sábado, 3 de janeiro de 2015


04 de janeiro de 2015 | N° 18032
MOISÉS MENDES

O fim do mundo

Stephen Hawking é o personagem do filme A Teoria de Tudo, que estreia neste mês em Porto Alegre. Desde os 21 anos, o físico britânico convive com a doença degenerativa que o imobiliza. Hawking chegou aos 72 anos. Alguns médicos diziam que talvez não passasse dos 50.

Para se expressar, ele movimenta a bochecha e aciona um complexo sistema computadorizado que forma palavras. E assim Hawking circula, naquela cadeira de rodas superequipada, contrariando o que é dito sobre seu futuro.

É dele uma teoria sobre o provável fim do Universo. O mundo pode se evaporar, a qualquer momento, por causa do bóson de Higgs.

Você já ouviu falar das experiências para provar a existência da tal partícula de Deus e sabe que ela tem relação com o início da criação do Universo. Agora, Hawking nos diz que pode também vir a ter alguma culpa pelo seu fim. O Universo desapareceria num vácuo e se extinguiria como uma bolha de sabão.

O bom da teoria de Hawking é que pode não ser levada a sério, como ele mesmo não deve levar muito em conta as previsões sobre o seu próprio fim. E, se o bóson de Higgs é que acabará com o Universo, talvez isso aconteça antes do sumiço da Terra.

Vamos cuidando da nossa vidinha, do jeito que dá, sem preocupações com a sobrevivência do ambiente que nos sustenta, porque o bóson fará o serviço completo.

Não entendo nada do bóson, por mais que me esforce. Não tenho referências que me instrumentalizem a refletir sobre a partícula de Deus. Mas entendo quase tudo do que diz o economista Gesner Oliveira, especialista em recursos hídricos.

Gesner foi presidente da Sabesp, a companhia de água de São Paulo, e conhece o que acontece na região metropolitana. Li uma entrevista dele na Folha de S. Paulo. O que ele diz, para qualquer um compreender, é:

– Os hábitos brasileiros em relação à água ainda são carnavalescos.

Gasta-se água porque a água cai do céu. Em São Paulo, mesmo que não caia, continuam gastando e raspando represas para ressuscitar seus volumes mortos.

O Brasil desperdiça 37% da água tratada. Lava-se carro com água tratada. Lava-se calçada. Novas Cantareiras não aguentariam tanto desperdício. No início do segundo semestre de 2014, quando a seca piorou, a prefeitura de São Paulo constatou que a redução média no consumo era de 16%.

Nos bairros ricos, da área chamada genericamente de Jardins, o consumo caiu 7% no primeiro semestre (e esta região já consumia 39% mais do que o resto da cidade). Nos bairros pobres, a economia chegou a 20%.

Quem mais consome e mais poderia reduzir desperdício, menos economizou. Quem usa água para beber e para banhar-se sensibilizou-se com os apelos da prefeitura.

Para Gesner, os que não poupam água não se deram conta de que “acabou o mundo da fantasia”. Alguns ainda continuam achando, não só em São Paulo, mas em toda parte, inclusive aí em Dom Pedrito, em Erechim e nas cidades às margens do Rio dos Sinos, que água é um recurso sem fim.


Não entender o bóson de Higgs como ameaça real é exercer o direito à ignorância. Poluir rios e desperdiçar água tratada, depois do muito que se falou no assunto nos últimos 20 anos – e depois da seca bíblica em São Paulo –, é bem mais do que pensar só nos próprios jardins.

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