo contra os brancos está criando situações insustentáveis.
A única saída contra isso é a meritocracia sem história. Não se deve jamais questionar como alguém se tornou melhor. Muito menos que razões históricas levam os brancos brasileiros a ser 'melhores' do que negros e índios. Raça é um conceito cientificamente enterrado.
Resta a questão da cor. Mero detalhe. Até quando esses índios vão incomodar com anacronismos como cultura? Por que não tratam de se integrar, visto que antes de serem índios são homens e, como qualquer homem, devem adaptar-se ao mundo em que vivem?
Ainda bem que os direitos dos brancos começam, finalmente, a ser reconhecidos, defendidos e protegidos. Em contrário, daqui a pouco, chegaríamos ao absurdo de expulsar brancos produtivos de terras ricas para cedê-las a índios improdutivos.
juremir@correiodopovo.com.br
Ótima segunda-feira e uma excelente semana - Ainda mais com um feriadão a vista
28 de abril de 2008
N° 15585 - Kledir Ramil
A máquina de fazer amor
No futuro haverá uma máquina de fazer amor. Prática, higiênica, sem contra-indicações e você poderá programá-la à vontade, segundo seus desejos e fantasias.
A máquina de fazer amor não terá nenhum tipo de preconceito ou impedimento moral, o que poderá transformar o comportamento da humanidade, fazendo uma revolução de costumes e abrindo uma nova era de prazer sem limites. Uma loucura!
Haverá diferentes tipos de equipamentos. Alguns modelos trarão emuladores e você poderá viver experiências até então impensáveis, como fazer amor com Angelina Jolie, George Clooney ou Michael Jackson, dependendo do seu gosto pessoal. É claro, os artistas emulados receberão direitos autorais pelos serviços prestados.
Com uma máquina dessas, você poderá até mesmo pegar a mulher do seu chefe, sem perder o emprego. Ou o próprio chefe. Ou, sei lá, você vai poder pegar quem bem entender.
Agora, se aquela vizinha horrorosa do terceiro andar entrar no elevador com um sorriso nos lábios, pode ter certeza: ela abusou de você na noite anterior.
Se você for solteiro, não vai mais perder tempo com assédios, cantadas e outros enfadonhos rituais de acasalamento que gastam sua paciência e seu dinheiro. Não mais buquê de flores, não mais jantares em restaurantes caros, não mais papo furado e frases de efeito. Direto ao assunto.
Se você quer sexo, vai lá, liga a máquina e pronto. É o futuro. Infinitas variações em torno do mesmo tema. Sem culpa, sem medo, sem ter que dar satisfação pra ninguém. E tudo isso em várias prestações no cartão de crédito. Quando é que você podia imaginar uma coisa dessas?
O único problema é que nos seus momentos de maior privacidade, quando estiver conectado ao aparelho e entregue aos delírios da imaginação, estará perigosamente exposto ao risco de um vírus da internet.
E, sabe-se lá, até mesmo à invasão de algum hacker safado. Você sabe que está cada vez mais difícil controlar esses caras. Imagine no futuro.
Mas com tantas mudanças e evoluções, você também não será mais o mesmo. Pode ser até que tenha desenvolvido alguns hábitos exóticos e acabe gostando das travessuras do hacker.
Quem vai saber?
28 de abril de 2008
N° 15585 - Paulo Sant'ana
Ambígua inviolabilidade
Uma intrigante e horripilante notícia chegou ontem da terra onde nasceram Hitler e Freud, a Áustria: um homem manteve presa num porão de sua casa sua filha durante 24 anos. Dos 18 anos de idade aos 42.
E segundo a polícia suspeitava ontem, no cativeiro, ele produziu sete filhos incestuosos com sua filha.
É um dos fatos mais horrendos acerca da maldade humana de que se tem conhecimento. E talvez não haja notícia em toda a história da humanidade, afora os genocídios de guerra ou políticos, de que a maldade de um só homem tenha durado tanto tempo, longos 24 anos passados na Áustria, um país de ótima civilização e excelente polícia.
As perguntas que logo emergem do caso são instigantes:
1) como pode ter esse homem escondido da vizinhança, dos parentes e das autoridades a sua filha, mesmo tendo declarado 24 anos atrás que ela havia desaparecido?;
2) como pode esse homem ter tido sete filhos incestuosos com sua filha, se obviamente a cada um dos sete nascimentos os bebês tinham de ser declarados pelos hospitais ou por parteiras, havendo a obrigação, além de registrá-los, de nomear o pai e mãe das crianças?;
3)incrivelmente, surge nos despachos que vinham ontem da Áustria a figura da esposa do pai incestuoso, que presumivelmente é mãe da seqüestrada, tornando-se assim sogra de seu próprio marido; e como essa esposa do seqüestrador tolerou esse cárcere privado a que foi submetida sua pretensa filha, aceitando assim que seu marido fosse ao mesmo tempo seu genro?;
e se presumivelmente a jovem seqüestrada, que declarou ontem ter sido abusada sexualmente por seu pai desde os 11 anos, tendo sido presa na masmorra do porão da casa da família aos 18 anos, permaneceu sendo abusada pelo pai durante os 24 anos em que esteve presa ou era estuprada pelo pai?;
será verdade o que diz a esposa do seqüestrador, que desconhecia o que estava se passando, ou aceitou registrar em seu nome os sete filhos obtidos entre o incesto de pai e filha?
Raciocinando sobre este gigantesco crime na Áustria, fico a cismar nos milhões de crimes que são cometidos no ermo domiciliar.
A lei protege o domicílio, declarando-o inviolável, mas o quanto são numerosos os criminosos que se valem deste salvo-conduto que lhes concede a lei para constranger filhos, esposas, parentes, para torturá-los e matá-los dentro do ambiente domiciliar!
Quantas são as crianças espancadas dentro dos lares por anos inteiros a fio, sob o domínio criminoso de seus pais!
