WALCYR CARRASCO
12/04/2013 22h07
Crueldade com cães
Fiquei
comovido com a história do cachorro abandonado pelo dono na estrada BR-101, no
Espírito Santo, que apareceu na internet. Deixado no acostamento, mas ainda
fiel, o cão correu quilômetros atrás da caminhonete. A dentista Rafaela, que
passava pelo local, registrou as imagens. Chegou a falar com o responsável. Ele
se recusou a resgatar o animal. Rafaela salvou o cachorro. Deu-lhe o nome de
Leleco e levou-o a um veterinário. Em seguida, hospedou-o num hotel canino,
onde Leleco deverá permanecer até encontrar novo dono.
O
que me assusta nesse episódio é a frieza do proprietário. Já adulto, o animal
certamente viveu anos com esse homem e também, provavelmente, com a mulher que
o acompanhava na caminhonete. O dono era sua referência de amor e proteção. Foi
deixado à beira da rodovia, como se não houvesse nenhum laço entre proprietário
e cão. Qual o objetivo de deixar um cachorro na estrada? É para ser atropelado
ou morrer de fome?
O
abandono de animais é frequente. Mesmo dos que têm pedigree. O casal compra o
filhote e passa meses, até anos, encantado com o bichinho. Se tem filhos, vira
mascote das crianças. Aí resolve fazer uma viagem longa. Ou mudar-se de uma
casa para um apartamento. Leva o animal para um lugar distante, e adeus! O
problema não é só brasileiro. Em países como França, Portugal e Espanha, é
comum que cães comprados para fazer companhia no inverno sejam abandonados
quando os donos saem para as férias de verão.
Na
Itália, já houve até uma campanha contra isso. Na Inglaterra, uma organização
chamada Dogs Trust pediu publicamente que animais de estimação não sejam
oferecidos como presentes de Natal. Na festa, são recebidos com alegria. Mas a
foto de dois cachorrinhos abandonados na neve após as comemorações ilustrou o
que realmente acontece. Já tive uma faxineira que adorava seu vira-lata. Sempre
me contava as gracinhas do animal. Um dia, chegou em casa com expressão
tristíssima:
–
Fui para bem longe de casa e abandonei o bichinho. – Por que fez isso? Você
gostava dele! – perguntei. – Ah, mas ele latia muito.
Alguns
dias depois, arrependeu-se. Foi procurar, não o encontrou mais. Tenho quatro
cachorros. Luna, uma fêmea de husky branca, ganhei de presente. Kauê, um
shih-tzu, foi dado por um amigo que não podia mais cuidar dele. A vira-lata
Morgana apareceu na porta da casa de uma amiga, dentro de uma caixa, com dois
irmãozinhos. Outra vira-lata, Ísis, foi resgatada na praia, magérrima, por um
amigo. Na ocasião, a veterinária disse:
–
Mais uma que está salva!
Deixar
filhotinhos é comum. Os donos param os carros de noite. Descem sorrateiros.
Botam a caixa num terreno baldio ou na frente de uma casa qualquer. Fogem, como
se estivessem praticando um crime. De acordo com um projeto de lei brasileiro,
estão mesmo. No futuro, casos assim poderão ser punidos com cadeia.
Qual
o objetivo de abandonar um cachorro na estrada? É para ser atropelado ou morrer
de fome?
Numa
modalidade de abandono mais sofisticada, a pessoa interna o bicho numa clínica
veterinária. Fornece nome e telefone falsos. O animal espera por seu dono com
ansiedade. Os dias passam, e ele não aparece mais. Veterinários, por definição,
amam animais. Costumam arcar com o prejuízo, até encontrar um novo lar para o
coitado. Nem sempre conseguem. Quando o animal está velho ou doente, ninguém
quer. Não é à toa que algumas clínicas exigem identidade, CPF e até comprovante
de endereço quando surge um novo cliente.
A
internet tem ajudado muito. É enorme o número de pessoas que põem fotos de
animaizinhos à procura de um lar. Minha amiga Lavínia, paulista, é uma delas.
Já parou o carro na estrada muitas vezes para pegar um cachorro. Leva ao
veterinário, que faz preço especial nesses casos.
Depois,
põe o cão de banho tomado e pelo escovado no Facebook. Faz pouco tempo, meu
coração até bateu mais forte por causa de uma peludinha. Fiquei indeciso, por
já ter quatro cães. Nesse intervalo, uma mulher apaixonou-se por ela. Lavínia
mostrou a beldade com a nova dona na internet. Clima de felicidade total. Outra
amiga, Vera, mulher do ator Fúlvio Stefanini, faz o mesmo. Passa a vida
resgatando cães e encontrando novos donos.
Apesar
de tanta gente apaixonada por animais, o problema permanece. O bicho deixado
para trás passa fome e privações de todo tipo. Torna-se vítima de maus-tratos.
Abandonar um animal é um ato de crueldade. Evidencia a falta de sentimentos de
uma pessoa. Quem abandona é que não merece o amor de um cachorro.
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