16 de março de 2016 | N° 18474
MARTHA MEDEIROS
Mascando cana
Outro dia puxei um Trident da bolsa e ofereci para minha mãe: quer? Ela negou pela milionésima vez. Nunca vi minha mãe mascando chiclete. Jamais alguém viu. Simplesmente porque ela nunca, nunquinha na vida, mascou um chiclete.
Nunca, mãe? Não teve infância? Sempre achei meio nojento, é a resposta dela.
Eu adorava mascar chiclete quando pirralha – indolência sabor tutti frutti. Gostava muito de Ping Pong, de Ploc e um pouco menos daqueles que vinham em caixinhas. Mas curtia mesmo era os chicletes Mini, que se amontoavam dentro de uma embalagem plástica que simulava um sorriso vazado. Os chicletinhos minúsculos ficavam aparentes, feito dezenas de dentinhos estraçalhados.
Ninguém achava que era antipropaganda, já houve uma época em que havia mais humor. Eu pegava um punhado na mão e mascava todos de uma vez só. Era uma falcatrua, porque o sabor durava um minuto e meio, nada além disso, e logo a gente tinha que se empanturrar com mais e mais para atiçar de novo o gosto. Ah, você certamente lembra, era um clássico e acho até que essa marca ainda existe.
Hoje eu só masco Trident, chiclete pra adultos que, por terem uma agenda cheia, ficam fora de casa por muitas horas e sentem falta de sua escova de dentes. A indolência ficou lá atrás, coisa de criança.
Mas não para Monica Moura, que foi presa ao lado do marido, o marqueteiro João Santana. A cena em que ela sai do camburão e entra na sede da Polícia Federal foi reprisada exaustivamente pelos telejornais. E, a cada reprise, eu não conseguia tirar os olhos do chiclete da mulher. Ela não estava no recreio do colégio. Tampouco parecia ser um caso de substituição da escova de dentes – não acredito que um hálito fresco ajudaria alguma coisa na hora de prestar depoimento. Aquilo era pura indolência juvenil. Sua descompostura mandava um recado: “Olhem como estou preocupada com este circo”.
Vi até um sorrisinho sarcástico no canto da boca. Conheço aquele sorriso. James Dean sorria do mesmo jeito a bordo de sua moto e de sua jaqueta de couro.
Pode ser que o casal seja inocente como uma criança no dia da primeira comunhão. O julgamento aqui não é político, mas social. Uma questão de etiqueta (na ausência da coluna da Celia Ribeiro, que provavelmente concordaria comigo). Não fica bem uma senhora ficar abrindo e fechando a boca com displicência enquanto joga um pedaço de goma para um lado e para o outro, como um ruminante qualquer. No mínimo, pode soar como arrogância. Como se quisesse demonstrar que o dinheiro fala mais alto do que a lei.
Minha mãe tem razão, é meio nojento. A gente deveria manter a elegância até mesmo quando está indo em cana.
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