Quantas esposas são maltratadas e ofendidas por seus maridos, são agredidas por seus maridos, são massacradas por seus maridos no recôndito indevassável do lar?
Agora mesmo a menina Isabella Nardoni, em São Paulo, foi massacrada no recinto do seu lar.
E o recinto do seu lar, embora os vizinhos tivessem ouvido forte discussão entre o pai e a madrasta de Isabella, presumivelmente sobre o que fariam com o suposto cadáver da menina, serviu de refúgio para os assassinos, ninguém entre os vizinhos ousou ir até a porta do apartamento, apertar na campainha e perguntar o que estava havendo. Pela simples razão do respeito reverencial que todas as pessoas nutrem pelo domicílio.
Quanto deve ser sagrado e é aconselhável que o seja o recinto do domicílio.
Mas a quantas barbaridades e monstruosidades ele serve e esconde.
Porque a lei também diz que qualquer pessoa pode invadir um domicílio se lá dentro estiver sendo cometido um crime.
Só que os domicílios se constituem em cidadelas fortificadas e é muito difícil para os que estão de fora, como aconteceu no caso Isabella, perceber se é crime ou não o que está acontecendo lá dentro.
Os domicílios são elogiável e condenavelmente invioláveis.
27 de abril de 2008
N° 15584 - Luis Fernando Verissimo
Mudando de assunto
Meus 17 leitores devem ter notado a falta de qualquer comentário, aqui, sobre a morte da Isabella. Foi uma decisão deliberadamente infantil, igual a fechar os olhos e fingir que o que nos apavora não está ali.
Faz de conta que não aconteceu. E me proteger do fato me protege do seu entorno, me desobriga de ter opiniões sobre o tétrico carnaval em que transformaram sua investigação e sua reportagem. Não quero saber de nada.
Enclausurado no meu egoísmo não quero nem ouvir que a mais terrível hipótese sobre os assassinos da menina se confirma, nem dar palpite sobre esse clima de comoção que mais e mais se parece com um prelúdio de linchamento. Prefiro mudar de assunto. Alguém quer saber notícias sobre a minha neta?
O berço esplêndido sobre o qual o Brasil está deitado, sabe-se agora, também se assenta sobre placas tectônicas, cujos deslocamentos causam terremotos.
O mito da excepcionalidade brasileira, que incluía desde a nossa harmonia racial até a nossa isenção de grandes catástrofes naturais, já tinha sido contestado por aqueles furacões caribenhos em Santa Catarina, não faz muito. Agora tivemos um terremoto de escala respeitável. Não faltará quem culpe o governo Lula pela nova instabilidade nacional, o que é obviamente um absurdo.
Todos sabem que os desastres climáticos e geológicos se tornaram mais freqüentes e destrutivos no mundo, nos últimos anos, por culpa do neoliberalismo. Se o nosso terremoto inédito significa alguma coisa, talvez seja uma reação à alta dos juros pelo Banco Central.
De qualquer maneira, de excepcionalmente brasileiro, hoje, só restou o abacate como sobremesa.
A idéia de que os fenômenos naturais são comentários sobre o comportamento humano é antiga. O terremoto que destruiu Lisboa no século 18 trouxe muita discussão sobre as razões de Deus e os costumes da época e influiu na moral e na religiosidade de muita gente.
O sentimento de que a Natureza nos pune permanece. Não sei o que ele tinha acabado de fazer, mas dizem que quando a terra tremeu um homem apareceu na janela de um motel em São Paulo, abriu os braços e gritou para o céu: "Desculpe! Desculpe!"
domingo, 27 de abril de 2008
JOSÉ SIMÃO
Socuerro! Já tem a CPI da Sogra!
A CPI é por que o Cid Gomes levou a sogra para a Europa ou por que a trouxe de volta?
BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta!
Uruca de São Jorge! Estátua de São Jorge quebra na procissão do Corinthians. Nem o padroeiro agüentou! São Jorge não caiu do andor, SE JOGOU! Preferiu o suicídio a entrar na sede do Timão!
São Jorge se suicidou! Virou farofa de macumba! E com certeza ele não estava usando a camiseta do Corinthians: "Nunca te abandonarei". E a Angela Ro Ro diz que está namorando um padre parapsicólogo.
Então é o padre Quevedo. O padre Quemedo! E ela diz que o namorado faz dela gato e sapato. Só se for sapato 44, bico largo. Rarará! E eu já divulguei a causa do terremoto: foi o pum da Mulher-Melancia.
A Mulher-Melancia soltou um pum e tremeu o Brasil. O epicentro estava no fiofó da Mulher-Melancia. Ou, como diz a Carla Perez: deu 5,2 degraus na escada Richard!
Dois mil e bum, uma odisséia no espaço! O padre voador! Pensamento filosófico sobre o padre voador: "Não existe vento favorável para quem não sabe pra onde vai!". Aliás, tem outro: "Glória a Deus nas alturas! Desde que se saiba usar o GPS!".
O Brasil está obcecado pelo padre Mary Poppins! Saiu de Paranaguá e foi parar no YouTube: O Padre Voador e a Turma do Balão Mágico!
O que o padre fez foi o mesmo que entrar numa jaula de gorila fantasiado de banana. E GPS quer dizer: Gente, o Padre Sumiu! E diz que o padre voador é o mais novo brasileiro do seriado "Lost"!
Eu acho que foi o primeiro ser humano que alcançou os céus, vivo. E ainda gritou: "Deus, me dá um pára-quedas que eu quero descer!". Já tem até clipe com música da Turma do Balão Mágico! E correm na internet manchetes.
"Corriere della Sera": "Vaticano apóia balão, mas condena camisinha". "Correio Braziliense": "Oposição diz que padre comprou balões com cartão corporativo". "Beijing News": "Padre estava treinando para a abertura dos Jogos Olímpicos!".
CPI da Sogra! No Ceará vai ter a CPI da Sogra! O governador Cid Gomes fretou avião para ir para a Europa e levou a mulher e a sogra. A CPI é por que ele levou a sogra ou por que trouxe a sogra de volta? Rarará!
Eu deixaria a sogra na Islândia pra virar boneco de neve. E levar a sogra deveria contar como atenuante! Afinal, levar a sogra pra Europa não é passeio, é Via Sacra! É mole? É mole, mas sobe!
E atenção! Cartilha do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Epicentro": companheiro que tem o buraco fora do lugar. Rarará! O lulês é mais fácil que o inglês. Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje, só amanhã! Que eu vou pingar o colírio alucinógeno!
simao@uol.com.br
DANUZA LEÃO
A memória
De algumas coisas da infância é fácil lembrar, ou melhor, impossível esquecer: das comidas, por exemplo
PARA QUE SERVE a memória, afinal? Para lembrar das coisas? Mas de quantas você gostaria de lembrar e esqueceu, de quantas gostaria de esquecer e não consegue?
Para que serve a memória, afinal? Para ser culta, por exemplo. Não adianta ter feito todas as viagens, visto todos os museus, lido todos os livros, visto todos os filmes, se não tiver memória.
Quando falarem sobre aquela obra-prima exposta em um pequeno museu de Amsterdã que você por acaso conheceu, como exibir um conhecimento a que só raras pessoas têm acesso, se não se lembra do nome do museu, do nome do pintor, do nome do quadro?
A memória afetiva, essa sempre fica: mas não dá para telefonar para aquele antigo amor e perguntar "como é mesmo o nome daquele quadro que eu esqueci o nome, daquele pintor de quem me esqueci o nome, que vimos naquele museu de Amsterdã?"
Do que você não se esqueceu foi que naquela noite, pela primeira vez, saíram dali bem abraçadinhos, e o resto -bem, o resto foi o resto, e ainda bem que você não esqueceu: esses são esquecimentos imperdoáveis -a não ser que sejam merecidos.
Aliás, seria simples perguntar "como é mesmo o nome daquela praça em que estávamos no dia em que você me beijou pela primeira vez?"
Lembra de Garrincha, de quem se dizia que ele perguntava para os colegas jogadores "como é mesmo o nome da cidade onde eu comprei aquela gravata vermelha?"
Quantas vezes você não perguntou "em que restaurante mesmo nós comemos aquele maravilhoso risoto?" É, a memória é uma coisa mesmo curiosa. De algumas coisas da infância é fácil lembrar, ou melhor, impossível esquecer: das comidas, por exemplo.
Não que elas fossem tão fantásticas, mas, na lembrança, o arroz de forno dos domingos foi sempre inesquecível, mais do que qualquer iguaria comida no mais fantástico restaurante de 20 estrelas do mundo.
Lembrança puxa lembrança: quando ficava doente, o médico vinha em casa. Bastava ter uma febrinha e ele aparecia, geralmente antes do jantar, quando saía do consultório.
Ele era sempre simpático, paternal, e a consulta, simples. Primeiro, o termômetro; depois, ele puxava a pele debaixo do olho para examinar; em seguida, pedia uma colher, mandava abrir a boca e apertava a língua com o cabo, para ver a garganta.
Dava três pancadinhas na barriga para ouvir o som, e mais ou menos só. Não havia exame de nenhuma espécie, nem mesmo o de sangue. Naquele tempo, as mães só temiam uma coisa: vermes, mais popularmente conhecidos como lombrigas.
E as meninas que comiam muito e não engordavam tinham o maior dos medos: ter uma solitária. É uma lombriga, uma só, que na imaginação infantil tinha uns três metros de comprimento e se nutria de tudo que a criança comia -por isso ela continuava magra.
Se o problema era na garganta, o remédio era fazer uma embrocação. A mãe pegava um lápis, envolvia a ponta num algodão, atava com um fio de linha, para fixar, molhava em azul de metileno e pincelava a garganta -a criança aos gritos, claro.
Naquele tempo as doenças eram doces, das tias muito velhas se dizia que sofriam do coração -por isso não podiam levar sustos de nenhuma espécie- e morriam em casa, à noitinha, em silêncio, cercadas pela família e sem a presença de nenhum fotógrafo.
Era bem mais suave a vida -e até a morte- no tempo em que a medicina não era tão avançada.
danuza.leao@uol.com.br
sábado, 26 de abril de 2008
27 de abril de 2008
N° 15584 - Martha Medeiros
Nós, os homens
Recentemente participei de um evento em um bar de Porto Alegre, onde foi organizado um sarau filosófico (totalmente informal e divertido, senão nem estaria lá) cujo tema a ser debatido era a felicidade.
Na hora de dar início ao papo, um dos anfitriões da noite pegou o microfone para me apresentar à platéia e então fui surpreendida. Ele disse mais ou menos o seguinte: "Eu deveria chamar agora uma das melhores colunistas do país, mas eu prefiro dizer que ela é um dos melhores colunistas do país, porque acho que ela já ultrapassou esse sexismo".
E me chamou. Tirado o susto de eu estar, na opinião dele, entre os the best of, o que me agradou é que não sou mesmo chegada a clubes da luluzinha e sempre defendi que homens e mulheres fazem parte da mesma turma, logo, adorei essa ampliação de mercado.
Foi um bom começo para debater a felicidade, sensação que se atinge, entre outras coisas, pelo espírito aberto e pelo bom humor, e não pelo complexo de perseguição: "Humm, será que ele foi machista e quis dizer que sou boa porque escrevo como um homem?".
O gênero humano é designado pelo masculino: quando se diz que o homem está destruindo o planeta, não significa que não haja mulheres contribuindo para a devastação. Somos todos homo sapiens, expressão que sugere uma figura de barba e bigode, mas também podemos ser chamados de pessoas, substantivo feminino plural. Tudo retórica, né?
