03 de outubro de 2016 | N° 18650
DAVID COIMBRA
Eu disse: o PT acabou
Há pouco menos de dois anos, escrevi uma coluna com o seguinte título:
“O PT acabou”. O texto motivou um artigo de resposta de Raul Pont, ex-deputado do partido, em que ele oscilava entre a ironia latente e a agressividade nem tanto.
Foi essa gana de defender o PT que fez Raul Pont desistir da aposentadoria política para se candidatar à prefeitura de Porto Alegre. Apesar de sua galhardia, Pont não teve sucesso. Ele e o PT não foram nem para o segundo turno.
Não escrevo a respeito disso agora para fazer tréplica a Raul Pont, tampouco para tripudiar sobre ele depois da derrota. Não. Admiro Raul Pont. Considero-o um político sério e motivado por boas intenções, mesmo quando está errado. Também não fiquei ressentido com seu artigo. Não deveria ser assim, mas sei que é natural o ser humano atacar o crítico quando se incomoda com a crítica.
No caso do PT, esse fenômeno é ainda mais agudo. Comparo o que ocorreu com o PT no Brasil com a desilusão dos comunistas depois do famoso “discurso secreto” de Nikita Kruschev durante o 20° Congresso do Partido, em 1956. O discurso era para ser secreto, mas espalhou-se por todo o mundo: Kruschev denunciou os expurgos de Stálin e relatou parte das atrocidades do regime. Foi uma desilusão grave. Alguns stalinistas jamais se recuperaram do golpe contundente da verdade.
Entendo, portanto, os efeitos do impacto emocional sofrido pelos petistas depois que a Polícia Federal, o Ministério Público, a Justiça e a realidade revelaram a ação do partido nos governos Lula e Dilma. É muito duro deixar de acreditar, é muito duro perder a fé, e, no caso de petistas, comunistas e da esquerda latino-americana em geral, o que há é precisamente isto: é crença, é matéria de fé.
Mencken dizia que a fé é a crença ilógica na ocorrência do improvável. Pois existe, na América Latina, a crença de que um governo de homens bondosos e sábios, um dia, poderá salvar uma nação. O que nunca ocorreu, em parte alguma, em tempo algum. Ou seja: é algo tão ilógico quanto improvável.
Foi exatamente essa convicção de que o PT é formado por salvadores da pátria iluminados que acabou com o partido. Mais do que a corrupção, mais do que os equívocos de governança, mais do que ideias atrasadas, foi o sectarismo que fez do PT uma entidade detestada por grande parte da população brasileira. E que fez com que o PT fosse rechaçado em massa nas urnas, nesta eleição municipal.
O PT acabou. Disso eu já sabia. Mas não se acabaram as boas intenções, nem se acabaram os bons políticos que já passaram por esse partido. Entre eles, Raul Pont. O fim das ilusões é o fim da fé. Mas pode ser o princípio da razão.
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