27 de outubro de 2016 | N° 18671
L F VERISSIMO
Rosineide
O Bill veio passar uma temporada no Brasil, a trabalho, e aconteceu: apaixonou-se por uma mulata. A Rosineide. Belíssima. Traços finos. De se levar pra casa. E foi o que o Bill fez: casou-se com a Rosineide e a levou para conhecer seus pais, em Cincinnati.
Bill sabia pouco sobre Rosineide. Depois de ser apresentado a ela, tinha ouvido alguém comentar:
– Ela é do balacobaco.
Estranhou. Ela não era carioca? – Quíssima! – disse a Rosineide, já no avião a caminho de Cincinnati.
– Mas me disseram que você era de Balacobaco.
Rosineide hesitou antes de responder. Precisava tomar uma decisão. Ou explicava ao Bill o que queria dizer “balacobaco”, com o risco de ele não entender, ou, pior, entender, ou partir para a invenção. Optou pela ficção.
– Originalmente de Balacobaco, mas fui criancinha para o Rio.
E, a pedido de Bill, pôs-se a descrever Balacobaco. Nunca mais voltara à sua cidade natal. Sabia que tinha parentes lá, mas perdera o contato com eles. Onde ficava Balacobaco? Na Amazônia. Para ajudar Bill a localizar sua cidadezinha, Rosineide foi mais específica.
– É parte da Grande Cafundó.
E acrescentou: – Onde o diabo perdeu as botas.
– O quê? – perguntou Bill, perplexo. – You know. The devil. Lost his boots.
– The devil?!
– Esquece, bem – disse Rosineide, encerrando o assunto com um beijo.
Bill apresentou Rosineide a seus pais, em Cincinnati.
– She’s from Rio, but originally from Balacobaco.
Os pais do Bill acharam interessante, fizeram muitas perguntas sobre a Amazônia (desmatamento, cobras gigantes etc.) e, em geral, acolheram bem a Rosineide. Que está até hoje morando com o Bill em Cincinnati e prometeu que, da próxima vez que os dois vierem ao Brasil, o levará para conhecer Balacobaco. Ainda mais que agora tem aeroporto em Cucuia, que fica perto de Cafundó.
Só a mãe do Bill, eleitora do Trump, olha para a nora com um ar de desconfiança. Aquela história da Amazônia lhe parece invenção. Ela também não acredita que Barack Obama nasceu nos Estados Unidos.
PAPO VOVÔ
Reclamei para a nossa neta Lucinda, de oito anos, que ela não estava me dando atenção. E ela, mãos na cintura: “Vô, eu tenho minha vida social!”.
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