Nós, os escritores. Nós, os brasileiros. Nós, os cozinheiros. De que sexo somos nós enquanto coletividade? Neka Menna Barreto, Roberta Sudbrack, Carla Pernambuco e Carol Heckmann, pra citar a categoria profissional homenageada nesta edição do Donna ZH, estão entre os grandes chefs de cozinha do Brasil, ao lado (não atrás, nem na frente) de Alex Atala, Felipe Bronze, nosso estimadíssimo José Antonio Pinheiro Machado e os franceses que aqui se instalaram, Philippe Remondeau, Claude Troisgros e Olivier Anquier, quase brazucas, não fosse o sotaque.
Toda essa confusa e delirante introdução é pra dizer que, além de não me importar em ser considerada "um deles" (sejam eles quem forem) e prometer me esforçar mais para continuar sendo um bom colunista (ops, quis dizer boa), a partir de agora vou me dedicar a ser também uma cozinheira ao menos razoável.
Porque é inadmissível que, ao contrário da maioria dos meus amigos machos, que são ótimos de forno e fogão, eu não consiga preparar meus próprios suflês, não saiba o ponto certo de cozinhar um camarão, não tenha noção de como se deixa uma batata frita bem sequinha, deixe sempre o bife passar do ponto e mal saiba como temperar uma salada decentemente.
Está decidido: às panelas. A partir deste mês vou ter aulas com uma mulher e serei ainda mais feliz: vou cozinhar feito um homem.
Um excelente domingo e um ótimo início de semana.
27 de abril de 2008
N° 15584 - Paulo Sant'ana
Direito de opinar
Por vezes, até eu próprio me interrogo se não tem sido excessivo o modo como a imprensa, por seus integrantes ou por quem recebe voz dela, está tratando o caso do assassinato da menina Isabella, desde já considerando culpados o seu pai e sua madrasta.
Esses dias parei para pensar se eu não estava exagerando em considerar culpados os dois suspeitos.
Foi quando chegou até mim um e-mail do procurador de Justiça Marcelo Roberto Ribeiro, da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do RS. Diz ele:
"Vejo com preocupação os meios de comunicação fugindo dos objetivos de somente informar, para acusar e condenar o pai e a madrasta da vítima, apontando-os, desde o dia seguinte ao do crime, como autores da morte da menor, condicionando a investigação, em razão do que se avizinha um triste episódio de linchamento.
Vejo, atônito, os lidadores do Direito, que deveriam apreciar os crimes em geral com tranqüilidade, emitindo opinião de mérito sobre o delito que ainda está sendo investigado, deixando-se influenciar pela pressão popular cega e irreversível.
O crime cometido contra Isabella foi repulsivo? Foi. Quem a matou merece reprovação? Sim. E muito severa. Mas a defesa do seu autor tem de ser garantida, até porque é presumivelmente inocente, até que seja condenado irrecorrivelmente".
Pelo que sei, o autor da mensagem transcrita acima parcialmente foi um promotor dos mais severos, erguendo-se agora como defensor dos direitos dos dois suspeitos de assassinar Isabella, o que compreendo, porque promotor é feito para perseguir justiça e não réus.
Mas cordialmente quero discordar de modo profundo de suas colocações.
Como quando escreveu que "à imprensa cabe somente informar". Nada disso, doutor procurador. O senhor sabe muito bem e deve ter-se esquecido que cabe à imprensa, além de informar, opinar. Foi um grave erro do seu e-mail.
Além disso, o senhor estranha que aqueles que chama de "lidadores do Direito", isto é, os advogados e juristas em geral, "estão emitindo opinião de mérito sobre o delito, deixando-se influenciar pela opinião popular cega e irreversível".
Ora, doutor procurador, o senhor primeiro quer negar à imprensa o direito de opinar, o que é inconstitucional (liberdade de imprensa). Não satisfeito, o senhor quer negar aos advogados e juristas em geral o direito de opinar sobre o mérito da autoria do assassinato.
O senhor não quer que ninguém opine. Isso é de uma severidade que não se sustenta em nenhum dispositivo legal.
Em suma, o que o senhor prega é que os dois suspeitos de matar Isabella sejam julgados privativamente pela Justiça. Perfeito, o senhor tem razão. Mas a Justiça tem o monopólio soberano de julgá-los somente para efeitos materiais, ou seja, para aplicar sanção a eles ou livrá-los dela.
A opinião pública, esta tem o direito de formar juízo sobre qualquer fato, tem o direito de opinar sobre qualquer fenômeno social.
Só o que faltava era alguém vir querer proibir o clamor popular. O clamor popular é incontível, desde que não despreze os mandamentos legais.
Qualquer cidadão, em suma, tem o direito inalienável de achar que foi Fulano que matou Sicrano. Esse é um juízo de valor ínsito, inato a qualquer indivíduo. Ninguém pode tirá-lo.
E, finalmente, senhor procurador, na mensagem que me enviou, o senhor fala muito em "linchamento", "pressão popular", "justiçamento", como que querendo fazer intuir que a influência da opinião popular pode levar à condenação dos dois suspeitos de matar Isabella.
Lembro-lhe que o pai e a madrasta de Isabella vão ser julgados pelo Tribunal do Júri, instituição feita exatamente para sofrer pressão popular das comunidades.
E recordo que o Tribunal do Júri é integrado por cidadãos da sociedade local, absolutamente suscetíveis à pressão popular que o eminente procurador execra.
Em suma, todos do povo e a imprensa têm o direito de opinar sobre a autoria do crime e os representantes do povo, em número de sete, munidos de toda a carga da pressão popular, vão decidir no Júri sobre a sorte dos acusados.
27 de abril de 2008
N° 15584 - David Coimbra
O leitor que trai
Tem um leitor meu que trai a mulher. Por Deus. Já disse para ele que sou contra, mas não adianta: o homem viciou-se no pecado. Isso acontece, fiquei sabendo.
Esse leitor, ele vive em uma pequena cidade do Interior, menos de 10 mil habitantes. É casado há mais de duas décadas, ama a esposa, mas, puxa, ele a trai.
Sim, ele trai.
