18
de maio de 2014 | N° 17800
FABRÍCIO
CARPINEJAR
Visite o
banheiro
“Visite
a cozinha” não é um convite que me atrai em restaurantes.
Visito
direto o banheiro. O banheiro que revela se a cozinha é limpa. O capricho do
banheiro desvenda a relação do dono com seu lugar.
O
banheiro do Dometila, no Moinhos de Vento, por exemplo, é uma teteia. Na
aparência, não tem nada demais: simples, bucólico, apresentando todos os
artigos indispensáveis como toalhinha de renda, sabonete líquido e papel.
Só
que o local não se restringe ao básico. Oferece produtos que não são
obrigatórios. Inventa necessidades. Inventa ocasiões. Inventa vontades.
Lá
encontrará absorvente, cremes, fio dental. Lá encontrará carregador de celular.
Lá
encontrará até chinelos e pantufas. Não é um toalete, e sim um camarim.
Se
você aparou mal a barba, pode corrigir no banheiro. Haverá gilete e espuma. Não
duvido que mulheres despreparadas, pressentindo o calor de um encontro ao
acaso, não tenham se depilado rapidamente no fundo do local.
Se
procurar com calma, achará secador e chapinha.
São
urgências surreais, que costumam acontecer. A realidade é também irreal.
Caso
a unha lascou, localizará uma série de esmaltes à disposição no armarinho.
Assim como acetona e algodão.
Quando
se gasta com aquilo que não é necessário, todo cliente se enxerga como
especial. Quando o negócio se transforma em casa, fazemos questão de levar
nossos pratos sujos para o balcão.
Não
nos sentimos explorados ou incomodados por colaborar.
Somos garçons, somos amigos, somos
cúmplices. Nem reclamaremos do atraso da refeição. Torcemos pelo sucesso
do cardápio como quem incentiva um filho.
O
banheiro é o chacra do restaurante.
O
cheiro, o cuidado, a manutenção denunciam o jeito como seremos tratados.
Entendo
a avareza como irmã do Procon. Nada pior do que pisar num tapume molhado de
caixas de papelão. É sempre melancólico. É sempre um último tango. É sempre uma
despedida da noite.
O
banheiro significa o cartão de visita de qualquer estabelecimento. Quando é
organizado, transmite acolhimento de hóspede, de pousada, de família.
Influencia
no sabor caseiro da comida. Influencia em nossa disposição de permanecer.
Influencia em nossa memória olfativa.
Não
nos enxergamos pressionados a pedir a conta, a sair, a encerrar a fome.
Parece
que o tempo se alarga enquanto o mundo saborosamente se encolhe.
Dometila
é o temperamento gentil de seu dono. É o Claiton. Seu carinho é imenso, é de
dobrar o quarteirão, de dar a volta na Praça Maurício Cardoso.
Não
estranhe se voltar para a casa nas noites de inverno como uma coberta nos
ombros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário