11 de maio de 2014 | N° 17793
PAULO SANT’ANA
A
galinha manca
Toda grande piada tem a sua psicanálise. O que quero dizer é
que o cerne de uma piada é alimentado por um nexo causal, um significado no
qual se concentra a sua maior atração.
Vejam, por exemplo, o caso desta piada que vou contar agora
e que achei sensacional. Todas as pessoas para quem a repeti caíram em
demoradas gargalhadas.
A piada é a seguinte: o cliente, em um restaurante,
sentou-se à mesa e solicitou ao garçom: “Quero que o senhor me sirva uma
galinha assada, inteira, que será colocada aqui na minha mesa”.
O garçom, depois de meia hora, trouxe a galinha assada
inteira para o cliente. Não demorou nada e o cliente chamou o garçom: “Escute
aqui, há um problema: essas duas pernas da galinha que estão erguidas para cima
são de tamanho desigual: uma perna é comprida e a outra curta, a curta tem
metade do comprimento da comprida. Então, o que o senhor vai fazer?”.
O garçom respondeu rápido para o cliente: “Mas o senhor quer
a galinha para comê-la ou para dançar com ela?”.
Examinem que o garçom deu um nocaute no cliente: o que
interessava era o sabor da galinha e não a diferença entre os comprimentos das
duas pernas da ave.
O que o garçom quis explicar ao cliente é que não
interessava o tamanho diferente das duas pernas, o que interessava é se a
galinha estava bem preparada, os tamanhos díspares das duas pernas nada tinham
a ver com a diferença de comprimento das duas pernas, o que estava em jogo era
somente o preparo da galinha no forno, não interessava uma perna maior do que a
outra. O cliente, portanto, tinha de comer a galinha e não ficar ligando para a
ambiguidade métrica das pernas.
Fosse lá a galinha aleijada, foi a lógica empregada pelo
garçom, o cliente tinha de comê-la e, se ela estivesse saborosa, pouco
importava que fosse manca. Como diz a célebre marchinha carnavalesca: “Que
importa que a mula é manca, o que eu quero é rosetar...”.
Notem bem que toda grande piada tem uma lógica. É a força
dessa lógica que concede à piada uma dialética que imprime ao seu relato um
inesperado e cômico final.
E quase sempre nas piadas o núcleo do riso está na última
frase empregada no diálogo entre duas partes.
A piada que narrei acima, por tudo isso e por muitas outras
implicações psicanalíticas, é mesmo sensacional. Não acharam?
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