Sua amante é 10 anos mais jovem do que ele, é bela, fresca como as manhãs no alto da Serra, vivaz e alegre feito um pintassilgo, uma mulher que aprecia se repoltrear no adultério, uma mulher que não poucos homens (acredite!) gostariam de ter.
Bem.
Certo dia, antes de o casal infiel espadanar na luxúria, a amante espreguiçou-se languidamente, com um langor que só as amantes possuem, e disse:
- Bolotinha - ela o chama de Bolotinha - tenho uma coisa pra te contar.
Bolotinha espigou-se todo. Sabia muito bem que, quando uma mulher avisa que tem algo para contar, nunca é algo bom.
- Que que foi, Mumuzinho? - Ele a chama de Mumuzinho.
- É que saí com um cara nesse fim de semana.
CATABUMBA! Ela saiu com um cara no fim de semana. Bolotinha sentiu a cabeça rodando, o intestino se contraindo, a garganta fechando. Estava num impasse.
Não podia reclamar da infidelidade da amante. Afinal, naquele mesmo final de semana em que ela se refocilava com o tal "cara", ele, Bolotinha, passava com sua mulher, almoçava e jantava com sua mulher, afagava sua mulher, dormia com sua mulher.
Mas aquilo doeu. Como doeu! Bolotinha preferia ouvir aquilo da esposa, a ouvir da amante. Porque, com a amante, não podia nem se revoltar. Ficou tão abalado que falhou, não conseguiu amar a amante. Voltou para o escritório cabisbaixo e, o pior, flácido.
No trabalho, não pensava em mais nada, só nela com o tal "cara". Não conseguia se concentrar, não conseguia falar, o peito lhe doía, a alma lhe doía.
Decidiu ligar para ela.
Como não queria admitir o ciúme que o devorava, usou a saúde como uma justificativa politicamente correta:
- Preciso saber uma coisa, Mumu: você usou camisinha?
- Claro, Bolotinha. Sempre uso.
Confirmado: ela havia feito sexo com o maldito "cara". Bolotinha descontrolou-se. Tapou-a de perguntas. Quem era o "cara"? O que ele fazia? Quantos anos tinha? E pior: como havia se saído? Pior ainda: ele era... mais... bem dotado do que ele?
Nenhuma resposta aplacou seu sofrimento. Ao contrário, intensificou-o. Nos dias seguintes, Bolotinha investigou até descobrir quem era o "cara".
Um garotão que jogava num dos times amadores da cidade. Domingo haveria jogo. Bolotinha resolveu comparecer. Queria ver o "cara", queria saber como se movia, sua aparência, a forma como se expressava, estava obcecado pelo amante da sua amante. Vou reproduzir, agora, a descrição que Bolotinha fez do seu rival no imeil que me enviou, dias atrás:
" Camisa 4 às costas. Moreno. Elegante. Certamente mais bonito do que eu".
Bolotinha era inteiro sofrimento. Até ver que, no adversário, jogava um velho amigo seu. Um daqueles companheiros de infância com quem sempre se pode contar. Bolotinha chamou-o ao alambrado. O amigo acudiu, sorrindo. E Bolotinha contou-lhe tudo. Tudo.
- Me vinga - pediu. - Me vinga!
O amigo prometeu que faria o possível.
Nesse momento dramático da história, passo mais uma vez a palavra ao Bolotinha, a fim de que o leitor tenha uma compreensão literal do que ocorreu:
"Começa o segundo tempo. Escanteio contra o time do meu amigo. Adivinha quem vem para a área? O cara, todo pomposo, esfregando a região abaixo do umbigo. Eu só imaginando o que estaria escondido ali.
Será que, realmente, era maior do que o meu? Mais firme? Mais ativo? Estava louco de ciúme. No alambrado, eu segurava a tela com raiva (sabes que no Interior não há arquibancadas, como ainda deve ser no IAPI). Escanteio cobrado. Meu amigo, espertamente, para evitar a subida do meu algoz, enfiou-lhe a mão entre as nádegas. Enfiou profundamente.
Ele ficou paralisado. Pregado no chão. Depois, falou alguma coisa no ouvido do meu parceiro e o jogo prosseguiu. No final, o meu amigo veio ai meu encontro e disse, sorrindo:
- Não te preocupa, vou te vingar completamente: ele quer sair comigo.
David, juro, essa história é verdadeira, não teria motivo para te azucrinar com algo que não tivesse realmente acontecido".
Aí está. O leitor que trai, de certa forma, foi vingado. Mas será que valeu a pena? Eu pergunto: será?
Uniforme branco
Alguns colorados não gostaram de saber que os jogadores do Inter pediram para usar uniforme branco, na quarta-feira. Em 1975 ocorreu o mesmo. Só que com o Grêmio.
O Inter tinha aquele timaço de Falcão, Valdomiro e Figueroa, estava invicto em Gre-Nais havia mais de dois anos. Até que, naquele Gauchão, o Grêmio entrou no Gre-Nal vestindo uma camiseta azul-celeste. Era um azul bem desmaiado, quase branco, muito bonito. Vestindo aquele uniforme, o Grêmio, então treinado por Ênio Andrade, venceu por 3 a 1, três gols de Zequinha.
Obviamente, depois daquele clássico os jogadores do Grêmio só queriam saber da camisa azul-celeste. Dava-lhes sorte, diziam.
Uma tarde, no Sala de Redação, o velho Foguinho comentou o caso.
- Minha maior mágoa com o Inter - disse. - É que o Inter fez o Grêmio deixar de usar o seu tradicional uniforme tricolor.
Não adiantou o lamento de Foguinho. O Grêmio continuou usando a camisa azul-celeste. E, com ela, perdeu o Gauchão mais uma vez.
Definitivamente, quem ganha, no futebol, é quem joga mais.
27 de abril de 2008
N° 15584 - Moacyr Scliar
Homem na cozinha? É Destino
Tenho um amigo culto e inteligente, cujo Waterloo é a cozinha: lá, como Napoleão na batalha contra os ingleses, ele é irremediavelmente derrotado.
