30
de maio de 2014 | N° 17812
DAVID
COIMBA
Esquerda e
direita
Entre
esquerda e direita, prefiro a esquerda. A esquerda faz uma ideia generosa da
vida, de defesa do fraco contra o forte. Mas as pessoas de esquerda têm um
defeito irritante: o hábito de julgar os outros por suas ideias. Para muitas
pessoas de esquerda, quem não pensa como elas é desprezível.
Ideias
têm alguma importância. Não muita. Conheço supremos canalhas que são
esquerdistas perfeitos. O que torna um ser humano melhor não são suas ideias;
são os seus sentimentos e o seu comportamento, sobretudo a forma como trata os
outros seres humanos.
O
Brasil é governado há meia geração por um partido de esquerda. O PT seria a
nêmesis da ditadura militar, a direita mais renhida. Mas, olhando para um e
outra, me espanto: como são parecidos! Hoje encontro gente agradecida ao PT
pelos ótimos Bolsa Família, Minha Casa e Prouni, e lembro que só cursei minha
faculdade graças ao Crédito Educativo e que minha mãe só comprou nosso
apartamento graças ao BNH. Deveríamos ser agradecidos à ditadura? Os dois, PT e
ditadura, tentaram diminuir as diferenças sociais por meio de programas, não
com mudanças de sistema.
Ambos,
PT e ditadura, são desenvolvimentistas, o PAC é o PND. A ditadura fez a ponte
Rio-Niterói, a Transamazônica, a Freeway, o Pólo Petroquímico, a Usina de
Itaipu. O PT quer fazer Belos Montes, compra usinas no Exterior, duplica a
BR-101, planeja a segunda ponte do Guaíba, pretende terminar a transposição do
São Francisco. Em Porto Alegre, a esquerda tem feroz apreço pelo 1 milhão e 400
mil árvores da cidade. Destas, 1 milhão e 100 mil foram plantadas na gestão de
Socias Villela, prefeito nomeado pela ditadura. Na ditadura, a imprensa era
censurada.
O PT
sonha com a censura disfarçada pelo “controle social da mídia”. O PT e a
ditadura são estatizantes, os dois apostaram na indústria automobilística como
pilar de desenvolvimento e tiveram seus empresários-modelo, seja os
financiadores da Oban nos anos 70, seja Eike e seus R$ 10 bilhões captados
junto ao BNDES nos 2000.
Lula
aproveitou o bom momento econômico internacional e fez o Brasil crescer até
7,5%. Semelhante a Médici, que levou o país a 10%. Depois de Médici, assim como
depois de Lula, a economia virou. Seus sucessores, Geisel e Dilma, tiveram de
enfrentar momentos delicados e um país em princípio de ruptura social. Sarney e
Maluf, velhos próceres do PDS, o partido da ditadura, são eleitores
entusiasmados do PT, embora Maluf reclame que o PT esteja à sua direita.
No
Brasil, esquerda e direita são irmãs siamesas.
Mas
nem a esquerda nem a direita aproveitaram seus bons momentos para fazer
reformas estruturais. Quanto mais rico fica o Brasil, mais degenerado se torna
como nação. Na ditadura e na gestão do PT, o Brasil melhorou para milhões de
indivíduos; piorou como país. Foram medidas analgésicas, não curativas. Não por
má intenção, diga-se. Houve, sim, vontade de fazer o melhor.
Por
isso, não me agradam petistas que não enxergam decência fora do PT e não me
agrada quem chama os petistas de petralhas. Melhor seria se compreendessem que
tanto à esquerda quanto à direita há gente, muita gente, que quer o bem do
Brasil. É este o sentimento mais importante. Porque na prática, como se vê, não
faz muita diferença.
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