quinta-feira, 4 de outubro de 2007



04 de outubro de 2007
N° 15376 - Paulo Sant'ana


Atenas e Roma


Interessante, lança-se um livro despretensioso, como o que está sendo lançado hoje (Lembra do Transasom?), escrito pelo Marcelo Ferla, com depoimentos de Pedro Sirotsky - e ele acaba se tornando um delicioso flagrante de reminiscências da cidade, a Porto Alegre dos anos 70, fazendo com que a gente retorne no tempo e reviva uma saborosa sensação de felicidade.

É um passeio pela alma do meio social e popular daquela época que solidificou a amálgama da existência que vivemos hoje, transmite-nos o sentimento de que, se fomos felizes ontem, podemos nos considerar felizes hoje, a vida não passou em vão, é uma só, e nos orgulhamos de termos construído a nossa existência em cima do febricitante clima de rock que rondava aquele tempo, dos bares e dos bailes, da movimentação no rádio e na televisão, que acabavam se refletindo nas páginas dos jornais.

A dupla Marcelo Ferla e Pedro Sirotsky revelou muito talento e sensibilidade para fazer-nos retornar a um tempo muito caro e inesquecível, o alicerce da nossa juventude, o encanto do nosso arrebatamento, o livro remete-nos a nosso entusiasmo pela vida, faz com que invejemos a nós mesmos e a nossa cidade por termos trafegado nela sem os horrores do cotidiano atual.

Não há ninguém de nós que não tenha sido citado no livro, até quem possa não ter sido sente-se homenageado por caracterizar-se como personagem e testemunha daquela transição de derrubada do nariz empinado de Atenas pela arremetida incontível das legiões romanas que levaram um império a suceder o outro numa onda avassaladora de modernidade.

Ah, tempos, ah, costumes! Tempos em que o José Antônio Daudt dava murros na mesa do cenário de televisão bradando por justiça, antes de tombar na Quintino Bocaiúva pela bala assassina.

Tempos em que o Claro Gilberto ainda não necessitava pintar os cabelos. Em que o Ranzolin recebia das mãos do Pedro Pereira, abatido pela tragédia de Tarumã, o bastão da liderança em narração futebolística, precedendo os emergentes Pedro Ernesto e Haroldo de Souza, este último descoberto por mim na Alemanha, tempos da diáspora da Caldas Júnior.

O Cid Pinheiro Cabral, o Lauro Quadros, o Ruy Ostermann, o Antônio Carlos Belmonte, o Flávio Alcaraz Gomes, o Lasier Martins e mais quase uma centena de jornalistas de jornal se transferiram da Caldas Júnior para a RBS, parecia que o último que fosse sair iria apagar a luz.

Era Roma trazendo para o seio da sua civilização os etruscos vencidos, que logo em seguida, assentada a poeira das batalhas, dominariam com seu talento o Senado romano.

O livro Lembra do Transasom? evoca um passado distante da memória, mas próximo da vida, recordar é realmente viver, é tudo que nos resta, ainda bem que nos resta, que nos anima, que nos faz sentir úteis à medida que agora sabemos que somos muito do que fomos, que o que seremos valeu a pena pelo menos por termos sido.

O lançamento do livro, com sessão de autógrafos, será hoje às 19h na Livraria Siciliano do Moinhos Shopping.

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