Jaime Cimenti
Feira do Livro, Dylan, best-sellers & cia
Não, não vou chamar a 62ª Feira do Livro de "Feira do Livro de Bolso" por conta de alguns poucos encolhimentos, nem dizer que ela é a mesma coisa cada vez melhor, por conta das realidades e das fantasias que estão e sempre devem estar intimamente associadas com o querido evento. Prefiro repetir que ela é das poucas eternidades e certezas boas que ainda temos. Pagar imposto, morrer e ver o Inter campeão de novo são as outras certezas...
Ainda estamos curtindo as letras do Bob Dylan jogadas ao vento mundial pela Academia Sueca, que não sei porque segue não premiando os brasileiros. Drummond de Andrade é o Nobel do povo, do julgamento do tempo e dos leitores, que é o que mais interessa, pronto!
Será que o Dylan vai lá buscar a medalha e a grana preta, vai dar uma de Tim Maia ou mandar um bilhete tipo Jean Paul Sartre, recusando as honrarias? Será que essa demora toda para se manifestar é marketing? Vamos ver, vamos ver. Estou escrevendo estas linhas na terça-feira passada. Se o Dylan não aceitar o Nobel, acho que a Academia até vai gostar, vai repercutir ainda mais a escolha dos suecos... Se o Dylan aceitar, poderíamos enviar o Suplicy (pai) para cantar com ele Blowing in the wind. Como coral ou "backing vocals" sugiro Philip Roth, Mia Couto, Ferreira Gullar, Elena Ferrante, Haruki Murakami, Karl Ove Knausgard, Amos Oz, Lobo Antunes e outros que meus queridos leitores indicarem.
Há quem diga que as pessoas andam lendo pouco, que ficam lendo só partes dos livros, "trecheando", acumulando livros na mesa de cabeceira, lendo vários ao mesmo tempo, lendo sobre eles na web e tal. Claro que a leitura e o livro não morreram. Se for assim, o velório está bem concorrido. Muita gente ainda curte a indispensável e incomparável leitura silenciosa e solitária das páginas escritas dos livros. Elas estimulam a inteligência, a fantasia e os sentidos de uma forma única. Os meios eletrônicos podem ser fascinantes, mas não se comparam à leitura de um livro impresso.
Mas, olha só, há dias saiu, nos Estados Unidos, um livro, The Best-seller Code, coisa de norte-americano legítimo. Dois pesquisadores, em quatro anos, examinaram 20 mil obras de ficção para desenvolver um algoritmo que pudesse identificar livros que se tornariam "best-sellers". É um velho sonho dos editores. Apuraram 2.799 características de livros mais vendidos.
Heroínas jovens e fortes, descrever intimidades mas não sexo explícito, evitar pontos de exclamação, mostrar mais cães do que gatos, falar de casamento, morte, funeral, impostos, armas, escolas, crianças, e ter estruturas em três atos - apresentação, conflito e final -, são algumas das caraterísticas. Ritmo ágil, poucos temas, palavras vagas e finais tristes estão nas preferências. Sexo, drogas e rock'n'roll estão em baixa nos Estados Unidos em termos de mais vendidos.
Como se vê, coisas previsíveis e gostos duvidosos apareceram. Em países desenvolvidos, os dados são usados e as editoras faturam, entregando o que o público leitor de best-seller quer.
a propósito...
Faço resenhas de livros há mais de 40 anos. Respeito o gosto de todos e as leis de mercado, claro. Não tenho preconceitos e, como vocês sabem, com democracia e pluralidade, de olho na qualidade mínima e no bom senso, procuro informar os leitores da melhor maneira. Mas confesso que pesquisar tanto o gosto dos leitores e processar tanto a literatura até respeito, mas não acho bom. Prefiro best-sellers que tenham brotado da liberdade criativa, do acaso, da sintonia do autor com seu tempo e seus contemporâneos, da necessidade artística de expressão. Best-sellers como Dom Quixote, O velho e o mar, Memórias póstumas de Brás Cubas, Vidas secas e outros...
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