sexta-feira, 23 de maio de 2014


23 de maio de 2014 | N° 17805
DAVID COIMBRA

A dama não dá voltas

“A dama não dá voltas!”, rugiu Margaret Thatcher para os respeitosos parlamentares que a ouviam em um discurso do começo dos anos 80, na Velha Álbion.

A dama não dá voltas. Falava dela própria, a “Dama de Ferro”. Queria dizer que não voltaria atrás em sua política de moralidade pública implacável e feroz enxugamento dos gastos do Estado, como defendiam inclusive vários de seus correligionários.

Thatcher continua sendo discutida com paixão. Quando morreu, no ano passado, alguns ainda a vilipendiavam. Pudera. Thatcher era uma espécie de anti-Lula. Lula baseou as ações do seu governo na gastança do dinheiro público. Recheou os quadros do funcionalismo com mais de 40 mil contratações amigas e distribuiu reais à mancheia para programas, doações, aquisições, o escambau.

Lula repetiu Juscelino, autor daquela excrescência de pedra chamada Brasília. Imagine você, leitor que se espanta com os custos da Copa, que o Brasil levantou uma cidade no meio do nada do Planalto Central e para lá transferiu toda a máquina do governo federal, mais ou menos como Constantino fez nos anos 300, transformando Bizâncio em Constantinopla e tornando-a capital do império romano. Juscelino foi o nosso Queóps, que ergueu das areias do deserto a Grande Pirâmide. E Lula é o nosso Luís XIV, que sustentava os luxos da sua corte com o dinheiro dos impostos.

Luís XIV foi chamado de Rei Sol. Não por acaso. O governante que é pródigo com o dinheiro do Estado em geral se torna popular. Lula, obviamente, é popular. Médici, a seu tempo, tempo do Brasil Grande, também era. Igualmente o já citado Juscelino. Já economizar é chato. O cara tem que dizer não, não, não, e o bom é dizer sim, sim, sim.

Não sei se Margaret Thatcher estava certa ou errada. Analistas econômicos britânicos ainda debatem isso. Mas sei que a Inglaterra é o que é hoje graças a ela. Ou por causa dela, se você prefere. Ela tinha convicções e foi em frente. A dama não dava voltas.

Achei que Dilma seria uma espécie de Thatcher, quando foi eleita. Não que esperasse dela algum tipo de política de austeridade. Não. Dilma é uma desenvolvimentista aos moldes do que foram os militares nos anos 70. O PAC de Dilma é o PND de Reis Velloso. O que achei é que ela governaria com firmeza, e não, o governo não tem firmeza, dança ao sabor dos acontecimentos, cede a quaisquer pressões, vindas de onde vierem e é, mais do que tolerante, leniente.


O resultado é um país em que nada é garantido e tudo é permitido. Um país em que ninguém está feliz e todos se rebelam, alguns com causa clara, outros com causa obscura e muitos sem causa alguma, apenas para experimentar o inefável gosto da rebelião pela rebelião. Com a provável exceção dos grandes banqueiros, que não queimam ônibus nem fecham rua, não há uma única categoria satisfeita no Brasil. Não há quem não se revolte. Porque, no Brasil, as damas e os cavalheiros do governo dão voltas.

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