sexta-feira, 6 de abril de 2012


ELIANE CANTANHÊDE

Eternamente vítimas

BRASÍLIA - A chocante decisão da 3ª Seção do STJ (Superior Tribunal de Justiça), inocentando um homem que estuprou três crianças de 12 anos, virou um caso internacional. A Unesco já tinha condenado o voto. Ontem foi a vez do escritório da ONU para Direitos Humanos na América do Sul.

Em nota, o escritório "deplora" a posição do STJ, que não apenas surpreende como entristece e mata de vergonha todos nós, brasileiros, sobretudo nós, brasileiras. "Essa decisão marca um precedente perigoso e discrimina as vítimas tanto por sua idade como pelo seu gênero", disse Amerigo Incalcaterra, representante do órgão para a região.

O tribunal inocentou o réu e culpou as vítimas, sob o argumento de que as três meninas eram prostitutas. Logo, podem ser estupradas à vontade e sofrer ainda mais violência do que já sofrem? Já seria um absurdo no caso de prostitutas adultas, imagine-se quando se fala de crianças - e de crianças jogadas às ruas, ao desamparo e à infelicidade.

Essa posição do tribunal brasileiro reforça o que, vez ou outra, há muitos anos, sou obrigada a escrever neste espaço: no Brasil, uma vez vítima, serás sempre vítima. E tratada como culpada! A vida, os pais, a escola (ou a falta dela) e o Estado geram e eternizam a injustiça. A Justiça, como última instância, lava as mãos.

Do ponto de vista legal, o STJ está descumprindo tratados internacionais a que o Brasil se obriga a respeitar e a cumprir, como a Convenção dos Direitos das Crianças, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher.

Do ponto de vista humano, a decisão é de uma brutalidade tal que choca o mundo, mas deve, antes de mais nada, chocar todos(as) e cada um(a) de nós. Nações democráticas garantem o futuro de suas crianças, as protegem e as resgatam quando necessário. O resto é barbárie.

elianec@uol.com.br

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