sexta-feira, 5 de setembro de 2008



05 de setembro de 2008
N° 15717 - PAULO SANT’ANA


A República dos mudos

O general Jorge Armando Félix, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, a quem é subordinada a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), saiu-se com uma preciosidade incomparável no seu depoimento na CPI dos Grampos: “A melhor fórmula para não ser gravado é não abrir a boca”.

Incrível, o ministro aconselhou o Brasil a emudecer. “Não falem”, soou assim o conselho do general. “Se falarem, eu gravo”, pareceu ameaçar.

Mas essa declaração não é outra coisa senão a pregação da extinção da Abin. Se todos os brasileiros ficarem calados no telefone, para que servirá a Abin? Se a Abin é feita para bisbilhotar, como o general aconselha que todos se calem?

É o maior gol contra da história da política brasileira.

Além disso, o general está pregando a extinção da telefonia no Brasil. De um golpe só, o general vai fazer virar pó a privatização das teles no Brasil.

Pela mordaça do general, em seguida vai acabar o telefone no Brasil.

Mas antes de acabar com os telefones, as ligações, a conselho do general, serão assim:

– Alô! – Ãhn, Ãhn. – He, he.

– Hi, hi. – Ã, ã. – Hein? – Aurgh. – Aurgh. E desligam.

Não dá para entender o Brasil. Pela lei, só a Polícia Federal e as polícias estaduais podem grampear telefones, assim mesmo com autorização judicial, com a finalidade de flagrar ou evitar crimes.

Mas como é que criam uma agência de inteligência que assessora o governo e fica impedida legalmente de escutar e gravar telefonemas?

Sem escuta e gravação de telefonemas, não pode funcionar nenhuma agência de arapongagem.

Se agência de espionagem é para espionar, de que viverão os arapongas da Abin se não for de bisbilhotar a vida dos cidadãos?

Neste mar de escutas e gravações que virou a Grampolândia nacional, esperar-se que a Agência Brasileira de Inteligência não grampeie ninguém é utopia.

Se até nas esquinas há anúncios de equipamentos para grampeamento, com a finalidade de maridos espionarem esposas ou vice-versa, por que se quer impedir que a Abin faça as suas gravaçõezinhas?

Só faltou dizer isso, aos parlamentares da CPI dos Grampos, o general Félix.

Chamar-se para depor um chefe da espionagem e exigir-se que ele não seja espião é demais. O que queriam que o general dissesse?

Mais adiante ele não poderia ir, foi até muito claro: quem não quiser ser gravado que se cale, coma em tranca, que deixar de gravar é impossível.

O general foi lá na Câmara e deu o seu recado. E que não se meta o Congresso a querer impedir os grampos, que não vai conseguir nada: grampo é secreto e quem grampeia nunca é descoberto.

Aliás, grampo é feito para apanhar os cidadãos, e a cidadania que não pense que ela é que pode apanhar os grampeadores, que tire para sempre de sua cabeça.

Comprou telefone e falou no telefone, tem de pagar por isso, como disse o general. Se além de pagar pelo telefone, alguém ainda vai querer falar no telefone, então tem de ser grampeado mesmo.

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