segunda-feira, 28 de março de 2016



28 de março de 2016 | N° 18484 
DAVID COIMBRA

ENFIM A GRANDE LUTA

Dois sentimentos levaram-me ao cinema para assistir a Batman versus Superman: o entusiasmo do meu filho e uma antiga expectativa infantojuvenil. Guris do subúrbio de Porto Alegre, nós ficávamos especulando quem venceria, numa luta entre os dois. O Superman é definitivamente mais forte, mas tem a kriptonita. Todo homem tem sua kriptonita...

Hoje, também queria ver Mike Tyson contra Cassius Clay, o Santos de Pelé contra o Barcelona de Guardiola, Beatles tocando junto com os Rolling Stones, Michelângelo e Leonardo dando vida ao mesmo bloco de mármore, um concerto com Beethoven e Mozart, um debate entre Churchill e Marx.

Se bem que, às vezes, esses encontros de supers geram frustração. Dois dos maiores gênios da humanidade, ambos judeus-germânicos, juntaram-se, nos anos 30, para escrever um texto. Por que a Guerra, o título do ensaio. Daquela união de dois cérebros poderosos saiu um livro monótono, nada original e totalmente dispensável. Se Hitler e outros senhores da guerra tinham dúvidas em começar as hostilidades, o livro bem pode tê-los ajudado a se decidir a favor.

Quanto a Batman vs Superman, não posso dizer que gostei, mas meu filho adorou. Ou seja: o filme funciona.

Os americanos são gênios do lazer. Ninguém dava muita importância para a diversão antes deles. Eles transformaram a diversão em arte.

Os super-heróis foram inventados pelos americanos. Verdade que, antes, os gregos conceberam Hércules e os hebreus Sansão, mas eles não seriam páreo para o Super-Homem.

O Super-Homem é o modelo de todos os super-heróis.

Curioso que o Super-Homem tenha sido criado numa sociedade que sempre acreditou no homem comum. Os Estados Unidos, repito sempre, são o único país do mundo em que jamais houve rei ou ditador. Nos Estados Unidos, ninguém nunca foi “filho de algo”, ou fidalgo. A ideia fundadora do país é de que todos são iguais perante a lei. Quando essa lógica foi quebrada pela escravidão, quebrou-se a nação, e os Estados Unidos passaram por uma das mais sangrentas guerras civis da História, com mais de 600 mil mortos.

Por que, então, o cultivo ao mito dos super-heróis? Porque é muito humano ansiar pelo que é sobre-humano.

Você sabe dos seus conflitos e das suas dúvidas. Não seria ótimo se alguém fosse infalível? Você não precisaria mais ficar angustiado em tomar decisões, bastaria seguir o líder. Por isso que é tão fácil enganar as pessoas. Elas querem acreditar nos super-heróis.

Poucos dão valor aos heróis modestos. Aqui, nos Estados Unidos, em Ohio, está incrustada a cidade de Cincinatti, da qual Churchill gostava muito. É um lugar distante – fica numa linha diagonal oposta a Massachusetts, em direção ao Pacífico proceloso.

O nome da cidade homenageia um romano que viveu 2.500 anos atrás. Aquele Cincinatus salvou Roma duas vezes, de duas grandes crises. Os bárbaros estavam prestes a invadir a Cidade Eterna e os cidadãos, conhecendo os talentos de Cincinatus, foram buscá-lo. Nas duas vezes, encontraram-no lavrando a terra. Contrafeito, Cincinatus largou o arado, foi para a cidade, organizou o exército e a nação, liderou a reação e venceu. Nas duas vezes, ele podia ter se mantido no poder como cônsul ou ditador, mas Cincinatus preferiu voltar para casa e para a lida comum de agricultor.

Cincinatus renunciou ao poder, grandeza rara entre os homens de todos os tempos.

Esse é um herói. Falarei de outros. Amanhã.

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