25 de março de 2016 | N° 18482
NÍLSON SOUZA
AMOR ANTIGO
Amo minha cidade muito antes de conhecê-la.
Trabalhei durante 14 anos no Beco do Fanha, tive uma namorada na Rua da Figueira, andei de bonde pela Rua do Paraíso, estacionei meu Fusca muitas vezes na Rua do Arvoredo e percorri, por incontáveis dias e noites, a Rua Formosa, o Beco do Império, a Rua da Varzinha, a Rua do Cotovelo e tantas outras localizadas nas proximidades.
Falo, como já perceberam os mais antigos e os estudiosos da geografia porto-alegrense, desta Capital aniversariante, onde nasci e onde – a exemplo de Quintana – serei provavelmente poeira ou folha levada no vento da madrugada.
A Porto Alegre dos meus andares já era outra quando realmente a conheci. Meu primeiro emprego no jornalismo foi na Rua Caldas Júnior, onde um dia morou um taberneiro fanhoso, segundo o historiador Sérgio da Costa Franco. Minha namorada, hoje minha mulher, morava na Rua Coronel Genuíno quando a conheci, mas lá já não estava mais a figueira que lhe deu o nome romântico. A Rua do Paraíso já tinha virado José Montauri quando me pendurei no bonde-gaiola, que se inclinava pelas cercanias da Praça XV. E os arvoredos da Fernando Machado, testemunhas do célebre episódio do açougueiro que fazia linguiça com carne humana, já eram escassos quando passei a estacionar por lá.
Frequentador compulsório do Centro Histórico, onde trabalhava, perambulei pela Duque de Caxias, que um dia foi mais formosa, pela Espírito Santo, que substituiu o beco imperial, pela Demétrio Ribeiro, que já não tinha mais várzeas, e pela Riachuelo, que ainda rima com cotovelo. Há tantas mais, inclusive a inspiradora Rua dos Pecados Mortais, rebatizada para homenagear um dos nossos generais – o cachoeirense Bento Martins.
Porto Alegre, que completa 244 anos neste sábado, ainda tem ruas encantadas que nem em sonhos sonhei, mas basta uma consulta ao mapa do passado para se perceber que a vida nesta cidade já foi mais tranquila, criativa, pacífica e deliciosa.
Tenho saudade da Porto Alegre que conheci e também daquela que não conheci, mas amo esta que me abriga e me desafia. Feliz aniversário, meu chão!
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