sábado, 10 de maio de 2014

11 de maio de 2014 | N° 17793
PAULO SANT’ANA

A galinha manca

Toda grande piada tem a sua psicanálise. O que quero dizer é que o cerne de uma piada é alimentado por um nexo causal, um significado no qual se concentra a sua maior atração.

Vejam, por exemplo, o caso desta piada que vou contar agora e que achei sensacional. Todas as pessoas para quem a repeti caíram em demoradas gargalhadas.

A piada é a seguinte: o cliente, em um restaurante, sentou-se à mesa e solicitou ao garçom: “Quero que o senhor me sirva uma galinha assada, inteira, que será colocada aqui na minha mesa”.

O garçom, depois de meia hora, trouxe a galinha assada inteira para o cliente. Não demorou nada e o cliente chamou o garçom: “Escute aqui, há um problema: essas duas pernas da galinha que estão erguidas para cima são de tamanho desigual: uma perna é comprida e a outra curta, a curta tem metade do comprimento da comprida. Então, o que o senhor vai fazer?”.

O garçom respondeu rápido para o cliente: “Mas o senhor quer a galinha para comê-la ou para dançar com ela?”.

Examinem que o garçom deu um nocaute no cliente: o que interessava era o sabor da galinha e não a diferença entre os comprimentos das duas pernas da ave.

O que o garçom quis explicar ao cliente é que não interessava o tamanho diferente das duas pernas, o que interessava é se a galinha estava bem preparada, os tamanhos díspares das duas pernas nada tinham a ver com a diferença de comprimento das duas pernas, o que estava em jogo era somente o preparo da galinha no forno, não interessava uma perna maior do que a outra. O cliente, portanto, tinha de comer a galinha e não ficar ligando para a ambiguidade métrica das pernas.

Fosse lá a galinha aleijada, foi a lógica empregada pelo garçom, o cliente tinha de comê-la e, se ela estivesse saborosa, pouco importava que fosse manca. Como diz a célebre marchinha carnavalesca: “Que importa que a mula é manca, o que eu quero é rosetar...”.

Notem bem que toda grande piada tem uma lógica. É a força dessa lógica que concede à piada uma dialética que imprime ao seu relato um inesperado e cômico final.

E quase sempre nas piadas o núcleo do riso está na última frase empregada no diálogo entre duas partes.


A piada que narrei acima, por tudo isso e por muitas outras implicações psicanalíticas, é mesmo sensacional. Não acharam?

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