Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
sábado, 31 de janeiro de 2009
01 de fevereiro de 2009 | N° 15866
MARTHA MEDEIROS
O papel higiênico da empregada
Quando a gente é criança, acha que todo mundo é legal, que todo mundo é da paz, e de repente começa a crescer e vai descobrindo que não é bem assim.
Eu lembro que, ainda menina, foi um choque descobrir que as pessoas mentiam, enganavam, eram agressivas. Porque aquelas pessoas não eram bandidas: eram colegas de aula, gente conhecida. Eu ficava confusa.
Fulana era generosa com os amigos e, ao mesmo tempo, extremamente estúpida com a própria mãe. Beltrana ia à missa todo domingo e nos outros dias remexia na mochila dos colegas para roubar material escolar. Sicrana era sua melhor amiga na terça-feira e na quarta não olhava pra sua cara. Eu chegava em casa, pedia explicações pra família e recebia como resposta: bem-vinda ao mundo.
Eu queria o impossível: olhar para uma pessoa e saber o que poderia esperar dela. Seria uma pessoa do bem? Do mal? Viria a me decepcionar? Todas as pessoas decepcionam, todas cometem erros, mas eu queria encontrar alguma espécie de comportamento que me desse uma pista segura sobre com quem eu estava lidando.
Até que certo dia fui na casa de uma colega. De repente, precisei ir ao banheiro. Só havia um no apartamento, e ocupado. Eu estava apertada. Apertadíssima. Minha amiga sugeriu que eu usasse o banheiro da empregada, topei na hora. E lá descobri que o papel higiênico da empregada era diferente do papel usado pelos outros membros da família. Era mais áspero. Parecia uma lixa. Muito mais barato.
Era um costume, e talvez seja até hoje: comprar um tipo de papel higiênico para a família e outro, de pior qualidade, para o banheiro de serviço. Eis ali a pista que eu inocentemente buscava para descobrir a índole das pessoas.
Hoje, adulta, sei que descobrir a índole de alguém é um processo muito mais complexo, mas ainda me surpreendo que algumas pessoas façam certas diferenciações.
O relacionamento entre empregados e patrões ainda é uma maneira de se perceber como certos preconceitos seguem bem firmes. Não é por economia que se compra papel higiênico mais barato pra empregada, por mais que seja este o argumento usado por quem o faz. É para segmentar as castas. É para manter a hierarquia. É pela manutenção do poder.
As pessoas querem tanto acabar com as injustiças sociais, e às vezes não conseguem mudar pequenas regras dentro da sua própria casa. Cada um de nós tem um potencial revolucionário, que pode se manifestar através de pequenos gestos. Comprar o mesmo papel higiênico para todos, quem diria, também é uma maneira de lutar por um mundo melhor.
A colunista Martha Medeiros está de férias. Esta crônica foi publicada originalmente em 30 de novembro de 2003
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Um comentário:
Isso é a mais pura realidade. Em empresas que eu trabalhei, o banheiro dos funcionários tinha papel toalha de baixíssima qualidade, enquanto no banheiro dos executivos era a coisa mais chic, o banheiro chegava a ser luxuoso, como se somente eles merecessem tudo do bom e do melhor, era como se nós fossemos outra espécie de gente. Mas todo mundo é igual, todos somos seres humanos, filhos do mesmo Deus.
Beijão!
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