Dois exemplos: uma vez, a mulher lhe pediu que abrisse dois furos numa lata de azeite recém-comprada. Ele abriu os dois furos - um em cima, outro em baixo, e ficou muito admirado quando viu o azeite escorrer para o chão.
Numa segunda vez, resolveu cozinhar arroz. Colocou os grãos na panela e levou-a ao fogo. Horas depois foi olhar o resultado. O arroz estava carbonizado, pela simples razão de que ele não tinha acrescentado água. Conseguiu transformar a panela num forno crematório.
As duas historinhas reforçam uma impressão geral: para o homem, a cozinha é terreno minado, é território hostil, povoado de inimigos. Mas como se explica, então, que a maioria dos chefs seja do sexo masculino? Por que existe o brilhante Anonymus Gourmet mas não existe uma Anonyma Gourmet igualmente brilhante?
Por que as confrarias culinárias são exclusivamente masculinas? E isto não é de hoje. O mais famoso livro de receitas da antigüidade, escrito originalmente em latim, é de autoria de um certo Apicius, que, tudo indica, era um famoso gourmet da época, Marcus Gavius Apicius.
A bíblia dos gourmets, A fisiologia do Gosto (Physiologie du Goût) foi escrita por Jean Anthelme Brillat-Savarin (1755 - 1826), advogado e político francês que durante a Revolução adquiriu certa fama defendendo a pena de morte, mas que, nas horas vagas, pensava em coisas mais agradáveis.
Seu livro baseia-se, segundo o próprio Brillat-Savarin, na constatação de que "a descoberta de um novo manjar causa mais felicidade ao gênero humano que a descoberta de uma estrela". As receitas incluem até pratos afrodisíacos, o que certamente explicaria boa parte da sensação de felicidade.
Homem cozinhando é resultado da seleção natural, de sobrevivência do mais apto. Há milênios as mulheres estão destinadas à cozinha, assim como estão destinadas a cuidar da casa e dos filhos. É uma sina que elas aceitam com resignação, mas raramente com prazer - e não podia ser diferente, dada a conotação opressiva dessa distribuição de tarefas.
Mas quando o homem vai para a cozinha, muitas vezes vencendo preconceitos, podemos ter certeza de que se trata realmente de vocação, de um apelo interior irresistível.
É uma vocação sofisticada. Nos jantares de cozinheiros, os pratos quase sempre tendem para o insólito.
Bife com fritas? Jamais, é heresia. Predominam os nomes franceses, com receitas que fariam Apicius e Brillat-Savarin delirar - e dão muita inveja aos habituais representantes da espécie masculina, que, literalmente, nunca passam do feijão com arroz.
E a maior parte nem sabe preparar feijão com arroz. É preciso louvar o Senhor quando, pelo menos, se lembram de adicionar água à panela em que está o arroz.
Charles Aznavour foi para minha geração uma lenda viva, uma lenda que certamente se perpetuará. Agora, no final da sua carreira, Charles Aznavour se apresentará, graças à fantástica Opus, no Teatro do Sesi nesta segunda 28 e terça 29 (na terça, os ingressos estão esgotados). Não percam.
27 de abril de 2008
N° 15584 - Luis Fernando Verissimo
Se
Se os portugueses tivessem sido postos a correr - ou a nadar, no caso - naquele 22 de abril, como seria o Brasil, hoje? A maioria da população seria de índios e os descendentes dos poucos brancos que se animassem a vir depois do vexame português habitariam em terras demarcadas, em extremos remotos do país. Nas reuniões de presidentes do Mercosul o brasileiro seria o único nu.
Haveria vantagens e desvantagens em viver numa eterna Pindorama: para começar pelo mais grave, nem você nem eu existiríamos. Devo ter sangue de índio, se a cara de alguns antepassados não estava mentindo, mas o resto é um coquetel do que veio depois: português, negro, alemão, italiano. Se existisse, eu estaria numa reserva.
Como seria se os holandeses tivessem derrotado os portugueses e colonizado todo o Brasil? Para começar, nossos padrões de beleza seriam completamente outros. Em vez de morenas, nossas mulheres seriam loiras de cabelo escorrido, e a brasileira mais conhecida no mundo seria alguma longilínea do tipo nórdico, chamada Gisele ou coisa parecida. Nem dá para imaginar.
Como seria se os franceses tivessem conseguido consolidar a sua civilização subequatorial por aqui? Sei não, talvez a comida não melhorasse tanto assim - também come-se mal na França, e vá encontrar uma boa feijoada com couve e torresmo - , mas quem nos assegura que hoje não teríamos uma Carla Bruni no Alvorada, congressistas que ficassem em seus lugares em vez de se aglomerarem na frente da mesa, na Câmara, um serviço público muito melhor e pelo menos mais quatro feriados nacionais (Dia da Bastilha, Dia do Armistício de 18, Dia do Armistício de 45, Dia do Queijo Fedorento etc.) por ano?
Talvez fôssemos corruptos do mesmo jeito, já que deve ser alguma coisa na água. Mas as conversas grampeadas seriam em francês! Quer dizer, uma coisa de outro nível.
CINCO CEGOS
Todos conhecem a história dos cinco cegos e do elefante. Cada cego apalpa uma parte do elefante e identifica um animal diferente. Significando que as pessoas, às vezes, julgam coisas grandes por sua área limitada de conhecimento, ou que toda interpretação é subjetiva, ou que o pessoal do circo deveria controlar melhor o acesso a seus animais.
Homero, que ninguém sabe se existiu mesmo, mas, se existiu, era cego; James Joyce, que não era totalmente cego mas enxergava pouco; Jorge Luis Borges, Ray Charles e Mr. Magoo, por exemplo. Cada um apalpando uma parte do elefante.
Homero: "Não sei que bicho é, mas cabem muitos gregos nesta barriga...".
Joyce: "É um animalegórico buce-fálico simbioselizando a androginergia da raçumanancial primEva, e estas bolas são decididamente irlandesas".
