15
de maio de 2014 | N° 17797
LUCIANO
ALARBASE
LIQUIDIFICADOR
LIGADO
Philip
Roth diz que “a experiência da contradição é a experiência humana, pois todo
mundo carrega essa trouxa na cabeça”. Na minha cesta básica, cabem opostos
culturais aparentemente inconciliáveis: Bruce Willis e Lars von Trier, Madonna
e Maria Bethânia, Guimarães Rosa e Michael Connelly. Meu lema de vida aprendi
ouvindo Gil: “Deus me livre de ter medo agora / Depois que eu já me joguei no
mundo”. Meu gosto musical, voraz, parece um liquidificador ligado. Dos últimos
discos que ouvi, adorei o da Fernanda Takai.
Fiquei
mudo e feliz ouvindo sua versão de Amar como Jesus Amou, hino cantado nas aulas
de religião. Adorei também a gravação de Sunshine on my Shoulders, a musiquinha
do John Denver que Vanessa da Mata gravou maravilhosamente bem. Incríveis, nada
cafonas. Pessoas que não curtem o som de uma boa rádio AM me cansam em 10
minutos. Tautologia imbatível, constatação imediata: pessoas sofisticadas
demais são chatas demais.
Tropicalista
convicto e liberal, mesmo assim não deu pra aceitar o romance de Luiza e Laerte
na novela das nove. O cara enterrou vivo o pai da guria e deixou a mãe (Helena,
trabalho sensacional da Julia Lemmertz) em estado de choque vida afora. De
minha parte, espero que sejam infelizes para sempre. E alguém me explique por
que a Clara tem de escolher entre o Cadu e a Marina? Ficar com os dois
transformaria Giovanna Antonelli na mulher mais invejada do Brasil.
Torço
para que a audiência melhore, afinal é a despedida do Maneco desse mundo
delirante da teledramaturgia nacional. Sinto falta da voz de Adriana
Calcanhotto na trilha sonora. Desde a época do “Mortaes”, saudoso boteco da
Venâncio, Adrix me parece uma artista incomum. Ainda lembro nosso primeiro
encontro, no mezanino do Clube de Cultura, quando me convidou para dirigir seu
show no Porto de Elis. Há pouco, falamos horas sobre o frio na barriga que
nossa nova atividade comum, a de escrever para grandes jornais brasileiros –
ela para O Globo, eu para a Zero Hora –, nos dá. A sensação, arrepiante, é a de
esquiar numa pista de alto risco.
Enquanto
a novela patina e a saudade da Adriana bate, a vida real não é só tristeza e
dor. No meio de uma reunião de trabalho, preciso contar, o Jairo Jorge me pede
um projeto de poesia pra Canoas. Um prefeito preocupado com POESIA! Real.
Surreal. Não parece, Fabiane Maria, mas o mundo tem salvação.
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