quinta-feira, 22 de janeiro de 2009


Suzana Herculano-Houzel

Para viver um longo amor

[...] Novidades são um estímulo fabuloso ao sistema de recompensa, sobretudo se voluntárias e seguras

A notícia, anunciada há duas semanas, era digna de comemoração: segundo estudo recente, o sistema de recompensa do cérebro pode continuar respondendo à visão da pessoa amada durante décadas com a mesma euforia e empolgação dos casais recém-apaixonados.

A novidade rendeu reportagens em revistas, televisão e internet, e até uma coluna aqui, onde cometi (aparentemente) a imprudência de me comprometer a voltar ao assunto nessa semana com dicas sobre como alimentar a chama cerebral da paixão de modo que ela dure décadas a fio.

Seria imprudência, de fato, dar dicas com base em experiência própria, o que não posso fazer: embora o prognóstico seja favorável e eu siga muito apaixonada, obrigada, meu casamento tem apenas três anos de história. Já é suficiente para contrariar a visão popular de que a paixão tem cerca de 18 meses de prazo de validade -mas é pouco para dar conselhos.

A neurociência, no entanto, é uma jovem senhora de mais de 150 anos de experiência e com vários conselhos para dar. Se ela hoje sabe que a paixão é um estado particular de intensa ativação do sistema de recompensa associada à visão, presença ou mera ideia da pessoa amada, então manter a paixão consiste em... manter a associação entre a tal pessoa e a ativação do sistema de recompensa. Ou seja: associar prazer ao amor.

Como o sistema de recompensa é o conjunto de estruturas que sinalizam ao resto do cérebro quando algo interessante acontece ou tem grandes chances de acontecer, causando prazer e satisfação, todo tipo de prazer associado à pessoa amada ajuda a manter acesa a chama cerebral da paixão: carinho, sexo, humor, atenção, apoio, conversas estimulantes, atividades intelectuais, cinema, hobbies -e novidades.

Novidades, por definição, são um estímulo fabuloso ao sistema de recompensa, sobretudo se voluntárias e seguras. Viajar juntos a um destino novo é tudo de bom: se novas camas, restaurantes, paisagens e experiências fazem bem ao sistema de recompensa de ambos os amantes simultaneamente, o cérebro de cada um associa o novo prazer à presença do outro.

E, assim, de novidade em novidade, de um prazer a outro novo prazer, o sistema de recompensa pode passar décadas, se não uma vida toda, achando que aquela pessoa em especial é particularmente desejável e excitante, pois coisas fabulosas acontecem quando se está com ela.

Se funciona? Vários casais antigos me garantem que sim. Pergunte-me daqui a uns dez anos...

SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora do livro "Fique de Bem com o Seu Cérebro" (ed. Sextante) e do site "O Cérebro Nosso de Cada Dia" (www.cerebronosso.bio.br)

suzana.herculano-houzel@grupofolha.com.br

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