sábado, 8 de outubro de 2016



08 de outubro de 2016 | N° 18655 
DAVID COIMBRA

Gatos odeiam pepinos


Vi, na internet, filmes de gatos saltando para trás, apavorados, quando confrontados com um pepino.

O fenômeno ocorre desta forma: o gato está distraído em seus afazeres felinos, que são comer ou dormir. O ser humano ladino aproveita a oportunidade e se aproxima rasteira e cautelosamente. A seguir, acomoda no chão, atrás do gato, um pepino de bom tamanho. Há de ser pepino cru e inteiro, não temperado nem fatiado. Picles, de jeito nenhum.

Está montada a cilada.

Assim que o gato se vira e depara com o pepino, é como se tivesse tomado um choque elétrico. O bicho dá um salto espetacular para trás, os pelos eriçados, os olhos esbugalhados, as unhas emergindo das almofadas das patas.

Por que esse horror a pepino?

Algum leitor mais malicioso poderá insinuar que se trata de medo fálico. Mas não procede, porque um gato, se vê a linguiça, mesmo das maiores, daquelas da colônia, que são vendidas na estrada para Gramado, se ele encontra essa linguiça, ou a salsicha ou mesmo o duro salamito, o que ele faz é abocanhá-los e comê-los com gosto.

Existe algum contencioso entre gatos e pepinos, portanto. Ao que, repito a pergunta: por quê? Não imagino qual seja a resposta, nem tentarei descobri-la. O que vou fazer é o seguinte: vou botar um pepino atrás de um gato. Tenho de fazer isso.

A minha mãe, devotada amante de gatos, tem um de três pernas. Como minha mãe o alimenta em excesso e ele pratica pouco exercício, está gordo como um Garfield. Vou botar um pepino atrás dele para ver se gatos de três pernas pulam do mesmo jeito que os de quatro. Desculpa, mãe, mas preciso fazer esse experimento. E digo por antecipado, e de público, em atenção a uma autoridade: ao vereador Maroni, cioso que é na defesa dos animais.

Percebo que Maroni volta e meia exagera. Chegou a apresentar projetos folclóricos, como o que propõe prisão perpétua a quem for “sarcástico” com algum animal. Ainda assim, reconheço que ele cumpre papel importante na Câmara de Porto Alegre. É como seu colega Sgarbossa, o vereador das bicicletas. E outros tantos vereadores e deputados de atuação específica. Eles estão representando pedaços da comunidade, o que é legítimo e útil.

O dinheiro tem conspurcado a política brasileira, e esse dinheiro sujo não vem só dos grandes capitalistas, vem também dos sindicatos, que se tornaram braços de partidos, pouco ligando para os reais interesses dos trabalhadores.

A política em nome dos bichos ou em nome das bicicletas ainda é a política pura. Mesmo que os políticos não o sejam.

JK, a resposta certa

Leitores generosos, e tolerantes com minha falta de conhecimento, escreveram para dar resposta a uma pergunta que fiz outro dia:

Por que o apartamento mínimo é chamado de JK?

Foram tantos os leitores sabidos a me iluminar, que não tenho como agradecer individualmente, então o faço agora, em coletivo. Digo apenas o nome de um único, o amigo Cláudio Brito, que fez uma ligação internacional apenas para sanar minha ignorância.

Pois é o seguinte: JK não tem a ver com o ex-presidente construtor de Brasília e apreciador da música Peixe vivo, Juscelino Kubitschek. Significa “Janela e Kitchenette”. Ou seja: janela e pequena cozinha, um resumo do que era o apartamento em que morei, na Volta do Guerino. Obrigado, pessoal.

És triste e humano

Em entrevista à Gaúcha, sexta passada, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, citou uma frase de Olavo Bilac, que dizia que cada pessoa tem, dentro de si, “um demônio que ruge e um deus que chora”. Lembrei de imediato de uma ótima professora de literatura que eu tinha, mas, melancolicamente, não lembrei de seu nome. Sei que ela me apresentou esse poema, além de outros, no velho e bom Instituto Piratini. Decidi compartilhá-lo, de bonito e verdadeiro que é:

Não és bom, nem és mau: és triste e humano...

Vives ansiando, em maldições e preces,

Como se a arder no coração tivesses

O tumulto e o clamor de um largo oceano.

Pobre, no bem como no mal padeces;

E rolando num vórtice insano,

Oscilas entre a crença e o desengano,

Entre esperanças e desinteresses.

Capaz de horrores e de ações sublimes,

Não ficas com as virtudes satisfeito,

Nem te arrependes, infeliz, dos crimes:

E no perpétuo ideal que te devora,

Residem juntamente no teu peito

Um demônio que ruge e um deus que chora.

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