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sábado, 13 de fevereiro de 2010
Na ilha de Lost
O ideólogo petista, assessor de Lula e coordenador do programa da candidata Dilma Rousseff, tem medo de navios de guerra americanos e de TV a cabo, mas é fã de uma ilha tropical parada no tempo – que não é a do seriado
Jerônimo Teixeira e Marcelo Marthe - Montagem com fotos de Andre Dusek/AE e Divulgação
HAJA GRAMSCI...
Na montagem, Marco Aurélio Garcia e o elenco do seriado Lost: "Nunca subestimem a estupidez humana"
No seriado Lost, sobreviventes da queda de um avião descobrem-se em uma ilha esquisita, onde o próprio tempo parece ter parado. Assessor especial da Presidência e coordenador do programa de governo da ministra Dilma Rousseff, Marco Aurélio Garcia habita um mundo semelhante. Seu relógio ideológico parou lá pelos anos 70, quando críticos culturais esquerdistas denunciavam a suposta pregação capitalista de programas de TV americanos como Vila Sésamo ou das páginas do Pato Donald.
Num discurso na sede do PT em Brasília, no sábado 6, Garcia acusou a ameaça aos interesses do Brasil representada pelos pouco mais de cinquenta canais por assinatura que exibem produções estrangeiras. "Os canais de televisão a cabo realizam, de forma indolor, um processo de dominação muito eficiente. Despejam esterco cultural", afirmou o ideólogo petista.
"Garcia precisa atualizar seu arsenal teórico. A última vez que eu ouvi essa bobagem falada a sério foi na década de 70", diz o sociólogo Demétrio Magnoli, que identifica duas matrizes para a paranoia do "imperialismo cultural". A primeira viria do líder bolchevique Vladimir Lenin, que falava do imperialismo como um "estado avançado do capitalismo", no qual as disputas entre nações reproduziriam em escala internacional a luta de classes.
A contribuição mais recente viria do marxista francês Louis Althusser, influente nos anos 60 e 70, que caracterizava o estado e as instituições públicas e privadas de comunicação como um sistema coordenado de dominação cultural. Suas teorias foram diluídas em um libelo que já foi popular em faculdades de comunicação: Para Ler o Pato Donald, lançado em 1971 pelo chileno Ariel Dorfman e pelo belga Armand Mattelart.
Agora as esquerdas seguem a cartilha de esterilização cultural proposta pelo italiano Antonio Gramsci, um revolucionário comunista que ordenou à militância que trocasse as armas pelo lento, silencioso e constante envenenamento do manancial de ideias livres da nação que se tenta subjugar.
A luta gramsciana não é travada contra as ideias passadas por produções culturais de gosto duvidoso ou de baixa qualidade. Não. A luta é contra ideias que fujam do controle do partido.
Isso explica a raiva de "Lost Garcia" contra a TV a cabo, pois nem nos Estados Unidos a televisão é um veículo de propaganda do capitalismo. Criativa, plural, independente, a produção de televisão americana em seus melhores momentos faz a demolição constante e impiedosa de tudo o que "Lost Garcia" odeia, como bem sabe quem já assistiu a Os Sopranos ou Os Simpsons (que, apesar de seu claro alinhamento com a esquerda, já foi censurado na Venezuela de Hugo Chávez, patrono espiritual de Garcia).
Qualificá-la em bloco como "esterco cultural" revelaria preconceito e desinformação – mas é apenas cálculo político. Está-se diante da tentativa de abrir uma nova frente de combate no objetivo marxista permanente de dominação, controle e vigilância da mente dos brasileiros.
Essa ideia fixa petista vem sendo tentada de diversas maneiras há sete anos – sempre rechaçada pelas pessoas bem-intencionadas de todos os matizes ideológicos. Agora se tenta via controle da TV a cabo. Se não funcionar – e tudo indica que não vai funcionar –, um novo ataque virá com o objetivo de esterilizar outro quadrante da atividade pensante.
O certo é que virá. Sem a supressão da capacidade de indignação, do poder de crítica e da liberdade de expressão, o projeto bolivariano chavista não tem como avançar. Tente Caracas, senhor "Lost Garcia".
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