Telecolo
Fabrício
Carpinejar
04/05/2014
| 18h01
Em
tempos de correria, nosso colunista sugere um novo negócio para o mercado dos
amores
Os
casais não têm tempo para cuidar do outro.
Marido
e esposa chegam arrasados em casa, destruídos pelas preocupações do dia e
antecipando as expectativas da semana.
São
como lutadores de boxe, suados e inchados, pedindo um abraço, uma trégua, antes
de desferir os próximos socos.
Entram
em seu lar e, mesmo bem intencionados, fracassam em consolar sua companhia. Não
encontram ânimo para manter uma conversa inspiradora e incentivar o casamento.
Deitam
no sofá, encalhados. Ambos querem chamego, precisam de cuidados e não se
oferecem por absoluta falta de energia.
É
deitar que desmaiam.
O
que abre a possibilidade de um novo negócio no mercado: o telecolo.
Pessoas
capazes de oferecer um colo amigo.
Nada
a ver com sexo, com prostituição, com taras eróticas.
Nada
a ver também com terapia e confissão.
Uma
profissional da ternura.
Nas
horas de estresse absoluto e desesperança, chamaríamos o telecolo.
Procuraríamos
o telefone no ímã da geladeira.
Apareceria
em sua residência uma tia, com idade superior a 65 anos e cheiro de vó,
vestindo pijama e calçando pantufas. Sim, pijama e pantufas, para desfazer
qualquer apelo erótico.
Seu
serviço poderia durar apenas 30 minutos, o suficiente para espantar a enxaqueca
dos ossos.
Consistiria
em carinho nos cabelos, cafuné e um silêncio entremeado de palavras de apoio e
frases afirmativas.
Nenhuma
discussão, nenhuma pergunta, nenhum questionamento.
Nenhuma
desconfiança, nenhum julgamento.
Conheceríamos
a paz absoluta da cumplicidade.
Sua
primeira providência seria preparar um chá e alcançar um analgésico, naquela
atitude preocupada, de pé, esperando os movimentos da nossa boca.
Deitaríamos
nos ombros dela com a confiança de travesseiros ortopédicos.
Resmungaríamos
que está difícil, complicado, que não enxergamos saída e sentido para tanta
entrega.
Ela
responderia com ênfase: "Vai passar", "É só cansaço",
"Está fazendo seu melhor".
A
voz deve ser mansa, legível, reconfortante, de rádio AM.
Fecharíamos
os olhos docemente, para ensaiar o sonho em rápido cochilo.
Ela
nos colocaria na cama, puxaria nossas cobertas até o início do queixo.
Programaria a televisão para desligar em quinze minutos e armaria o alarme do
celular.
Dependendo
do desespero, cantaria uma música de ninar. Mas só em último caso.
Sairia
de cena sem deixar vestígios.
Amanheceríamos
com a sensação de banho tomado. Banho de alma.
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