Rosane de Oliveira
04 de março de 2016 | N° 18464
EFEITO POLÍTICO DA DELAÇÃO DE DELCÍDIO É DEVASTADOR
O vazamento do esboço do acordo de delação premiada do senador Delcídio Amaral pode prejudicar a investigação criminal dos fatos que ele aponta, mas tem efeito político devastador. São tantos e tão graves os delitos listados, que a presidente Dilma Rousseff convocou uma reunião de emergência com os principais ministros, divulgou notas oficiais rebatendo as denúncias e escalou o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, para responder ponto por ponto aos itens que envolvem o governo.
Na manifestação que fez logo após a reunião, Cardozo tentou desqualificar Delcídio e tratou a delação ainda não homologada como vingança do ex-líder do governo. No Congresso, a oposição comemorou a reportagem da IstoÉ como final de campeonato. Os principais adversários do governo defenderam a renúncia da presidente ou o impeachment. O ex-presidente Lula, contra quem Delcídio levanta suspeitas até mais graves do que as que envolvem Dilma, reagiu com uma resposta de sua pessoa jurídica, o Instituto Lula, negando envolvimento em irregularidades.
Nas redes sociais, militantes do PT agarraram-se a dois fatos para desqualificar a reportagem da IstoÉ: a negativa do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e a nota divulgada por Delcídio e por seu advogado dizendo que não confirmam a autenticidade do conteúdo divulgado pela revista. Os dois fatos precisam ser analisados à luz do rito da “colaboração premiada”. É assim que a lei define o que popularmente se conhece por delação premiada.
Primeiro, é preciso registrar que nos acordos de delação premiada os envolvidos assinam um termo de confidencialidade pelo qual se comprometem a não tornar público o conteúdo até que o sigilo caia na Justiça. Vale para o delator, seus advogados e os membros do Ministério Público.
A IstoÉ divulgou reproduções do cabeçalho do acordo e dos anexos com os principais fatos narrados por Delcídio. Nos anexos, pode estar a explicação para a nota do senador, que não reconhece autenticidade nos documentos. Ocorre que os anexos costumam ter mais de uma versão. Em geral, cada fato é um “anexo”, para facilitar a apuração.
Os procuradores recebem um anexo e podem solicitar complementações. Já houve casos em que um mesmo anexo teve até oito versões. Essas versões descartadas pelo Ministério Público são destruídas em uma máquina de triturar papel. Já a cópia do cliente fica sob responsabilidade do advogado. Também é possível que o delator mude a versão sobre determinado fato. Não está claro se os documentos divulgados pela IstoÉ são a versão final do acordo, mas a coluna confirmou que ele existe.
A pergunta é: a quem interessa o vazamento? Ao Ministério Público Federal é que não. Foi o sigilo que permitiu a coleta das provas que embasaram a denúncia contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, aceita por unanimidade pelos ministros do Supremo Tribunal Federal.
ALIÁS
Apesar da bomba que caiu sobre o Palácio do Planalto, com o vazamento do acordo de delação de Delcídio Amaral, está mantida a visita da presidente Dilma Rousseff a Caxias do Sul na próxima segunda-feira, para entregar casas populares.
QUEM QUER COMPRAR?
Com a certeza de que a única forma de combater o déficit de R$ 6,8 bilhões previsto para 2016 é o aumento de receita, o secretário da Fazenda, Giovani Feltes, admite vender à iniciativa privada créditos da dívida ativa que o governo não consegue cobrar.
Durante apresentação do Relatório de Governança Especial ontem, membros da secretaria apresentaram as cifras que o Estado tem a receber provenientes de cobranças administrativas e judiciais.
Ao todo, a dívida soma R$ 42,5 bilhões, a maior parte considerada “crédito podre”. Técnicos da Secretaria da Fazenda apontam que 31% desse valor é passível de recuperação. Significa que cerca de R$ 11 bilhões ainda podem ser cobrados. De acordo com os dados apresentados, se a cobrança se mantiver no ritmo dos últimos anos, o máximo que se conseguirá receber da dívida ativa até 2018 são R$ 5 bilhões.
Se comparado com 2014, a dívida ativa aumentou em R$ 2 bilhões em 2015.
Feltes informou que o governo recebeu propostas para a compra de títulos no início de 2015, mas nenhuma foi avaliada. Motivo: o valor do ganho real com a dívida não havia sido dimensionado até então. Como não se trata de uma operação usual, é difícil calcular qual seria o deságio aceitável em um eventual leilão.
A venda da dívida é uma das principais sugestões de membros do Poder Judiciário para aumentar a receita.
O GOVERNADOR E O SECRETÁRIO DA FAZENDA FORAM CHAMADOS PARA UMA REUNIÃO COM A PRESIDENTE DILMA HOJE, EM BRASÍLIA, PARA TRATAR DA RENEGOCIAÇÃO DA DÍVIDA. SE A PROPOSTA FOR O ALONGAMENTO DO PRAZO POR 20 ANOS, SARTORI SEGUIRÁ BRIGANDO NA JUSTIÇA.
R$ 3 BILHÕES NA FOLHA
Apesar de o governo não ter concedido aumento salarial a nenhuma categoria, a folha de pagamento dos servidores inchou em R$ 3 bilhões de 2014 para 2015. Os motivos, segundo relatório da Secretaria da Fazenda, foram o crescimento vegetativo da despesa com pessoal e os reajustes da segurança pública e do magistério concedidos no governo Tarso.
Em 2015, o governo gastou R$ 747 milhões com o pagamento de Requisições de Pequeno Valor (RPVs), R$ 25 milhões a mais do que em 2014.
BIOLCHI FICA NA CASA CIVIL
Em meio às especulações de que deixaria a Casa Civil para assumir seu mandato na Câmara dos Deputados, Márcio Biolchi conversou com o governador José Ivo Sartori e definiu que vai continuar no cargo.
Biolchi confirma que teve um atrito com os colegas Giovani Feltes e Carlos Búrigo, na segunda-feira, mas garante que o episódio está superado:
– Perguntei ao governador se ele gostaria que eu saísse, e ele disse que não. Vou continuar trabalhando.
O chefe da Casa Civil conversou com Feltes e com Búrigo antes de confirmar sua permanência no governo.
As divergências entre os secretários têm como pano de fundo a crise do Estado e a visão sobre nomeações de concursados em caráter excepcional. Com frequência, também há discordância em relação à velocidade e profundidade das reformas. A Biolchi, cabe negociar com a Assembleia e avaliar as chances de aprovação de propostas polêmicas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário