sábado, 13 de fevereiro de 2010



14 de fevereiro de 2010 | N° 16246
MOACYR SCLIAR


E se o ano inteiro fosse um Carnaval?

Será que não podemos transplantar o espírito carnavalesco para o nosso cotidiano?

Carnaval é coisa antiga, antiquíssima: vem desde o tempo dos romanos, pelo menos. Corresponde, portanto, a necessidades muito arcaicas, e por isso muito autênticas, do ser humano.

Várias necessidades: a necessidade de brincar, a necessidade de dançar, a necessidade de fazer um sexo transitório e sem compromisso, a necessidade de assumir uma outra identidade, o que explica as fantasias: no Carnaval, proliferam os reis, as rainhas, as princesas, os palhaços, as colombinas – as máscaras, sobretudo as máscaras.

A pessoa deixa de ser o que ela é, e por um instante muda-se para o planeta de sua imaginação. É claro que, com tudo isso, o Carnaval teria mesmo de durar pouco e teria de ser seguido por um dia sombrio, a Quarta-Feira de Cinzas. Que, no Brasil, inaugura o ano propriamente dito. Como diz a canção: “Agora é cinza/ tudo acabado, e nada mais”.

Mas será que precisa ser assim? Será que não podemos – afinal o Carnaval é a festa da inversão – inverter este conceito? Será que não podemos, se não transformar o ano inteiro num grande Carnaval, ao menos transplantar um pouco do espírito carnavalesco para o nosso cotidiano?

Não é tão difícil assim. A primeira coisa de que precisamos nos dar conta é de que ser sério não significa ser mal-humorado. Claro, todos nós temos os nossos problemas, e alguns são bem graves – mas, será que precisamos aumentar a carga desses problemas com um péssimo estado de espírito?

Notem bem: não estou falando naquela coisa ingênua, tola, de “Sorria, e o mundo sorrirá com você”, tão frequente nos livros de autoajuda e nos cursos de promoção de vendas.

Não, é dar-se conta de que temos, dentro de nós, uma reserva de energia, de espírito vital, que pode melhorar a nossa existência. Uma reserva que, às vezes, usamos sem saber. O pai que brinca com o filho pequeno, assumindo o papel de monstro ou similar, este pai está sendo carnavalesco – fora do carnaval.

O marido que resolve namorar a mulher com quem está casado há longo tempo faz a mesma coisa. E a pessoa que faz um balanço de sua atividade e se pergunta “Mas será que eu não podia mudar de vida, partir para uma coisa melhor?” também está incorporando o lado bom do Carnaval.

Isso vale para o país como um todo. Atribuiu-se ao presidente De Gaulle a frase: “O Brasil não é um país sério”. Na verdade, a mal-humorada sentença partiu de um diplomata brasileiro, dentro daquela tendência de autoavacalhação que faz parte de nossa história. O Brasil é um país sério.

E muitos brasileiros sabem combinar a seriedade com o sorriso, com o espírito lúdico. Muitas vezes, a tevê entrevista pessoas que passaram por situações difíceis, que perderam todas suas coisas, mas que afirmam com um sorriso: “Não há de ser nada, vamos recomeçar”. É por isso que o Carnaval encontrou aqui seu abrigo.

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