Borges: "Este deve ser um dos 87 troncos que sustentam o Palácio dos Pavões em Samarkand, onde está a biblioteca circular do príncipe Rhamapu, onde há um único códice que contém a única imagem conhecida do Palácio dos Pavões em Samarkand, onde está a biblioteca circular do príncipe Rham´apu, onde há um único códice que contém a única imagem conhecida do Palácio dos Pavões em Samarkand, onde está a biblioteca circular do príncipe Rham´apu, onde há um único códice que contem... Estranho: a imagem de um elefante!".
Mr.Magoo (que entrou na boca do elefante pensando que era o banheiro): "Help!".
Ray Charles (acariciando a cauda peluda do elefante): "Georgia!".
Diogo Mainardi
Caiu na rede é peixe
"Em 2006, o ministro da pesca foi a Limoeiro do Ajuru, no Pará. Ele decidiu transformar o compromisso oficial num ato da campanha eleitoral de Lula. O deputado Carlos Sampaio declarou que nunca viu um caso mais vexatório de uso da máquina pública"
Quem? Altemir Gregolin? Sim, Altemir Gregolin. É o ministro da Pesca. Para enquadrá-lo melhor: é do PT. Para enquadrá-lo melhor ainda: pertence à corrente mais à esquerda do partido, "A Esperança É Vermelha", cuja plataforma é "fazer do Brasil uma democracia digna desse nome".
Em 6 de outubro de 2006, Altemir Gregolin foi a Limoeiro do Ajuru, no Pará. Ele participou de um ato para a entrega de carteiras de pescador aos moradores locais. Fato número 1: era um compromisso oficial, organizado pelo Ministério da Pesca e financiado com dinheiro público.
Fato número 2: o ato ocorreu em plena campanha eleitoral, espremido entre o primeiro e o segundo turnos. Altemir Gregolin, cumprindo a promessa de fazer do Brasil uma democracia digna desse nome, decidiu transformar o compromisso oficial num ato da campanha eleitoral de Lula. Lá pelas tantas, em seu discurso, ele disse o seguinte:
– Eu estou achando que vocês são peitudos. Vocês deram para o presidente Lula 6.495 votos, 54% dos votos daqui vocês deram para o presidente Lula. Eu quero agradecer em nome do presidente. Isso é muito importante, vou levar para o presidente, vou mostrar para o presidente.
Depois conclamou, em meio aos aplausos:
– E ainda vai aumentar mais essa votação no segundo turno, não é verdade?
Verdade. Lula aumentou seus votos no segundo turno. O tempo passou e, como todos os outros abusos cometidos no primeiro mandato, o assunto parecia definitivamente enterrado.
Até que, no último dia 10 de abril, Altemir Gregolin foi à CPI dos Cartões. Vic Pires, deputado do DEM, interrogou-o sobre os fatos de Limoeiro do Ajuru.
O ministro, mais peitudo do que seus pescadores, negou que pudesse ter feito campanha política num ato oficial. A seguir, entrevistado na TV, desafiou Vic Pires a apresentar provas de sua denúncia.
Se é isso que ele quer, eu apresento as provas. O ato público foi todinho filmado. Fiz um pot-pourri dos melhores momentos do DVD e o descarreguei no site de VEJA. Está lá: a chegada do ministro, a entrega das carteiras, o ministro agradecendo em nome de Lula, o ministro pedindo votos para Lula no segundo turno.
Depois de ver as imagens, o deputado Carlos Sampaio o denunciou ao Conselho de Ética e à procuradoria-Geral da República. Declarou também que nunca viu um caso mais vexatório do que esse de uso da máquina pública e de improbidade administrativa.
Lula gosta de pesca e de pescado. Entre seus gastos sigilosos, disponibilizados pelo TCU, há desde o caviar comprado no Mercadinho La Palma até os 30 quilos de bacalhau que fartaram sua ceia de Natal.
Em 7 de abril de 2003, foi feita uma despesa de 1.480 reais para comprar 1 quilo de barbatanas de tubarão, iguaria conhecida por suas propriedades afrodisíacas. A pesca de tubarões para a retirada de suas barbatanas é proibida no Brasil.
A gente sabe, no entanto, que nada é proibido no Brasil lulista, nem a pesca de tubarões, nem o uso de dinheiro público para a pesca de votos.
Para quem já defendeu o impeachment de Lula, como eu, agora só resta defender o indiciamento do ministro da Pesca. É uma perspectiva bem mais mísera. Mas foi o que aconteceu com o país: nossas perspectivas se tornaram bem mais míseras.
Ponto de vista: Lya Luft
Menina quase morta, sozinha
"Não a vi abraçada, levada no colo por alguém desesperado que tentasse lhe devolver a vida, que a cobrisse de beijos, que a regasse de lágrimas. Estava ali deitada, a criança indefesa, como um bicho atropelado com o qual ninguém sabe o que fazer"
Como grande parte do país, acompanho obsessivamente o caso da menininha de 5 anos brutalmente maltratada, espancada, jogada no chão, esganada, e finalmente atirada pela janela como um gato morto. Corrijo: nenhum de nós jogaria pela janela um gato morto.
Talvez um rato: se encontrasse um rato morto em minha casa, num gesto insensato eu o pegaria pela ponta do rabo e o jogaria pela janela (a minha também fica num 6º andar). Seria, além disso, mal-educado: não se jogam coisas pela janela de apartamentos. Nem menininhas, mortas ou vivas.
Escrevo aqui com o maior cuidado: não devo afirmar que pai e madrasta trucidaram a menina e se livraram dela como se fosse um pedaço de lixo. Para isso temos a polícia, num trabalho de primeiríssimo mundo.
Então: alguém a espancou, atirou-a ao chão, talvez lhe quebrando ossinhos da bacia, e a esganou por três minutos. O termo "esganar" é meio antigo: como será apertar por três minutos o pescoço de uma criança de 5 para 6 anos?
