domingo, 27 de março de 2016



18 de março de 2016 | N° 18476 
NÍLSON SOUZA

O PAÍS DOS AMIGOS DA ONÇA


Aprendi a ler na falecida revista O Cruzeiro, quando tinha seis anos de idade. Naquela época, não havia escola para crianças dessa idade, mas era tão grande a minha vontade de ler os gibis manuseados por meus irmãos mais velhos, que acabei juntando as letrinhas por conta própria. Pois naquela publicação histórica, que chegou a alcançar a estratosférica tiragem de 750 mil exemplares na cobertura do suicídio de Getúlio Vargas, nasceu o Amigo da Onça, personagem do cartunista pernambucano Péricles, mais tarde redesenhado por Carlos Estevão e agora ressuscitado no tumultuado ambiente político de Brasília e do Brasil. O senador delator chamou o ministro desafeto de “amigo da onça”.

Quem era o Amigo da Onça? Era uma figura simpática, de olhos arregalados e nariz vermelho, sempre de gravatinha borboleta e sempre disposto a fazer uma sacanagem com alguém. O nome vem de uma anedota da época, em que dois caçadores desenvolvem o seguinte diálogo:

– Se você estivesse na selva e aparecesse uma onça?

– Eu dava um tiro nela.

– Mas se você estivesse sem arma de fogo?

– Eu usava o meu facão.

– E se estivesse sem facão?

– Pegava um pedaço de pau.

– Se não tivesse um pedaço de pau por perto?

– Eu subia numa árvore.

– E se não existisse árvore?

– Eu correria.

– E se você estivesse paralisado pelo medo?

Aí, o outro, irritado, questionou:

– Afinal, você é meu amigo ou amigo da onça?


Saudosos tempos aqueles das anedotas ingênuas e das brincadeiras inconsequentes do Amigo da Onça, que ganhou vida própria no folclore popular e se transformou em sinônimo de pequenas traições. Hoje, os amigos da onça se tornaram extremamente danosos, utilizam gravadores escondidos e não hesitam em lançar seus interlocutores à execração pública.

A própria onça talvez seja menos perigosa.

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