31 de março de 2016 | N° 18487
DAVID COIMBRA
A médica que dispensou o filho da petista
Quando li a notícia sobre a médica que se recusou a atender uma criança porque a mãe dela era do PT, fiquei revoltado. “E o Juramento de Hipócrates!”, pensei, olhando para o Leste, na direção de onde suponho que se esparramem as ilhas gregas. “O que Esculápio, Hígia e Panaceia pensarão disso?”.
Pior: o presidente do Sindicato dos Médicos, Paulo de Argollo Mendes, disse que a médica estava certa em se negar a prestar atendimento. “Por favor!”, ralhei, ainda pensando na ética da velha e sábia avó Grécia. “Nem se Hitler estivesse precisando de atendimento, o médico poderia recusar!”.
Continuei com minhas exclamações, até que entrevistamos o presidente do Sindicato, ontem, no Timeline da Gaúcha.
Paulo de Argollo explicou que a médica não se negou a dar atendimento a uma emergência, nem veta petistas em geral, mas aquela em particular. O que ela fez foi solicitar aos pais da criança para que trocassem de pediatra, porque não aguentava mais a conversa deles durante as consultas.
Bem... Nesse ponto, comecei a entender a médica. É que todo sectário é um porre, seja qual for o dogma. Eles estão sempre prontos para a briga, e gente sempre pronta para a briga é extremamente aborrecida.
Reparem no atual slogan dos petistas: “Não vai ter golpe, vai ter luta”. Luta?
Contra quem eles vão lutar? Será guerra civil, é isso? Vai haver distribuição de armas nos diretórios do PT? Ou será só o exército do Stédile que vai para a frente de batalha?
Luta, luta, eles estão sempre em luta. José Dirceu é o “guerreiro do povo brasileiro”, André Vargas desafia o STF erguendo o punho fechado, eles se acham Espártaco enfrentando as legiões de Crasso em defesa da liberdade dos escravos, Zapata liderando os camponeses contra a tirania de Porfírio Diaz, Marx aconselhando os proletários do mundo a se unirem. O sonho deles é travar a luta de classes. Combater o bom combate, como disse Paulo.
Que babaquice.
Sim, existem explorados e exploradores, negros e brancos, ricos e pobres, empresários e proletários, sim, mas o mundo não está dividido apenas entre explorados e exploradores, negros e brancos, ricos e pobres, empresários e proletários. O mundo é mais sofisticado, a sociedade é mais complexa e o Brasil, felizmente, é mais variado e complicado do que qualquer fórmula maniqueísta.
Antes era mais fácil: você era contra a ditadura ou a favor da ditadura. Ponto.
Agora é preciso pensar um pouco. Quem é contra o governo do PT não é necessariamente tucano, nem simpático a Bolsonaro, nem entusiasta do futuro governo Temer. Quem considera o Bolsa Família um bom programa não é necessariamente petista. Quem é contra o aparelhamento do Estado pelo governo não é necessariamente a favor do Estado mínimo. E quem é petista não é necessariamente um chato. Mas, neste momento de ânimos espinhados, há de se reconhecer que os petistas transformaram-se em pessoas especialmente chatas.
Se você se afasta de uma pessoa de quem não gosta, você está sendo saudável; se você se aproxima, procurando o confronto, você está com problemas sérios.
Uma médica não querer atender um paciente por ele ser de determinado partido ou ter determinada opinião é totalmente reprovável. Uma médica não querer atender um paciente que a incomoda é totalmente compreensível. Importunos de todo o mundo: vade retro.
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