segunda-feira, 8 de abril de 2013



08 de abril de 2013 | N° 17396
ARTIGOS - Paulo Brossard*

Bem-aventurança

Estamos a viver um período curioso, pois, enquanto a senhora presidente da República, seu governo e amigos veem o país como um refúgio de bem-aventurança, dia a dia sou surpreendido por uma sucessão de informações que fazem duvidar da quase beatitude em que vive o país. Segundo a visão oficial.

Vou aos fatos, colhidos ao acaso, e me sirvo de dois dos nossos maiores jornais, em edições recentes. A primeira diz respeito ao ressurgimento da inflação, com viço indesejável, para usar de um eufemismo. “PIB tem pior resultado desde 2009”; “Brasil cresceu 0,9% e há dúvida sobre ritmo da recuperação”; “Mantega culpa a crise mundial. Dilma não comenta números”... “Balança comercial tem pior resultado em 12 anos”; “Março registra pior saldo comercial de 12 anos”; “Dilma devolve ministério a partido alvo de ‘faxina’”; “Em mais uma operação para obter apoio à campanha por um segundo mandato, a presidente Dilma Rousseff cedeu ao comando do PR e trocou o titular dos Transportes”; “Com balanço questionado, BNDES tem dificuldade para captar no Exterior.

Ressalvas feitas pela auditoria KPMG dificultam a obtenção de empréstimos lá fora e deixam o banco ainda mais dependente do Tesouro”. O uso de manobras contábeis pelo governo já se tornou rotineiro, “mas esse ‘truque’ pode estar sendo levado longe demais”, e assim comenta o jornal: “O mais lamentável é a ligeireza e irresponsabilidade com que o governo agiu para obter um resultado a curto prazo, desprezando normas fundamentais para assegurar a credibilidade do balanço de uma instituição do porte e da importância do BNDES”.

E, para encerrar esta relação de dados e fatos, observo que o valor de mercado de Petrobras e Vale encolheu R$ 76 bilhões; “Empresas registraram em 2012 os piores resultados em cinco anos”. E ainda não falei na situação a que ficou reduzido o Mercosul, notável empreendimento dos presidentes Sarney e Alfonsín. Argentina e Brasil são as duas presenças maiores, mas aquela, com a passividade do Brasil e com as licenças que se permite, reduziu a entidade a uma sobra do que era.

Suponho ter dito o bastante para debuxar o quadro do país, em vários de seus aspectos, a fim de mostrar como não são infundadas inquietações e preocupações acerca de nossa terra e de seu povo.

Para revelar a dualidade, senão a pluralidade de situações entre as duas linhas de visão antes esboçada, fato recente e que ganhou a maior publicidade, é suficiente para defini-la. A senhora presidente voltou a Roma para a cerimônia inaugural do novo papado. Poderia ser representada pelo nosso embaixador junto à Santa Sé, mas resolveu ir pessoalmente e fez bem.

O que chocou foi o fausto da embaixada. A hospedagem real, quer dizer, republicana, da senhora presidente foi no majestoso Hotel Excelsior, na Via Veneto, no ponto em que ela toma o rumo da Villa Borghese. Salvo engano, foram 25 os aposentos ocupados, sem falar os demais acomodados em outros hotéis, nem na riqueza dos serviços auxiliares contratados para os cinco dias destinados à excursão romana.

Também se falou nas despesas causadas pela numerosa representação, mas disso não cuido, embora não seja despiciendo. Faltam-me elementos idôneos. Como se vê, no Brasil de nossos dias há situações para todos os gostos.

*JURISTA, MINISTRO APOSENTADO DO STF

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