segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025


17 de Fevereiro de 2025
CARPINEJAR

Qualquer um pode ser a próxima vítima

Já morei na capital paulista quando apresentava o programa A Máquina, na TV Gazeta. Já pedalei tanto no Parque do Povo, na zona oeste de São Paulo. Já caminhei e namorei tanto por ali e outro tanto fiquei a esmo, distraído, sentindo a pulsação da vida no coração da cidade.

Contornava o parque para admirar a sombra do bosque, torcendo para que o barulho dos pássaros sufocasse a arrancada dos carros.

Já fui incontáveis vezes Vitor Felisberto Medrado, ciclista e treinador. Ele se tornou mais uma vítima de latrocínio em plena luz do sol, numa impunidade debochada e sarcástica, na manhã de quinta-feira.

Qual foi seu erro? Simplesmente estar vivo. Estar parado, mexendo em seu celular, em cima da bicicleta, talvez esperando a resposta de algum aluno na calçada da Rua Brigadeiro Haroldo Veloso, entre a Rua Tabapuã e a Rua Napoleão Michel, atrás do Parque do Povo.

Em segundos, foi alvejado por um motoqueiro - o tiro atingiu seu pescoço. Não houve conversa. Tratou-se de um assassinato à queima-roupa. Em seguida, um dos criminosos desceu da garupa e revistou a vítima agonizando no chão.

A execução foi toda registrada por uma câmera de segurança. Antes, matava-se em última instância, em caso de reação ao roubo. Agora, mata-se para roubar. Ele tinha 46 anos, amigo de todos, carismático, empreendedor, aquele filho que ligava para a mãe - Iolandina Medrado, de 76 anos - todos os dias.

Comandava uma empresa focada em assessoria esportiva. Como atleta de alta performance, chegou a ganhar a medalha de ouro nos Jogos Regionais de SP em 2013, na prova de velocidade por equipes.

Natural de Janaúba (MG), Vitor viveu por cerca de 10 anos entre Ribeirão Preto e Sertãozinho, no interior de São Paulo. Em Sertãozinho, ele se destacou na pista de velódromo e também atuou como professor em um projeto social que ensinava ciclismo a jovens da região.

Integrante de uma família de três irmãos, Vitor Medrado provoca lágrimas inconsoláveis à sua esposa, Jaquelini Pereira do Santos, enfermeira, e sua filha, Ana Luiza Silvério Medrado, de 26 anos, que reside em Pará de Minas, fruto do seu relacionamento com a bióloga Melissa Silvério.

Um mês depois, repete-se o suplício a céu aberto que tombou o delegado da Polícia Civil Josenildo Belarmino de Moura Júnior, 32 anos, morto a tiros em 14 de janeiro, na Chácara Santo Antônio, na capital paulista, também de manhã, também atacado por motoqueiros, também por um smartphone.

Vitão, como era conhecido, recém havia postado em suas redes sociais: "Viva agora. Use essa coragem para amar, abraçar, pedir perdão, ser gentil, desabafar e não deixar nada pra depois. Anda! Não perca tempo. Se permita ser feliz!".

Felicidade não é mais permitida no país.

A Polícia Civil suspeita que o ladrão que matou o ciclista seja o mesmo que tentou assaltar um motociclista no bairro Brooklin cinco horas depois e igualmente baleou o condutor, que se encontra internado no Hospital das Clínicas. Ou seja, ele fazia uma varredura macabra, uma chacina pela região, acumulando presas desavisadas, em idêntico modus operandi: atirar para roubar.

Morremos um pouco junto de Vitão, tendo o parque inteiro como testemunha. Não estamos combatendo o crime. O crime vem nos engolindo sem nenhuma compaixão. _

CARPINEJAR

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