É difícil entender o tempo de agonia e dor de três minutos. Quem faz fisioterapia eventualmente é instruído: contraia esse músculo por vinte segundos. Tentem contar os 180 segundos que compõem três minutos de pavor.
Ilustração Atômica Studio
Essa história terá sua explicação em breve. Mas quem cometeu essa bestialidade terá seu merecido castigo neste país das impunidades e das leis atrasadas e frouxas?
Recentemente, aqui perto, um menino de 15 anos confessou na maior frieza o assassinato de dezessete pessoas. Quinze deles já foram confirmados. "Matei, sim." Talvez tenha acrescentado, num dar de ombros: "E daí?".
Por ser menor de idade, como tantos assassinos iguais a ele, foi para uma dessas instituições de ressocialização nas quais não acredito para esses casos pavorosos. Logo estará livre para reiniciar com alegria sua atividade de serial killer. E, se perguntarem a razão, talvez diga como um jovem criminoso que assaltou um amigo meu: "Nada.
Hoje saí a fim de matar alguém". Nossas leis vão finalmente, segundo entendi nas palavras do novo presidente do Supremo, ser realistas, graves, portanto justas? Eu quero mais: pena de morte para casos como os que citei, independentemente da idade.
Pelo menos prisão perpétua, sem misericórdia. Quem cometeu o horrendo crime de São Paulo deve apodrecer numa prisão pelo resto de sua miserável vida.
A menininha atirada no minúsculo jardim de seu edifício, ainda viva, ficou ali por muito mais que três minutos. Imagino sua alminha atônita e assombrada, no escuro. Ainda presa ao corpo, ainda presente.
Na loucura que o caso provoca, porque ela poderia ser nossa criança sobre todas as coisas amada, o que mais me atormenta é a sua solidão.
Não a vi, em nenhum momento, abraçada, levada no colo por alguém desesperado que tentasse lhe devolver a vida que se esvaía, que a cobrisse de beijos, que a regasse de lágrimas, que a carregasse por aí gritando em agonia e pedindo ajuda. O que teria feito a pobre mãe se estivesse presente.
Estava ali deitada, a criança indefesa, como um bicho atropelado com o qual ninguém sabe o que fazer.
Na nossa sociedade, em que as sombras mais escuras do nosso lado animal andam vivas e ativas, lá ficou, por um tempo interminável, caída, quebrada, arrebentada, e viva, a menina quase morta. Sozinha.
Lya Luft é escritora
A arte de envelhecer
As novas descobertas que ajudam a abrandar os sinais da passagem do tempo e garantir uma velhice cheia de vida
IRENE RUBERTI, CAROLINA MELO E SUZANE FRUTUOSO
EM PAZ COM O ESPELHO
Adriana, de 58 anos, com as filhas gêmeas Bianca (à esq.) e Chiara, de 24. “O importante é viver bem todas as fases da vida”, diz a mãe
A paisagista Adriana Giuliano Miniguini, de 58 anos, é daquelas mulheres maduras que, sem esforço, atraem olhares. Na juventude, a beleza da italiana criada no Brasil era tamanha que as pessoas paravam para observá-la. Adriana continua feliz com sua aparência.
Tem rugas, mas nunca quis aplicar Botox ou se submeter a grandes tratamentos estéticos. “As rugas são o sinal de uma nova fase na minha vida.
O importante é viver bem todas elas”, diz. A forma como encara o envelhecimento é tão positiva e sábia que influencia as três filhas, Bianca, Chiara (gêmeas de 24 anos) e Natália, de 34. “Queremos seguir os passos de nossa mãe. Há pessoas que fazem mil tratamentos, mas não são felizes. Nunca se sentem realmente bonitas”, diz Natália.
Além da genética, que parece favorecer as mulheres da família Giuliano Miniguini, elas se beneficiam de bons hábitos adquiridos na infância. A alimentação sempre foi saudável, com frutas, verduras, legumes e carnes magras. Todas fizeram balé, como a mãe.
As quatro freqüentam academias, para manter o corpo em forma. Cuidam da pele, com limpeza, hidratação e filtro solar, diariamente. Não têm o menor interesse em disfarçar os anos vividos, uma das maiores obsessões contemporâneas.
Artistas sofrem essa pressão contra o envelhecimento com freqüência. Recentemente, uma maquiadora perguntou ao ator Stepan Nercessian, de 54 anos, por que não fazia uma plástica para tirar as bolsas sob os olhos.
“Não quero matar o velho que vou ser”, disse ele. “Quero me olhar no espelho com 70 anos e ver como realmente sou.” Essa reação é uma exceção.
Para camuflar a idade, homens e mulheres se entregam aos mais variados tratamentos estéticos sem medir esforços e conseqüências. Alguns exageram no Botox e ficam com a expressão paralisada. Submetem-se a sucessivas cirurgias plásticas e ganham um aspecto de boneco de cera.
Quase sempre, o excesso de intervenções provoca mais estranhamento que admiração (Clique aqui e confira a opinião de internautas sobre o visual de celebridades).
Apesar dos avanços da medicina, a descoberta da pílula da juventude continua sendo um sonho distante
Um dos motivos que tornam a velhice um fantasma é o medo das restrições impostas pelo envelhecimento. O corpo começa a dar sinais de cansaço.
A pele perde o viço. O cérebro murcha. Aos 50 anos, o encéfalo pesa em média 1,3 quilo. Quinze anos depois, costuma ter 200 gramas a menos. O sistema nervoso fica mais lento. A massa muscular diminui. A gordura aumenta.
Apesar dos avanços da medicina, que têm contribuído para o aumento da expectativa de vida, a ciência está muito longe de descobrir uma pílula da juventude. Mas existe uma receita para envelhecer com mais qualidade de vida. Ela consiste em cinco simples recomendações:
comer menos
movimentar-se mais
usar e abusar do cérebro
realizar atividades em grupo
nutrir alguma forma de espiritualidade
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